ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 60) Año 2017. Pág. 33

Tópicos de Aprendizagem na Gestão do Conhecimento: perspectiva interdisciplinar no contexto do ensino superior

Learning Topics in Knowledge Management: an interdisciplinary perspective in the context of higher education

Regiane da Silva MACUCH 1; Letícia Fleig DAL FORNO 2

Recibido: 14/09/2017 • Aprobado: 15/10/2017


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados

4. Conclusões

Referências bibliográficas


RESUMO:

Considerando-se que aprendizagem é um processo de aquisição de conhecimento pela experiência, tem-se que inserções acadêmicas que promovam ao estudante interesse em compreender conceitos de aprendizagem e conhecimento implicam em metodologias interdisciplinares. Estudo desenvolvido no contexto de um programa de pós graduação interdisciplinar, objetivou construir conhecimento sobre o conceito de aprendizagem. Por meio de uma abordagem qualitativa (observação, diário de campo e atividades), notou-se que nas ações dos estudantes existem distinções acerca do reconhecimento sobre conhecimento enquanto uma construção individual e a aprendizagem enquanto uma relação com trocas sociais
Palavras chiave: Aprendizagem, Interdisciplinaridade, Ensino Superior, Narrativas

ABSTRACT:

Learning is a process of acquiring knowledge through experience. We argue that within an academic environment interdisciplinary methodologies are important in promoting student interest in understanding learning-related concepts. In the present study, set against the background of an interdisciplinary postgraduate program, we focus on the case of promoting knowledge building of the concept of learning. By means of qualitative analyses (observation, fieldnotes, and field activities), we show that students’ actions reveal an understanding of the distinction between knowledge as an individual building process and learning as a process which involves social exchange.
Keywords: Learning, Interdisciplinarity, Narratives, Higher Education

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1. Introdução

Ao considerar a aprendizagem como um processo de aquisição de conhecimento por meio da experiência, do ensino ou do estudo, tem-se que a diversidade  é um meio de promover a concepção de que existem diferentes modos e formas de construir o conhecimento e promover a aprendizagem em um mesmo espaço (Pozo, 2003). A aprendizagem é o percurso que um indivíduo perfaz para relacionar, organizar, interpretar e compreender informações.

Essa definição permite que professor e aluno estejam com papéis ativos no processo de aprender, no sentido de que o professor transmite determinadas informações que o aluno precisa significá-las ao seu contexto. Nesse contexto de trocas, de interação, de relacionamento, tem-se que o professor não é o responsável pela aprendizagem do aluno. Seu papel é o de mediador. O aluno é quem precisa encontrar meios e modos de proceder com a aquisição e construção do seu conhecimento. Ou seja, a aprendizagem significativa pertence ao sujeito que a produz, mas as trocas, as interações quer com o professor quer com os pares em um espaço como a sala de aula, é a externalização dos diferentes encadeamentos de pensamento e dos modos de aprender.

Markova e McArthur (2015) discorrem sobre a relevância do pensamento e das aprendizagens estruturadas e viabilizadas em grupo. Ambas permitem que o indivíduo interaja e experiencie pensamentos e processos de aprendizagem diferentes, conforme as atividades e a organização das ações realizadas. Neste panorama, tem-se que o processo de aprendizagem torna-se diferenciado aos indivíduos que estão inseridos num grupo que tem por foco o conhecimento interdisciplinar e sua necessidade para a percepção deste. Relacionada a essa percepção tem-se a concepção de que a sala de aula é um lugar que deve apresentar a diversidade de cada indivíduo, bem como promover o reconhecimento dos estilos de aprendizagem e suas confluências (Bahia & Oliveira, 2013; Gil, 2015; Melo & Veiga, 2013).

Tal concepção embasa a proposta apresentada neste estudo sobre a organização e estruturação de uma unidade curricular voltada à integração de áreas disciplinares que têm por objetivo compreender a diversidade teórica sobre os fenômenos da aprendizagem e da construção do conhecimento. Segundo Gil (2015) quando se evidencia a aprendizagem no ensino superior, deve-se reconhecer que o professor estará por atuar com um público pertencente a andragogia, e deste modo, o foco estará na promoção de estratégias para que o aluno converta as informações necessárias da sua unidade curricular, em conhecimento. Sendo que “informação é a interpretação de um conjunto de dados segundo um propósito relevante para o público-alvo” (De Sordi, 2008, p.10).  Na especificidade da pós-graduação, lida-se com alunos que frequentaram o ensino superior e que agora buscam aprofundar seu conhecimento para uma área ou mais, e especificado ao exercício de preparação para uma atuação pedagógica para o ensino superior (Gil, 2015; Brasil, 1996).

Essa descrição destaca que estão presentes no programa de mestrado alunos com interesse de compreender a aprendizagem, bem como de reconhecer o processo de aprendizagem, no entendimento das necessidades das atuações e intervenções pedagógicas dentro de um Programa Interdisciplinar focado na Gestão do Conhecimento nas Organizações, sejam elas empresariais ou educacionais. Nota-se, assim, a relevância de promover debates e inserções acadêmicas que promovam ao estudante de pós-graduação o interesse por compreender as relações entre aprendizagem e conhecimento, destacando-se a significação viabilizada por meio da troca entre diferentes formações multidisciplinares.

Neste sentido, o desenho deste estudo baseia-se em três momentos: a) a relação do conceito de interdisciplinaridade no contexto da pós graduação; b) a contextualização da aprendizagem em um espaço do ensino superior voltado a interdisciplinaridade; c) o conhecimento como consequência de aulas interdisciplinares com a perspectiva multidisciplinar. Definindo-se como objetivo geral construir conhecimento sobre o conceito de aprendizagem na perspectiva interdisciplinar, buscou-se por meio de narrativas (Bruner, 1997) realizar uma análise de conteúdo (Bardin, 2009) para verificar como as produções ao longo da unidade curricular “Tópicos de Aprendizagem” explicitaram a construção do conhecimento do alunos, por meio das trocas e intervenções multidisciplinares que ocorreram e como elas promoveram mudanças na percepção sobre aprendizagem.

A significação dessa abordagem sobre a interdisciplinaridade encontra-se na perspectiva de que a Gestão do Conhecimento é aplicável a uma organização, sendo esta um conjunto formado por pessoas, processos e tecnologias, no intuito de colaborar com a tomada de decisão acerca do valor do conhecimento na ação de compartilhar (Carvalho, 2012).

A Gestão do Conhecimento pode ser descrita como uma área que abrange a perspectiva interdisciplinar, ao ser considerado conhecimento enquanto uma unidade de análise comum a um grupo, e não apenas a um individuo ou a uma organização especificamente (Dal Forno & Negrini, 2016) referindo-se ao processo dinâmico que ocorre na troca e no movimento da informação (Davenport & Prusak, 1998). Assim, “a gestão do conhecimento deve ter por objetivo apoiar a geração de novos conhecimentos, sendo que o conhecimento é o novo saber, resultante de análises e reflexões  de informações segundo valores e modelos mentais daqueles que o desenvolvem, proporcionando a estes melhor capacidade adaptativas às circunstâncias do mundo real” (De Sordi, 2008, p.12).

1.1. A interdisciplinaridade

Para ser abordada uma definição sobre interdisciplinaridade faz-se mister reconhecer que algumas concepções acerca dessa variável estão relacionadas com o processo de aprendizagem na perspectiva das interações sociais, bem como, com a construção do conhecimento na interatividade com o outro, e na capacidade do sujeito em relacionar disciplinas, conteúdos e áreas (Markanova & McArthur, 2015; Klein, 1990; Shin, 1986).

Klein (1990) descreve que a interdisciplinaridade quando abordada em contexto educacional possibilita que sejam inseridas nas intervenções uma maior exploração sobre a unidade curricular, e em seguida, uma análise mais aprofundada das relações e problematizações. Essa análise aprofundada pode ser considerada como o modo que o sujeito realiza e idealiza uma estratégia para a solução de um problema utilizando mais de uma área, e expressando uma construção do conhecimento que não alcance apenas uma unidade ou fique limitado a uma única concepção (Klein, 1990).

Segundo Shin (1986) a interdisciplinaridade relacionada ao conhecimento, ou o conhecimento interdisciplinar pode ser definido como o conhecimento de um novo significado, que foi produzido pela integração de conceitos e ideias de diferentes disciplinas. Na produção do conhecimento interdisciplinar faz-se necessário analisar o conceito ou o problema propagando relações para além da perspectiva disciplinar agregando elementos subsidiários para a  a criação de um novo significado (Shin, 1986).

Desse modo a interdisciplinaridade no contexto da pós graduação refere-se a possibilitar que o aprendiz busque meios de promover relações entre áreas, visualizando uma proposta de solução e de organização que sejam pertinentes a possibilidade de englobar conceitos e intervir com inovação.

Tem-se assim que, ao ser inserida a discussão sobre a interdisciplinaridade no processo de formação e aprendizagem do sujeito presente no ensino superior ou na pós graduação, visualiza-se uma possibilidade de transformação de problemas sociais, que podem ser apresentados como complexos, e por meio dessa relação de interáreas ou interdisciplinas promove-se uma resolução diferenciada (Klein, 1990). Essa inserção social do sujeito analisando o problema numa dimensão global e com um novo significado, viabiliza uma construção de conhecimento dferenciada e promotora de uma aprendizagem condizende com a concepção de construção do conhecimento.

Por meio dessa percepção de que a interdisciplinaridade ao ser inserida no contexto da pós graduação, que é a especificidade de contexto deste estudo, possibilita que o aprendiz produza uma compreensão diferenciada dos pares. Isto porque, segundo Pozo (2003, p. 22) todo o ato cognitivo “é uma construção, dada a diversidade da atividade cognitiva conhecida, é preciso assumir que há formas muito diferentes de construir ou de aprender construindo”. Logo, toda a produção ou perspectiva de inovação e de solução de um problema que um sujeito produz, possui uma interação de áreas, um processo de relações e uma dinâmica individual.

A contextualização da aprendizagem em um espaço do ensino superior voltado a interdisciplinaridade é uma ação de promoção de um espaço que seja incentivador e promotor da criação e da inovação. Isto porque, segundo Markanova e McArthur (2015) faz-se fundamental promover um ambiente propício à habilidade de solucionar problemas ou a capacidade de comunicação, e essa possibilidade relaciona-se com a construção de pensamentos estratégicos.

Logo, reconhece-se que a interdisciplinaridade é um meio de possibilitar que as ligações entre diferentes àreas de conhencimento sejam compreendidas, e sejam utilizadas para “resgatar possibilidades e ultrapassar o pensamento fragmentado inovador” (Macuch, Dal Forno & Berardi, 2016, p. 1326).

A interdisciplinaridade no contexto educacional, como a pós-graduação,  possibilita “que sujeitos individuais e coletivos ampliem suas percepções na busca pela resolução de um problema, analisando os resultados com base em diferentes perspectivas e estratégias na busca por soluções” (Macuch, Dal Forno, & Berardi, 2016, p. 1326).

Nesse processo de abordar a perspectiva interdisciplinar para promover no aprendiz um interesse pela solução diferenciada de problemas, localiza-se a possibilidade de intervenções educacionais voltadas à perspectiva multidisciplinar. No caso especifico deste estudo, trata-se da contextualização de  uma unidade curricular estar presente em um programa interdisciplinar, e com mestrandos com formações distintas, advindos de três grandes áreas: humanas, exatas e sociais aplicadas.

Nota-se, assim, a construção do conhecimento como consequência de aulas interdisciplinares com a perspectiva multidisciplinar. Acordando com a concepção de que a interdiscipinaridade é o meio de agregar as concepções das diferentes áreas, ou seja, o processo de construção de um conhecimento baseado na perspectiva da multidisciplinaridade pode ser fragmentado em disciplinas. Mas ao ser inserido na perspectiva interdisciplinar, o conhecimento pode ser construido e organizado enquanto um processo de ligação das disciplinas focando-se num objetivo único.

Destaca-se que o docente terá um significativo papel em promover que o aprendiz reconheça a possibilidade da multidisciplinaridade como uma condição de analisar um problema na perspectiva de duas ou três áreas, mas ao abordar a análise numa perspectiva interdisciplinar, acaba por encontrar uma solução mais ampla e diferenciada. Isto porque o enfoque não será isolar por área e verificar a dinâmica da solução por cada uma. E sim, analisar a sistematização de uma solução condizente com as necessidades de integração e interação entre áreas com foco numa problemática a ser resolvida.

1.2. Estratégias pedagógicas em sala de aula

1.2.1. Princípios andragógicos

Para o trabalho pedagógico com grupos de adultos uma das principais estratégias pedagógicas é a adoção dos princípios andragógicos propostos pelo educador americano Malcolm Knowles. Psicologicamente, o ser humano amadurece quando passa a ser responsável pela própria vida, assumindo a responsabilidade pelas suas decisões, neste sentido, Knowles (1980) organizou suas ideias em torno da noção de que os adultos aprendem com mais facilidade em ambientes informais, confortáveis, flexíveis e sem ameaças. Seu modelo andragógico presume que a responsabilidade do aprendizado é do próprio aprendiz, tendo o professor o papel de mediador das aprendizagens.

Para Knowles (1980) os seis princípios da Andragogia são: 1) Necessidade: os adultos precisam saber porque necessitam aprender algo; 2) Autoconhecimento: os adultos precisam entender como podem ser independentes e alunos ao mesmo tempo. Por serem responsáveis pela sua vida, têm dificuldade em que outros lhe digam o que fazer; 3) Experiências: os adultos têm uma bagagem muito maior e mais variada de experiências, que acabam sendo a base do seu aprendizado, mas também podem acarretar em preconceitos e hábitos mentais que dificultam a aprendizagem; 4) Prontidão: os adultos têm prontidão de aprender as coisas que precisam saber para enfrentar as situações da vida real; 5) Orientação: a aprendizagem dos adultos é focada na vida, nos problemas que vivenciam; 6) Motivação: os adultos respondem melhor aos fatores motivacionais internos, como o desejo de ter maior satisfação no trabalho, autoestima e qualidade de vida, do que aos externos como melhores empregos, promoções e salários mais altos.

Papalia e Feldman (2013) descrevem que a fase adulta possui relação com a aprendizagem no sentido de que mesmo apresentando mudanças em seu comportamento, relação com sua profissão, e na condição de se relacionar com os outros, o adulto segue se modificando e transformando-se socialmente. Essa continuidade destaca a importância do ensino voltado ao adulto ser enfático à realidade, as problematizações reais e na busca por soluções condizentes com as necessidades de cada um.

1.2.2. A escuta sensível  como estratégia metodológica

A escuta sensível em educação proposta por Rene Barbier (2007), se inscreve na perspectiva de sua Abordagem Transversal (Barbier,  1993). A escuta sensível por parte do professor auxilia o outro na reorganização de suas ações, objetivando um fazer autônomo, independente e propositivo.

Durante a realização da experiência em sala de aula, o olhar com outros olhos, o ouvir com outros ouvidos reforçam e retornam à compreensão de que a aprendizagem humana é um processo gradual, dinâmico e complexo. Muito se aprende quando cada um relembra suas experiências, trazendo à memória ações e sentimentos vividos, seja com alegria, seja com tristeza, sempre que motivados ou solicitados a dizerem “a sua palavra”.

Enquanto estratégia metodológica, a escuta sensível propõe a promoção da consciência dos sujeitos sobre as situações, defendendo uma postura consciente tanto do professor como dos alunos na relação que estabelecem em sala de aula. Barbier (1985) definiu esta postura como “implicação”, ou seja,  o reconhecimento da importância dos sentidos que os sujeitos atribuem às situações por meio das quais constroem seus mundos sociais. Para o autor, implicação pode ser definida como “(...) engajamento pessoal e coletivo do pesquisador em e por sua práxis científica em ato, (...) de tal modo que o investimento que resulte inevitavelmente de tudo isso seja parte integrante e dinâmica de toda atividade de conhecimento” (Barbier, 1985: 120).

1.2.3. A construção do conhecimento em contexto relacional de aprendizagem

Não existe "conhecimento sem conhecedor", com esta afirmação Breuer (2004, p. 2) diz que “uma práxis sócio-científica razoável (…) é característica transportadora inescapavelmente do conhecedor e, portanto, de forma irrevogável e intrinsecamente subjetiva”.

Josso (2004, p. 98) considera que não há processo científico ou escolha de objeto teórico que não seja sustentado por uma dimensão afetiva, na maioria dos casos associada uma lógica biográfica articulada a um contexto sociocultural e histórico. Neste sentido, uma aprendizagem significativa se consolida pela no envolvimento das dimensões afetiva, cognitiva e social.  

2. Metodologia

Este estudo buscou compreender se a construção do conhecimento na abordagem multidisciplinar pode colaborar com a percepção interdisciplinar da aprendizagem.  Tal busca refere-se a revisão bibliográfica sobre as concepções teóricas da relação entre interdisciplinaridade, conhecimento, aprendizagem e ensino superior, por meio de uma análise das definições desses conceitos e da abordagem da experiência realizada em sala de aula do mestrado de Gestão do Conhecimento na promoção de debates e narrativas em contexto multidisciplinar.

Considerando-se que as ações em sala de aula podem ser exercidas em etapas de aquecimento, ação dialógica e partilha do conhecimento construído (Macuch e Vaz, 2015, p.232), buscou-se especificar as narrativas como meio para a construção do conhecimento pelo incentivo à troca de informações e saberes sobre o conceito de aprendizagem numa abordagem multidisciplinar. Neste sentido e considerando-se que “construímos nossas experiências e nossas memórias com base em nossas narrativas”, torna-se importante entender "como os seres humanos constroem seus mundos" (Bruner, 1997, p. 14) muito mais do que tentar compreender a essência desses mundos.

Essa pesquisa teve como amostra alunos do curso de nível de mestrado interdisciplinar em Gestão do Conhecimento nas Organizações, que apresentaram formações profissionais diferenciadas nas áreas de humanas e exatas (engenharia civil, administração, pedagogia, moda, veterinária, ciências contábeis). Por meio de uma abordagem qualitativa, foram coletados dados em três momentos: observação, diário de campo e atividades. Sendo que esses momentos estavam baseados nas etapas referenciadas anteriormente, descrevendo-se que tal tipo de investigação possui características multidisciplinares e tem uma orientação de análise com caráter subjetivo quanto aos processos biográficos (Macuch & Leite, 2014).

A utilização das narrativas como recurso de coleta de dados implicou que os docentes, atuantes na unidade curricular, estivessem atentos as considerações dos mestrandos quanto as situações, as questões, os conceitos teóricos e os processos de comunicação que eram incentivados a ocorrer em sala de aula, por meio das interações entre os pares, e em alguns momentos diretamente com os docentes. Tendo por intuito analisar a construção do conhecimento dos mestrandos em relação ao conceito de aprendizagem, concentra-se o foco da unidade curricular especificada neste trabalho.

3. Resultados

Ao serem analisadas as narrativas dos mestrandos acerca da definição ou conceito que eles tinham e produziram acerca da unidade curricular e da experiência construida em sala de aula, notou-se a observação de todos quanto a diferenciação da organização e desenvolvimento das atividades e intervenções pedagógicas.

Essa observação por um período inicial não foi relacionada a perspectiva interdisciplinar, nem mesmo a multidisciplinar. Para os envolvidos no processo de inserção na pós-gradução, a metodologia apresentada pelas docentes era uma estratégia para promover uma experiência diferenciada.

No entanto, a medida que as intervenções pedagógicas e as atividades foram sendo realizadas, foi possível observar pela narrativa dos mestrandos que mesmo tendo por formação um curso que não estivesse relacionado a educação, as considerações sobre a aprendizagem passaram a estar relacionadas a individualidade do sujeito e a necessidade de incentivo e trocas.

L., formada em contabilidade, narra que o desenvolvimento das aulas  possibilitou reconhecer o significado da frase “aprender a como se aprende ensinando”. W., formado em administração, complementa alegando que a sua experiência educacional não o havia possibilitado a reconhecer e compreender o significado das perspectivas teóricas e o planejamento do professor.

Ou seja, os dois mestrandos, advindos de cursos mais relacionados a exatas, estavam interagindo com os pares, e por meio dessa interação começaram a analisar como eles se sentiam frente a possibilidade do diálogo antes da busca pelas referências teóricas. Destaca-se o significado da mediação entre pares no processo de aprendizagem, e em como os mestrandos reconheceram como eles poderiam estar realizando o processo de aprendizagem interagindo com os pares e trocando informações com sujeitos que possuiam diferentes formações.

Notou-se que para a maioria dos mestrandos, ao narrar sua experiência no final do semestre, e ao considerar a avaliação da mesma, destacou a aplicação teórica como algo possível na unidade curricular, ou seja, todas as discussões e trocas produzidas em perspectivas teóricas foram abordadas de um modo que permitia ao mestrando experienciar em sala de aula mesmo ou receber a tarefa de observar outros momentos, outros sujeitos e as possíveis relações com a aprendizagem.

M., formado em veterinária, narrou que as “asserções que me levaram a assimilar e concretizar algumas formas e modelos de cognição de ideia, bem como, concluir o que antes eram somente conjecturas acerca da minha melhor forma de aprender”. Nessa narrativa o mestrando expressa que a medida que as aulas foram se desenvolvendo foi sendo possível interligar teoria e prática, sendo que, como prática ele compreendeu a analise de si mesmo e suas relações com a teoria.

A possibilidade de relação com outras disciplinas também foi percepcionado nas narrativas dos mestrandos. Segundo M., formada em moda, a possibilidade de estar aprendendo a teoria e a experiência em sala de aula, com alguns alunos já enriquecia a sua construção de conhecimento sobre aprendizagem. A participação em uma unidade curricular que é por si congruente com a necessidade de discutir educação permite a compreensão das relações com outros conteúdos e com outras perspectivas teóricas.

Outra categoria presente nas narrativas sobre a unidade curricular do programa de mestrado foi referente à apredizagem. Inicialmente os mestrandos não reocnheciam a sua própria aprendizagem. Destaca-se a narrativa de G, formado em administração, “O primeiro ponto que levanto é que aprendizagem pode acontecer por vários meios e cada indivíduo possui seu próprio jeito peculiar de aprender. O estilo de aprendizagem poderá interferir na forma em que esse indivíduo busca conhecimento e a meu ver o modo como ele se relaciona  com outros indivíduos a procura por semelhantes, unindo forças para socialização e ampliação de conhecimento.”

Nessa perspectiva de reconhecimento das relações de conteúdo e do processo de aprendizagem individual, W., narra que “Aprendi na sala de aula que essas teorias e as formas que elas se aplicam afetam diretamente alunos de qualquer idade, desde que quando nascem até a velhice, inclusive alunos do mestrado, e também que aplicado de forma errada podem trazer consequências catastróficas para as crianças e adolescentes tornando-os adultos, deficientes de conhecimento, agressivos ou depressivos”.

Essas duas narrativas expõem o que alguns mestrandos destacaram sobre a metodologia em sala de aula, que enquanto eles experienciavam a abordagem diferenciada das docentes da unidade curricular, reconheciam que a metodologia, enquanto uma estratégia de ensino, é uma ferramenta que possibilita uma mudança no estilo de aprendizagem do aluno, bem como difere e inclui os alunos no processo de aprendizagem.

Essas relações, narradas pelos mestrandos possibilitou analisar a compreensão dos mesmos sobre a influencia do clima para a aprendizagem em sala de aula como real e necessário para a promoção do reconhecimento do processo de mudança de comportamento. Segundo F., formada em Pedagogia, “Aprender está relacionado a um clima emocional”, destacando que a própria ação de exposição, narrada por alguns dos mestrandos, influencia no processo de aprendizagem, no sentido de que se o aprendiz reconhece seu lugar no grupo, reconhece suas compreensões, externaliza o seu conhecimento.

As narrativas dos alunos expressaram um reconhecimento possitivo para a ação de externalizar. Foram nesses momentos que ocorreram as trocas e as interligações entre áreas distintas e a propagação de uma discussão relacionada a interdisciplinadridade de problemas educacionais.

Essa percepção dos mestrandos é reforçada na narrativa de T., formada em Pedagogia, que questiona sobre a relevância das interações e destaca o quanto a metodologia tem um significativo papel no processo de aprendizagem, “Para que ocorra aprendizagem é preciso ter interação do indivíduo com o objeto de estudo, assim como interação do mesmo com o meio que está envolvido, levando isso para uma sala de aula, como pode ocorrer interação, diálogo se os alunos estão dispostos um atrás do outro, se o professor ainda é um ser autoritário e se coloca como detentor do saber?”.

Esse questionamento possibilitou que os demais aprendizes passassem a relacionar a metodologia adotada como uma estratégia possibilitadora de intervenções e ações que motivam, promovem a interação, e colaboram para que os alunos reconheçam a sala de aula como um espaço de troca. No caso especifico da sala de aula do mestrado, notou-se que os alunos começaram a reconhecer que as atividades promovidas tinham um significado diferenciado por estarem sendo desenvolvidas num grupo multidisciplinar. E que as relações com os conteúdos das outras unidades curriculares e com as problematizações sobre a educação, transformavam-se a medida que a interdisciplinaridade ficava presente no discurso e nas percepções dos mestrandos.

Nota-se com a análise das narrativas dos mestrandos que a concepção sobre interdisciplinaridade e multidisciplinaridade foram sendo reconhecidas a medida que os conteúdos e atividades da unidade curricular foram sendo desenvolvidas com possibilidades de aplicação prática.

Como descrevem Bahia e Oliveira (2013) o espaço da sala de aula quando descrito como um lugar de trocas e intervenções permite que o aluno reconheça-se como parte ativa de seu processo de aprendizagem, e se verifique como agente do seu conhecimento. Para Melo e Veiga (2013) é na metodologia, na definição de como desenvolver a aula que o docente explicita ao aluno como é possível verificar seu processo de aprendizagem, possibilitando que o mesmo se reconheça como agente ativo na construção do conhecimento.

Segundo Buber (1997) a narrativa é uma ação que permite a externalização de compreensões que o sujeito produz e precisa desenvolver para explicitar a sua história, e assim, se perceber. Conforme descrevem Knowles (1980) e Melo e Veiga (2013) o autoreconhecimento do sujeito em relação a sua aprendizagem, a pedagogia de aprender, corrobora para que a construção do conhecimento seja uma ação de aprender em sociedade, na e com sociedade para a solução de problemas sociais (Pozo, 2003).

4. Conclusões

Este estudo analisou como mestrandos pertecentes a um programa de pós graduação interdisciplinar stricto sensu buscam construir seu conhecimento por meio da interação com a perspectiva multidisciplinar. Essa investigação referenciou a necessidade de ser verificada a relevância da metolodogia docente como um recurso possibilitador e incentivador da aplicabilidade e utilização dos conceitos multidisciplinar e interdisciplinar na formação do sujeito em relação ao seu processo de aprendizagem.

Nota-se que as categorias apresentadas nas narrativas dos mestrandos estavam pautadas na aprendizagem, metodologia, exposição e praxis. A percepção dos mestrandos acerca da sua inserção num contexto de ensino e aprendizagem voltado a interdisciplinaridade reforça a definição apresentada por Shin (1986) acerca das possibilidades da construção de um conhecimento interdisciplinar ser significativo na formação do sujeito, enquanto um meio de promover o desenvolvimento diferenciado para a solução de problemas.

O discurso presente na conceitualização da inteligência colaborativa (Markanova & McArthur, 2015) sensibiliza o sujeito a reconhecer aquilo que ele possui como conhecimento, e flexibiliza o buscar de informações e de novas aprendizagens sobre o que ele não compreende, domina ou conhece. Essa dinâmica explicita a importância do aprendiz estar ciente de que a aplicação ou organização de uma problematização ou solução interdisciplinar exigirá o reconhecimento das suas capacidades e habilidades para explorar os pontos que lhe faltam conhecer.

No caso especifico desta investigação, a exemplificação dessa busca remete a existência de um grupo de mestrandos multidisciplinar, que por meio de suas trocas e narrativas, interdisciplinaram as problematizações da educação, ao trilharem a proposta de agregarem conhecimentos de diferentes áreas nas construções de conceitos e definições sobre a aprendizagem para construírem novos conhecimentos sobre a problemática estudada pela unidade curricular, ou seja, a possibilidade de uma meta-aprendizagem sobre a aprendizagem.

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1. Professora Doutora no Programa de Pós-Graduação em Gestão do Conhecimento nas Organizações no Centro Universitário de Maringá - UniCesumar; Bolsista do Programa Produtividade em Pesquisa do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e Inovação -ICETI. rmacuch@gmail.com

2. Professora Doutora no Programa de Pós-Graduação em Gestão do Conhecimento nas Organizações no Centro Universitário de Maringá-  UniCesumar; Bolsista do Programa Produtividade em Pesquisa do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e Inovação- ICETI. lefleig@gmail.com


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