ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 60) Año 2017. Pág. 24

Ensino de Física para surdos: Carência de material pedagógico específico

Physical education for deaf: material lack educational specific

Rodrigo Dias PEREIRA 1; Daniela Fernandes MATTOS 2

Recibido: 19/08/2017 • Aprobado: 17/09/2017


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Desenvolvimento do trabalho

4. Resultados

5. Conclusões

Referências bibliográficas


RESUMO:

Este trabalho surge da constatação da necessidade de se transmitir os conceitos básicos da física para os alunos surdos, de uma forma específica e eficaz, para tanto realizamos uma aula em que utilizamos sinais em Libras desenvolvidos por um grupo de professores e intérpretes. Nossos resultados indicam que os alunos surdos participantes deste trabalho apresentam as mesmas dificuldades conceituais dos alunos ouvintes. Também observamos que com a utilização dos sinais em Libras adequados as dúvidas conceituais foram sanadas.
Palavras- chave: Ensino; Física; Surdo

ABSTRACT:

This work comes from the realization of the need to convey the basics of physics for deaf students, a specific and effective way to perform both a class where we use signs in Pounds developed by a group of teachers and interpreters. Our results indicate that the deaf participants of these work students have the same conceptual difficulties of hearing students. We also observed that the use of the signs in appropriate Pounds conceptual questions have been resolved.
Keywords: Teaching; Physics; Deaf

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1. Introdução

A educação de pessoas surdas é um tema que, tem despertado grande preocupação da comunidade acadêmica, visto que as pesquisas desenvolvidas, no Brasil e no exterior, indicam um número significativo de sujeitos surdos que passaram por vários anos de escolarização apresentando competência para aspectos acadêmicos muito aquém do desempenho de alunos ouvintes, apesar de suas capacidades cognitivas iniciais serem semelhantes (LACERDA, 2006). Em uma primeira análise deste cenário, verificamos a existência de uma latente inadequação do sistema de ensino “tradicional” além de um grande apontamento no que tange ao desenvolvimento de “estratégias” para o pleno desenvolvimento dessas pessoas.

Este cenário é muito pior quando abordamos a questão do ensino de física para surdos, pois é perceptível a escassez de pesquisas sobre o tema, de modo que os relatos mostram a precariedade na forma em que os conteúdos a serem ensinados chegam até esses alunos. Fórmulas, sinais, gráficos, fenômenos físicos necessitam de professores habilitados com um material compreensível para esse grupo particular de estudantes. As dificuldades acarretadas pelas questões de linguagem agregadas à “novidade” da educação inclusiva têm apresentado uma realidade aos alunos surdos, em que eles se encontram defasados no que diz respeito à escolarização, sem o adequado desenvolvimento e com um conhecimento aquém do esperado. Disso advém a urgência de propostas educacionais que atendam às necessidades dos sujeitos surdos, favorecendo o desenvolvimento efetivo de suas capacidades.

Diante deste contexto neste trabalho tem-se como objetivo principal desenvolver e aplicar uma aula voltada para o aluno surdo utilizando recursos visuais e os sinais específicos em Libras (GOBARA e VARGAS, 2014) para o ensino das diferenças conceituais das grandezas físicas: Peso e Massa. Além disso, será feito um relato sobre as dificuldades encontradas na elaboração de uma aula com os sinais adequados em libras. Outro aspecto a ser observado será a importância da interlocução permanente entre o professor e o intérprete de Libras.

1.1. Um breve estado da arte

Foi publicado no ano de 2000, um dos primeiros trabalhos na área de ensino de física aliado ao processo de inclusão (CAMARGO, SCALVI e BRAGA, 2000). Neste trabalho, os autores tinham como objetivo discutir as concepções espontâneas de pessoas deficientes visuais totais sobre os conceitos físicos de repouso e movimento e comparar tais concepções com modelos científicos desenvolvidos historicamente. Na conclusão do trabalho, foi observado que o conhecimento do aluno educacionalmente cego é obtido principalmente através da audição e do tato. De modo que para o aluno em questão ter uma melhor compreensão do mundo ao seu redor é necessária a apresentação de objetos que possam ser tocados e manipulados. Através da observação tátil de objetos, o aluno pode conhecer a sua forma, o seu peso, a sua solidez, as qualidades de superfície a sua maleabilidade (propriedades físicas dos objetivos).

Em 2005, no XVI Simpósio nacional de ensino de física foi apresentado um trabalho intitulado “Ensino de física para portadores de deficiência auditiva: o problema dos livros didáticos” (NOGUIERA, REIS e RICARDO, 2005). O ponto central deste trabalho era investigar a seguinte questão: quais as dificuldades de um aluno surdo na aprendizagem de física no ensino médio a partir dos livros didáticos. Os resultados sugeriram que os livros didáticos não ajudavam no aprendizado desses docentes.

Na pesquisa “Ensino de física para surdos: três estudos de caso da implementação de uma ferramenta didática para o ensino de cinemática” (BOTAN, 2012), pretendeu-se investigar se a ferramenta didática, construída com características para ser potencialmente significativa na perspectiva da Teoria da Aprendizagem Significativa, contribuiu para a aprendizagem de conteúdos de Física e para a efetiva inclusão de estudantes surdos. Os resultados obtidos indicam que a inclusão de surdos é desenvolvida sem o atendimento às condições mínimas relativas às diferenças culturais e linguísticas.

Na dissertação de mestrado com o título “Ensino de ciências e educação de surdos: Um estudo em escolas públicas” (RAMOS, 2011), o autor avaliou em duas escolas da rede pública do Rio de Janeiro como é feita a prática inclusiva de alunos surdos em sala de aula. Este trabalho mostrou a existência de uma dificuldade dos professores para a inserção de Libras em sala de aula, assim como falta de comunicação direta com o tradutor-intérprete dificultando o processo de aprendizagem do aluno surdo em sala de aula.

Uma discussão acerca da construção de um recurso bilíngue que possa ser utilizado em turmas inclusivas de física que tenham alunos com deficiência auditiva foi objeto de um estudo publicado em 2013 (Conzedey, Pessanha e Costa, 2013). Nesse trabalho, foram construídos 6 (seis) vídeos bilíngues didáticos para serem utilizados como ferramenta didática no ensino de leis de Newton para alunos com e sem deficiência auditiva. O material buscava valorizar mais os aspectos visuais em comparação aos sonoros. Os autores puderam verificar que é possível criar espaços de ensino e aprendizagem em que todos os alunos possam aprender juntos.

No trabalho “O ensino de física com as mãos: Libras, bilinguismo e inclusão” (SILVA, 2013), pesquisou as dificuldades, possíveis estratégias de ensino e desafios a serem vencidos por professores de física que almejem ensinar para os alunos surdos. Em busca de respostas, foi realizada uma pesquisa qualitativa com alunos surdos e professores de física da rede estadual de São Paulo. Os resultados apontaram questões estruturais da própria organização escolar e dificuldades envolvendo a ação dos intérpretes, demonstrando que os professores de física, mesmo quando buscam algum domínio de Libras, não estão preparados para compreender e lidar com toda a cultura dos surdos, que extrapola o domínio disciplinar específico. Da mesma forma, também as dificuldades de aprendizagem de conceitos físicos vão além da simples questão de criação de vocabulário correspondente em Libras, mas envolvem a forma específica da própria construção de conceitos e do raciocínio físico dessa cultura.

No ano de 2014 foi publicado um artigo intitulado: “Interações entre o aluno com surdez, o professor e o intérprete em aulas de física: Uma perspectiva Vygotskiana” (Gobara e VARGAS, 2014), tratando de uma pesquisa qualitativa realizada em 10 escolas públicas de ensino médio de Campo Grande-MS que receberam 24 alunos com surdez. Para a análise dos dados, foi utilizada a abordagem histórico cultural de Vygotski evidenciando que apenas o intérprete interage efetivamente com esses alunos e pouco colabora para que eles interajam com pessoas que não dominam a Língua Brasileira de Sinais. Em sala de aula, o professor transfere ao intérprete a responsabilidade de ensino e aprendizagem desses alunos.

Em janeiro de 2015 dando continuidade ao trabalho realizado as autoras citadas no parágrafo anterior publicaram um glossário ilustrado em Libras para conceitos de física (VARGAS, 2015), no qual foram criados e catalogados sinais para força, massa e aceleração e exemplificando com alguns modelos de planos de aula para a implementação desses sinais facilitando o ensino de física para o aluno surdo.

2. Metodologia

Para a realização desse trabalho, utilizamos a seguinte metodologia: (i) Levantamento dos trabalhos sobre o ensino de física para alunos surdos publicados em periódicos nacionais nos últimos 15 anos e nos bancos de dissertações/teses digitais; (ii) Definição dos sinais a serem utilizados; (iii) Definição dos temas/tópicos a serem abordados; (iv) preparação e aplicação da aula.

Além disso, neste trabalho utilizamos especificamente os sinais em Libras desenvolvidos para o ensino de física (GOBARA E VARGAS, 2014). Cabe destacar, que após o planejamento da aula, foram realizados 4 (quatro) encontros com o intérprete do Departamento de Educação e Ciências Humanas da UFES para a explicação do conteúdo e a metodologia que seria utilizada durante a aula de modo a facilitar a interlocução do mesmo com os alunos

Durante a criação da aula a ser ministrada consideramos que atualmente o ensino de ciências/física tem se focado em uma educação mais contextualizada, na qual os conteúdos na sala de aula possam trazer discussões de situações vividas ou próximas dos alunos, dando assim subsídios aos alunos para que eles entendam e discutam o que está acontecendo no seu dia a dia. Isso fez com que criássemos uma aula totalmente visual, explorando o conteúdo com exemplificações de situações cotidianas dos alunos.

3. Desenvolvimento do trabalho

3.1. A inserção de libras para o ensino de física

Atualmente existe um verdadeiro banco de ferramentas que podem ser utilizadas em sala de aula de modo a tornar o processo ensino aprendizagem menos “traumático” no que diz respeito à ruptura com a “física” do censo comum. Desta forma, a física, como ciência que é, deve ser transmitida aos alunos com o suporte de todo o material pedagógico disponível. Esses recursos, quando bem utilizados, permitem ao professor fazer uma aula na qual o conteúdo explicado torna-se uma lente pela qual o aluno enxerga o mundo a sua volta. Podemos dar como exemplo: em uma aula sobre os tipos de movimento o professor pode utilizar vídeos e softwares que permitem retirar todo o conteúdo a ser explorado em tempo real.

Devemos lembrar que é necessário um tempo para que o professor de física se adapte a todo esse aparado disponível. Esta adaptação torna - se mais complicada quando, em sala de aula, há alguns alunos surdos, pois, essa aula necessita da inserção de caracteres visuais específicos que traduzam os conceitos da física existentes para que eles consigam interpretar as informações passadas da mesma forma que todos os outros alunos são capazes de fazê-lo.

Quando em sala de aula estão matriculados alunos surdos, além dos processos naturais de adaptação e adequação pelos quais o professor passa durante a preparação e execução das aulas, não podemos esquecer que o professor, de física, também precisa trabalhar em conjunto com o intérprete de libras, o que pode ser um obstáculo, pois o intérprete poderá não dominar os conceitos da disciplina e isto poderá causar uma dificuldade no que diz respeito à transmissão correta dos conteúdos.

Nesse ponto relatamos que durante a preparação da aula, que versava sobre a diferença entre peso e massa, o intérprete disse que não compreendia perfeitamente o assunto abordado. Isso salientou a importância do planejamento hábil feito através de encontros agendados entre os dois profissionais (professor e intérprete) em que deve ser explicitado todo o conteúdo a ser abordado juntamente com a metodologia apresentada. Devemos considerar que não é factível cobrar dos intérpretes de libras conhecimento específico dos conteúdos que estão interpretando.

3.2. Escolha do conteúdo

Diversos trabalhos que tratam das dificuldades conceituais dos alunos na disciplina de física têm sido publicados, dentre eles podemos citar Barbeta e Yamamoto (2002), PIEKARZ (2003), Ferreira e Caíres (2009) e Custódio (2012), um resultado comumente observado é que os alunos apresentam grandes dificuldades nos conceitos mais básicos. Considerando esses resultados e os trabalhos citados, optamos por abordar os seguintes conteúdos: Massa e Peso, uma vez que tais conceitos são cotidianamente utilizados de maneira equivocada.

3.3. Local de aplicação

O material pedagógico elaborado foi aplicado na Escola estadual de ensino fundamental e médio Bartouvino Costa, localizada na Avenida Governador Jones dos Santos Neves, s/n, Centro, Linhares. Essa escola é a primeira escola fundada na cidade de Linhares-ES e nesse ano completa 175 anos de sua existência. Além de funcionar como escola regular, também possui um programa de educação em tempo integral que oferece aos alunos além de uma educação de qualidade nas disciplinas regulares, oficinas pedagógicas, atendendo aos estudantes de forma mais completa sem separá-lo por turno, e ainda oferece cursos técnicos na área de libras, contabilidade e marketing que funcionam no período noturno para incentivar o início da carreira profissional dos discentes.

A escola tem um trabalho diferenciado voltado para a educação inclusiva, com um espaço físico adequado e totalmente adaptado, e uma equipe de vários profissionais especializados para atender múltiplas deficiências facilitando a aprendizagem do aluno especial.

3.4. Construção da aula

Não existem sinais em Libras para todas as palavras usadas em um enunciado como a Língua Portuguesa. Essa realidade dificulta o bom andamento das aulas em algumas disciplinas, principalmente aquelas em que a Língua Portuguesa é uma intermediária entre outras linguagens como, por exemplo, a linguagem matemática. Na falta do sinal em Libras é preciso “soletrar” as palavras e isto pode tornar a aula muito cansativa para o aluno e para o intérprete.

Especificamente em relação aos termos próprios ao ensino de física não existem sinais para todos os conceitos e, inclusive, em diversos casos os sinais existentes que possuem correlatos na Língua Portuguesa são diferentes em relação ao conceito físico, ou seja, acabam conduzindo ao erro conceitual. Um exemplo dessa situação pode ser verificado quando observamos que no dicionário da Língua Brasileira de Sinais, desenvolvido com o apoio da coordenação nacional de deficiência (Lira), onde estão reunidos muitos sinais em Libras utilizados na cultura surda, o termo repouso é definido como descansar ou relaxar, porém, na física repouso significa basicamente ausência de movimento em relação a um determinado referencial. Esta diferença de significado conduz a um erro conceitual que se propaga ao longo da disciplina de física.

Uma alternativa para tentar solucionar esse problema e a proposição de novos sinais que busquem representar com mais fidelidade o conceito físico abordado. Novamente ressaltamos que neste trabalho utilizaremos os sinais em Libras desenvolvidos por GOBARA e VARGAS (2014). Nas Figuras 1 e 2, ilustramos os sinais que foram utilizados.

Figura 1
Sinal criado para massa

O sinal de força está associado mover um objeto de um lugar, fazendo um objeto parado adquirir velocidade.

Figura 2
Sinal criado para Força.

Lembramos que a principal característica dessa aula é a diferenciação dos conceitos físicos de massa e peso com a utilização dos sinais em libras apropriados para o grupo de alunos surdos.

3.5. A aula

As aulas ocorreram em dois momentos, a saber: (i) no turno vespertino com 05 alunos surdos matriculados do 9° ano do ensino fundamental até o 3° ano do ensino médio e 02 intérpretes da escola como ouvintes, além do intérprete como interlocutor de toda a aula. (ii) no turno noturno com 03 alunos surdos, sendo 01 da modalidade EJA e 02 do técnico em Libras, 03 intérpretes e 02 pedagogos como ouvintes.

No primeiro momento foi explicado aos alunos que o intuito era fazer uma aula um pouco diferente e que iríamos apresentar uma linguagem desenvolvida especialmente para eles.  Iniciamos a aula com a aplicação de um teste diagnóstico, com o objetivo de verificar o nível de maturidade cientifica de cada um dos alunos no que tange aos conceitos abordados.

O teste é composto de 5 (questões), na primeira questão era apresentado a figura de uma embalagem de determinado produto e estava circulado a "expressão" 800 g, nesta questão foi solicitado ao aluno que dentre 5 (cinco) alternativas escolhesse aquela que representava o nome da grandeza física que pode associada a expressão circulada. As questões 2, 3 e 4 abordavam de maneiras distintas qual a grandeza que uma balança é "capaz" de medir e qual a relação do resultado medido e a aceleração da gravidade. Por último na questão 5 (cinco) foram apresentadas 3 (três) figuras e foi pedido aos alunos que associassem as figuras com as respectivas grandezas físicas relacionadas a elas.

Inicialmente os alunos apresentaram muitas dificuldades de responder o teste e a todo o momento recorriam ao intérprete, porém o mesmo dizia que só podia explicar de forma geral e que eles deveriam responder da forma que eles acreditavam ser a mais correta. Os alunos gastaram pouco mais de 15 minutos para responder todas as questões.

Após a finalização da aplicação, a aula teve seu início efetivo. Inicialmente foi mostrado os alunos uma série de placas de trânsito e a partir deste ponto ocorreu o seguinte diálogo:

Professor: Vocês já viram estes símbolos antes?

Alunos: Sim, estas placas estão espalhadas nas ruas.

Professor: O que acontece quando não cumprimos as recomendações das placas?

Alunos: Os guardas aplicam uma multa.

Na sequência mostramos uma figura referente às instruções contidas nas etiquetas das roupas, e ocorreu o seguinte diálogo:

Professor: Estes símbolos vocês conhecem?

Alunos: Sim, eles estão nas roupas, tem até no uniforme da escola.

Professor: Para que serve?

Alunos: Para a gente saber o que fazer na hora de lavar e passa a roupa.

Professor: O que acontece se não fizermos o que está escrito?

Neste momento foi explicado a eles que em todas as áreas existem símbolos/códigos específicos e que tais símbolos/códigos tem um significado que devemos conhecer e seguir, e que na física não era diferente. Na sequência foi explicado que a partir daquele momento iríamos apresentar dois códigos da física que significam “coisas” diferentes, mas que todo mundo acredita que eles são iguais.

Na etapa seguinte, foi perguntado aos alunos o que era “massa”, todos tiveram dificuldades em responder esta pergunta, alguns alunos perguntaram se esta massa era a mesma massa que era utilizada para fazer pão e macarrão. A seguir mostramos a imagem de uma lata de extrato de tomate e o seguinte diálogo foi desenvolvido:

Professor: O valor circulado na embalagem é a massa do produto?

Alunos: Não, o que está escrito é o peso do produto.

Neste instante eles foram informados que na realidade o que estava assinalado era a massa do produto e que a embalagem estava com a informação errada.

A partir deste ponto, foi explicado qual é o conceito físico de massa e também foi mostrado aos alunos qual o correto sinal em libras referente a esta grandeza física. Dando continuidade, foi ensinado o conceito de força e seu respectivo sinal em Libras. Posteriormente, foi explicado aos alunos que o peso é o nome de uma força específica. Neste instante os alunos, através do intérprete, demonstraram ter entendido a diferença entre peso e massa. Cabe ressaltar, que a partir deste ponto houve uma maior interação entre os alunos e o professor, os alunos ficaram mais à vontade e fizeram muitos questionamentos a respeito dos conceitos abordados, vale citar que um dos alunos comentou que depois da explicação ele entendeu porque os astronautas “flutuam” na lua.

No final da aula os alunos responderam novamente o questionário, vale destacar que um aluno do turno noturno disse que estava envergonhado, pois ele percebeu que no 1º teste ele respondeu tudo errado. Após a finalização do teste todos os alunos disseram que foi muito mais fácil de compreender os conceitos quando explicados desta maneira. Neste ponto é muito importante ressaltarmos dois aspectos: (i) a reunião com o intérprete de libras antes da aula foi de fundamental importância e (ii) a aula ministrada não foi preparada exclusivamente para alunos surdos, excetuando os sinais, logo ela pode ser aplicada em qualquer sala de aula.

4. Resultados

Nesta seção iremos, de forma breve, discutir o desempenho dos alunos no teste diagnostico aplicado. Na figura 3 são apresentados os índices percentuais de acerto de cada questão do teste aplicado antes da aula. Os resultados obtidos não foram uma grande surpresa, pois a diferenciação entre as grandezas física massa e peso tem sido alvo de diversos trabalhos e, em todos, é verificado que os alunos apresentam grandes dificuldades conceituais relacionadas ao tema.

Figura 3
Índices percentuais de acertos do teste aplicado pré – aula.

No caso especifico deste teste, a questão 1 colocava a prova a dualidade censo comum e conceito físico, pois mesmo não estando claramente escrito na embalagem apresentada, todos nós sabemos que nos produtos encontrados em qualquer loja, a unidade grama (g) ou quilograma (Kg) vem associada ao peso ou peso líquido do produto, desta forma não foi uma surpresa que o índice de acerto foi de apenas 13 %, cabe ressaltar que tal dualidade está tão entranhada que até mesmo os intérpretes apresentaram dificuldades em responder esta questão. As questões 3 e 5 também apresentaram resultados ruins, mas perfeitamente compreensíveis, afinal cotidianamente todos nós utilizamos a balança para medir o peso de alguma coisa e na questão 5 o objeto apresentado é conhecido nas academias como peso, logo era esperado que os alunos fizessem a associação de balança com peso.

As questões 2 e 4 foram as questões que apresentaram o maior índice de acertos (50 %), este resultado pode estar relacionado com o fato de que alguns alunos já cursaram o 1º ano do ensino médio e estes exemplos são resolvidos de forma exaustiva. É importante salientar que as questões 2 e 4 podem ser resolvidas de forma mais mecanizada enquanto as questões 1,3 e 5 são mais conceituais.

Na Figura 4 são apresentados os índices de acertos de cada questão do mesmo teste aplicado após a realização da aula. Os resultados apresentados de certa forma não foram surpreendentes, pois durante a aula, alguns alunos já haviam pedido para concertar o teste, pois perceberam que tinham assinalado a resposta errada. Gostaríamos de ressaltar que o fator mais importante não é o aumento do índice de acertos, mas que após a aula os alunos demonstraram ter compreendido a diferença conceitual entre massa e peso, tal avaliação foi feita através dos índices de acertos e através das curiosidades que os alunos apresentaram ao final da aula.

Figura 4
Índices percentuais de acertos do teste aplicado pós – aula.

5. Conclusões

Através da utilização de instrumentos que estão disponíveis em grande parte das escolas e do uso de sinais em libras adequados para o ensino de física, verificamos que foi possível ensinar um conteúdo especifico (neste caso a diferença entre peso e massa) através de uma aula "tradicional", mas que atende tanto aos alunos surdos quando aos ouvintes, ou seja respeitando as diferenças existentes entre os alunos é possível mitigar as dificuldades inerentes ao processo ensino-aprendizagem e garantir a todos acesso a um ensino de qualidade.

No planejamento da aula, inicialmente tivemos dificuldade de encontrar sinais que fossem adaptados ao ensino de física. Posteriormente, observamos que para o sucesso desta proposta a interação constante entre o professor e o interprete é fundamental, pois em algumas situações o professor tem que reestruturar a linguagem utilizada e em outras situações é necessário explicar o conteúdo que será abordado ao intérprete para que ele compreenda a importância e a necessidade da diferenciação entre o sinal utilizado no cotidiano do aluno e o sinal que é associado a determinada grandeza física. Quando observamos o produto final, verificamos que tal interação possibilitou a elaboração de um material que atende melhor todos os alunos. É importante ressaltarmos que a participação ativa do intérprete é fundamental pois e ele quem possibilita a comunicação efetiva entre pessoas que utilizam línguas diferentes, também não podemos esquecer que o intérprete se preocupa não só com o sinal, mas também com a estrutura das línguas em questão.

No decorrer da aula foi evidente o aumento da participação dos alunos surdos, e de acordo com nossas observações este maior interesse está diretamente relacionado com o fato de que o uso dos sinais adequados criou um espaço de plausibilidade no qual os alunos surdos sentiram uma maior sensação de pertencimento e isso fez com que eles tivessem um maior entendimento dos conteúdos, que por sua vez possibilitou uma maior participação dos alunos.

Sendo assim, acreditamos que essa proposta é válida para o ensino de física a alunos surdos, além disso os resultados obtidos nos testes diagnósticos e nos depoimentos voluntários corroboram para validar nossa proposta. Entretanto, observamos também a necessidade do aumento da interação entre o professor e o interprete e do desenvolvimento de mais pesquisas nesta área.

Referências bibliográficas

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1. Doutor em Ciências Físicas, Professor Adjunto IV no Departamento de Ciências Naturais. UFES. rodrigo.pereira@ufes.br

2. Mestranda em Ensino da educação básica. Centro Educacional In Pacto – São Mateus/ES. dani_fernandes02@hotmail.com


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