Espacios. Vol. 37 (Nº 04) Año 2016. Pág. 25

Estratégia e desenho do sistema de controle gerencial

Strategy and management control system design

Ricardo Vinícius Dias JORDÃO 1; Everton Alain de MELO 2; José Antônio SOUSA Neto 3

Recibido: 01/10/15 • Aprobado: 22/10/2015


Contenido

1. Introdução

2. Estratégia e sistema de controle gerencial

3. Metodologia

4. Apresentação e análise dos resultados

5. Considerações finais

6. Referências


RESUMO:

O objetivo desta pesquisa foi analisar o desenho e uso do sistema de controle gerencial (SCG) como facilitadores da implementação estratégica em uma empresa industrial. A metodologia utilizada foi um estudo de caso, qualitativo, explanatório, baseado em entrevistas, análise documental, observação participante e um grupo focal. Além da inovação na metodologia e a proposição de um desenho do SCG que colabore para a implementação estratégica, os achados da investigação ajudam a preencher uma lacuna de pesquisa, evidenciando que: (i) o SCG é um importante mecanismo facilitador da implementação estratégica e que o adequado desenho e uso do SCG (ii) facilita a comunicação organizacional, (iii) aumenta a congruência entre os setores, (iv) possibilita o aprendizado pelo uso interativo e (v) se mostra um mecanismo eficaz no fornecimento de elementos para estruturação do modelo de avaliação de desempenho estratégico e operacional; sendo observado também que (vi) tal mecanismo promove o processo de accountability.
Palavras-chave: Estratégia em Organizações. Competitividade. Implementação de Estratégias. Sistema de Controle Gerencial. Avaliação de Desempenho.

ABSTRACT:

The objective of this research was to analyze the design and use of a management control system (MCS) as a facilitator of strategic implementation in an industrial company. The methodology used was a qualitative and explanatory case study, based on interviews, document analysis, participant observation and a focus group. In addition to the innovation in the methodology and the proposal of a MCS design to collaborate for the strategic implementation, the findings of this research help filling a research gap, showing that the MCS (i) is an important facilitator mechanism of strategic implementation and that proper design and use of the MCS (ii) facilitates organizational communication, (iii) increases the consistency between sectors, (iv) enables learning through interactive use, and (v) presents itself as an effective mechanism in providing elements for structuring the evaluation model of strategic and operational performance; it was also observed that (vi) such a mechanism promotes the accountability process.
Keywords: Strategy in Organizations. Competitiveness. Strategy implementation. Management Control System. Performance evaluation.

1. Introdução

O aumento das pressões competitivas no ambiente de negócios tem exigido dos administradores novas formas de conduzirem os processos organizacionais, visando estimular o alcance dos objetivos das empresas (Herath, 2007; Porter, 1987; Jordão et al., 2014; Jordão et al., 2015) por meio de ações voltadas para estratégias que estabeleçam diferenciais competitivos sustentáveis para as mesmas (Porter, 1979; Mintzberg, 1987; Prahalad & Hamel, 1990; Simons, 1990; Montgomery & Porter, 1991; Jordão & Souza, 2013). A literatura internacional (e.g. Porter, 1979; Mintzberg, 1987; Henderson, 1989; Kaplan & Norton, 1996) evidencia uma clara a relação do planejamento estratégico com o sucesso e continuidade dos negócios. Entretanto, estudos internacionais contemporâneos (e.g. Jordão & Novas, 2013; Jordão et al., 2014) têm revelado uma preocupação da academia e do mercado provocada pelas dificuldades práticas das empresas sobre o processo de implementação estratégica (IE).

Uma das alternativas que a literatura sugere para facilitar esse processo consiste em um adequado desenho e uso do sistema de controle gerencial (SCG), ressaltando ainda a escassez de trabalhos empíricos sobre o tema (Gomes & Salas, 1999; Nilsson, 2002; Jordão, 2009; Jordão & Souza, 2013). Em especial, há uma lacuna sobre o desenho e uso do SCG que orientem tanto o alcance de resultados, quanto os processos de avaliação de desempenho (AD) (Frezatti et al., 2009). Diante dessa problemática, toma-se aqui como objeto de estudos a Empresa Delta (nome fictício por razões de confidencialidade) – que é a segunda maior indústria de calçados de segurança da América Latina em termos de volume de produção diária. Tal empresa vem trabalhando para usar o SCG para facilitar a IE e a AD além de buscar um desenho de SCG que ajude a superar tais dificuldades.

Assim, o objetivo da pesquisa descrita neste artigo consiste em analisar o desenho e uso do SCG como facilitadores da IE em uma empresa industrial.

A justificativa de uma pesquisa se dá na medida em que seus resultados contribuem para um segmento substancial da sociedade, como defendido por Jordão et al. (2014) e Jordão (2015). Assim, além da inovação na metodologia da pesquisa e da representatividade da empresa, buscou-se trazer contribuições (i) teóricas (por aumentar o entendimento do papel do desenho do SCG na IE – entendimento esse ainda incipiente na literatura, especialmente na realidade brasileira e no setor industrial) e (ii) empíricas (por melhorar o entendimento das reais dificuldades que os administradores de empresas têm enfrentado no momento de colocar em prática suas estratégias), sendo oportuna a proposição de um desenho do SCG que ajude nesse processo, contribuindo para academia melhorar o entendimento da lacuna supracitada e para que empresas similares encontrem uma oportunidade de benchmarking pelo relato de resultados que indiquem oportunidades de melhorias no desenho do SCG que facilitem tanto a IE e a AD, quanto estimulem o alcance de melhores resultados empresariais.

Este artigo está dividido em mais quatro seções para além desta introdução. Na seção 2 discute-se a integração entre estratégia e SCG. Na seção 3 descreve-se a metodologia da pesquisa. Na seção 4 são apresentados, analisados e discutidos os resultados do estudo. Por fim, na seção 5 tecem-se considerações finais à luz dos objetivos iniciais propostos, seguidas das referências bibliográficas utilizadas.

2.  Estratégia e sistema de controle gerencial

Ainda que não haja consenso para uma definição de estratégia (Henderson, 1989; Anthony & Govindarajan, 2004), Mintzberg (1987) a descreve como um padrão de propósitos e metas, associadas a políticas para atingir essas metas, definindo os negócios com os quais a empresa está envolvida. Prahalad & Hamel (1990), por sua vez, acrescentam que a formulação de estratégias (FE) consiste em identificar as competências essenciais que devem ser trabalhadas na empresa.

Por outro lado, fatores como falta de liderança estratégica, baixa aprendizagem, sistemas de controles falhos, atrasos de planejamento, problemas na alocação de recursos, falta e/ou incorreção na leitura ambiental, problemas de comunicação, dificuldades com adequação de rotinas, falta de envolvimento da alta administração, conflitos de poder da alta administração, ausência de comprometimento e resistência a mudanças tem se mostrado como as principais causas de insucesso no processo de IE (Ribeiro, 2012; Rodrigues et al., 2003; Stein, 2000). Não obstante, a literatura reconhece que o SCG tem contribuído para melhorar a IE e o processo de AD por: (i) apoiar os gestores na busca do melhor posicionamento possível para cada empresa, facilitando a IE dentro do nicho de mercado dela; (ii) suportar a tomada de decisão (Anthony & Govindarajan, 2004; Nascimento & Reginato, 2009); (iii) verificar se as medidas tomadas pelos membros da organização estão de acordo com os planos e políticas corporativas (Anthony, 1965); e ainda por ajudar a (iv) dimensionar se todos os processos estão no curso e no nível esperado, além de (v) fornecer informações relevantes para o processo de tomada de decisão através de mecanismos formais e informais de controle (Jordão, 2009). Os instrumentos formais são indicadores, procedimentos, sistemas de informação entre outros procedimentos estruturados. Já os mecanismos informais podem ser representados pelo controle social, onde indivíduos se autoajustam ao padrão de interação de subgrupos da organização e pelo controle cultural, expressos pelos padrões normativos da organização que guiam o comportamento de seus funcionários, comumente identificados em declarações de missão, visão e valores (Jordão et al., 2014).

Ferreira & Otley (2005, 2009), preceituam que a estrutura do SCG é formada por dois constructos: desenho e uso. Segundo Jordão & Souza (2013), ambos os processos se complementam na IE. Conforme Frezatti et al.  (2009), a dimensão uso do SCG remete ao modo que os executivos utilizarão das informações geradas pelo sistema podendo ser de três tipos: diagnóstico, interativo e disfuncional. Já o desenho do SCG, por sua vez, segundo Malmi & Brown (2008) pode ser pensado em quatro tipos de pacotes: controles culturais, cibernéticos, de planejamento e controles administrativos. Na visão Ferreira & Otley (2005), o desenho se refere a características da informação, tais como: escopo, tempestividade, agregação, integração, custos e as técnicas que serão utilizadas. Esses aspectos podem ser divididos em técnicas tradicionais como controle orçamentário, custeio por absorção e medidas financeiras; e contemporâneas como balanced scorecard (BSC), benchmarking, target costing e o economic value aded (EVA). De forma mais específica Mendes et al. (2002, p. 4) evidenciam que:

O desenho compreende a estrutura do controle e o processo de controle. A estrutura de controle deve considerar os indicadores (variáveis-chave) que possibilitarão o controle de cada unidade, a mensuração de sua atuação e o sistema de informação que permita o acompanhamento periódico da evolução dos indicadores identificados. Já o processo de controle representa o planejamento, a avaliação do resultado e as decisões corretivas.

Do que fora dito, observa-se que a síntese desses estudos indica que o desenho e uso do SCG são mecanismos que estimulam e melhoram a FE e potencializam a IE, o alcance dos resultados e a manutenção e melhoria da posição competitiva das empresas, sendo que um adequado desenho e uso do SCG podem facilitar a AD e fornecer informações para a tomada de decisão estratégica e operacional, além do acompanhamento e melhoria dos resultados empresariais.

3. Metodologia

Para atingir os objetivos da pesquisa descrita neste artigo, foi realizado um estudo explanatório de abordagem qualitativa (Cooper & Schindler, 2006). Quanto aos meios, foram observadas as proposições de aplicabilidade citadas por Yin (1984), realizando, assim, um estudo de caso em uma empresa industrial que atua no segmento de calçados de segurança. Outros pesquisadores do tema como Jordão & Souza (2013) têm utilizado dessa abordagem em seus estudos, e têm argumentado e encontrado evidências de que esse método é suficientemente sensível para captar a complexidade inerente ao potencial do SCG como facilitador da IE. Eisenhardt (1989) ressalta a relevância desse tipo de pesquisa. Tal autora lembra que estudos de casos desenvolvidos em contextos similares ao discutido no presente estudo facilitam tanto a construção de novas teorias e modelos, quanto à ampliação e validação dos já existentes.

As fontes de evidências utilizadas no estudo de caso foram as entrevistas pessoais, em profundidade, a pesquisa documental, a observação participante e um grupo focal. Vale ressaltar quanto às entrevistas que estas foram realizadas em duas etapas. A primeira, que teve por objetivo descobrir o que as pessoas pensam, fazem e sentem sobre a FE e a IE e sobre o processo de controle da empresa. Os atores nessa etapa foram os diretores, gerentes de operações, coordenadores, supervisores e as pessoas chave das operações de fabricação. Essa fase ainda permitiu identificar o nível de conhecimento desses sujeitos sobre as operações da empresa, o modo que eles enxergam a FE e a IE, a percepção sobre a qualidade do controle de operações e a relação prática existente na empresa entre os planos estratégicos e as operações. Tais entrevistas também foram úteis para aprimoramento do roteiro das entrevistas semiestruturadas da segunda fase – que foi apoiada em um roteiro de entrevista composto por 40 questões, baseando-se em variáveis extraídas da literatura referentes a resultados empíricos de estudos anteriores concernentes as dificuldades na IE, ao desenho e uso do SCG, e das potencialidades do SCG para facilitar a IE. A escolha do caso e dos entrevistados foi feita por tipicidade, com base no acesso às informações, considerado por Nilsson (2002) e Granlund (2003) como uma das maiores dificuldades nesse tipo de pesquisa. Entrevistaram-se pessoas de diferentes cargos e níveis, desde o presidente da empresa, passando por diretores, gestores, analistas de negócio e consultores, até os empregados de nível técnico e os vinculados à operação. Todos os sujeitos vivenciam aspectos do SCG da organização. No total, entre janeiro e maio de 2014, foram realizadas 38 entrevistas, com duração aproximada de 15 minutos cada, totalizando um pouco mais de 8 horas de gravação. Ressalta-se que as pessoas com maior capacidade informativa ou maior posição hierárquica foram ouvidas por mais tempo (variando de 30 a 60 minutos). As entrevistas foram transcritas e tabuladas, sendo a análise delas realizada por meio do método de análise de conteúdo, como indicado por Bardin (2004). No conjunto, as variáveis analisadas buscaram ajudar a entender a maneira que a empresa elabora, executa e controla suas estratégias e as dimensões do seu SCG, com o intuito de identificar como este ajuda naquela, na tentativa de evidenciar lacunas nos achados empíricos quando comparados com as teorias de base, corroborando, contradizendo ou complementando os achados empíricos e premissas anteriores.

Visando aumentar a validade interna do estudo, procurou-se agregar informações coletadas em outras fontes de evidência (processo de triangulação) (Jick, 1979). Assim, sempre que possível, as informações advindas de uma fonte foram confrontadas com as de outras para confirmá-las e validá-las. Esse processo iniciou-se com as próprias entrevistas, pois foram ouvidas pessoas diferentes sobre um mesmo tópico. Paralelamente, a triangulação envolveu a análise de folhetos informativos, de informações constantes em web pages, de manuais de procedimentos e de notícias publicadas em jornais e revistas sobre a empresa e o setor em que ela atua (análise documental), além de observação direta (observação participante). Após a análise resultados foi possível elaborar algumas conclusões provisórias. Estas foram apresentadas a um grupo focal (cf. Gomes & Barbosa, 1999) realizado com pessoas dos níveis estratégicos, tático e operacional da empresa, escolhidas por tipicidade para refinar os achados e aumentar a validade dos mesmos, eliminando possíveis vieses e contribuindo para a divulgação dos resultados da pesquisa para os respondentes. Com a colaboração dos integrantes da empresa que participaram desse grupo focal, foi possível sugerir uma nova proposta de desenho e uso do SCG, buscando maior alinhamento entre as teorias de base e as práticas da empresa acreditando que esse esforço possa melhorar a IE na empresa estudada. Vale mencionar que, por motivo de parcimônia, os resultados da triangulação foram apresentados ao longo do texto com as novas informações advindas das análises supramencionadas, corroborando ou refutando as anteriores. Finalmente, analisaram-se também as informações obtidas em conversas informais (extra-entrevistas), além de contatos posteriores às entrevistas, com o propósito de complementar dados e de esclarecer as dúvidas existentes. Assim, seguindo todos os passos propostos por Eisenhardt (1989), buscou-se dar robustividade ao estudo e formar uma cadeia nomológica de evidências, mesclando informações internas e externas, além de confrontar os resultados entre si e confrontar estes com a literatura – o que se espera poder ajudar a compreender melhor o tema estudado.

4. Apresentação e análise dos resultados

A empresa Delta iniciou suas atividades em 1972, sendo enquadrada como uma indústria de grande porte, segundo os critérios de classificação definidos pelo SEBRAE, contando atualmente com aproximadamente 2100 funcionários diretos, oito plantas de fabricação distribuídas no Brasil e capacidade produtiva de 40 mil pares de calçados por dia. O pensamento estratégico da empresa vem evoluindo nos últimos anos, suportado, em parte, por um comitê composto pela diretoria e cinco gerentes, que apoiados por uma consultoria externa, discutem, elaboraram e analisam os planos estratégicos e resultados dos negócios, iniciando pela análise do ambiente externo na tentativa de identificar oportunidades e meios de aproveitá-las, além de maneiras para mitigar os riscos e ameaças externas evidenciadas. São analisados pontos como mudanças nos cenários políticos, econômico, tributário, ambiental e competitivo, de fornecimento de matérias-primas, dentre outros. Depois, busca-se entender e mapear o ambiente interno, sendo analisados aspectos como liderança estratégica, processos e recursos organizacionais. O terceiro ponto analisado trata do escopo competitivo, cuja preocupação reside na segmentação do mercado, na identificação dos clientes e seus segmentos, nos produtos necessários para cada segmento de mercado e nas competências que precisam ser desenvolvidas para atender esses mercados segmentados. A análise do processo de FE da empresa permitiu a realização da análise de ambientes e a clara definição do escopo de atuação, tendo como base a análise SWOT, em linha com o pensamento de Porter (1979). Um diretor fez a seguinte ponderação sobre esse processo:

O planejamento estratégico da empresa vem se aprimorando ao longo dos anos. Ainda precisamos melhorar, mas posso dizer que já estamos em 80% do que se é necessário para dizermos ter um bom planejamento estratégico (Relato do diretor industrial).

Embora a empresa venha evoluindo no processo de FE, ainda há problemas de coordenação e sistematização de algumas ações estratégicas, dificultando que ela utilize seus diferenciais para criar vantagens competitivas, como proposto por Prahalad & Hamel (1990) e Montgomery & Porter (1991). Algumas estratégias tem visão de mercado. Outras funcionam como um plano de ação de melhoria contínua dos processos da empresa. Não obstante, esse problema pode ser percebido no depoimento de alguns diretores como o de finanças e o de TI que chegaram a dizer até que "não há uma estratégia formalizada". Outros diretores, como o geral, o industrial, o de logística e o de controladoria explicam que a empresa se esforça se esforça para isso, mas ainda não a tem formalizada. Porém, parece haver um consenso de que, ao longo dos anos, a empresa veio criando uma estratégia informal que indica a direção geral em que a ela pretende se mover orientando às decisões empresariais, em linha com os achados de Jordão e Souza (2013).  A análise conjunta dos depoimentos e dos documentos indicou que a empresa ainda enfrenta dificuldades práticas na IE, derivadas, em grande parte, de problemas na formulação e sistematização do planejamento, dificultando o controle das mesmas. Alias, é possível dizer que a empresa tem uma taxa de insucesso considerável de seus planos estratégicos, uma vez que 41,18% das estratégias que estavam para ser postas em prática a partir do ano de 2013, ainda não foram até o início de 2015. A maior parte dos entrevistados entende que a empresa parece estar aquém do esperado na execução de seus planos, mas reconhecem que existe uma evolução no processo, ressaltando o esforço em busca do aprendizado, sendo relatadas melhorias significativas em 2014. Os relatos dos diretores de suprimentos e de TI corroboram que a empresa tem melhorado nesse aspecto, mas deixam claro que ainda existem muitas falhas no processo. Já os relatos advindos dos respondentes que atuam nos níveis tático e operacional apontam que a maior dificuldade do processo estratégico está na comunicação com esses níveis, indicando que esta quando não é incompleta é inexistente, inviabilizando que gerentes, coordenadores e analistas dos níveis básicos e intermediários realizem ações coordenadas com o pensamento estratégico da empresa. A síntese dos achados sobre estratégia está apresentada no Quadro 1.

Quadro 01: Análise dos achados empíricos frente à literatura sobre estratégias

Oportunidades de melhoria frente às práticas indicadas pela teoria Resultados Situação atual Marco teórico
FE - fatores econômicos Não foi definido plano para este risco. Avaliação informal. Contradizem a teoria Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)
FE - fatores políticos Não foi definido plano para este risco. Avaliação informal. Contradizem a teoria Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)
FE - fatores tributários Ponto não contemplado no PE. Avaliação informal. Contradizem a teoria Tavares (2000)
Visão estratégica Não sistematizada, mas já há um comitê que colabora para que ela seja sedimentada – evolução gradual ao longo dos anos. Confirmam em parte  ampliam a teoria Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002); Jordão et al. (2014)
Ambiente externo: Leitura do tamanho e oportunidades do setor A empresa tenta fazer uma leitura empírica do mercado para segmentá-lo que não é de todo confiável. Avaliação parcial. Confirmam em parte a teoria Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)
Ambiente externo: Posicionamento dos concorrentes Não existe uma leitura clara, formal e confiável do posicionamento dos concorrentes. Avaliação parcial. Contradizem a teoria Porter (1987); Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)
Escolha das estratégias competitivas genéricas A empresa não possui um posicionamento estratégico definido formalmente entre custos e diferenciação. Observou-se a luz da teoria que a mesma esta mais próxima da estratégia de enfoque. Confirmam em parte a teoria Porter (1979); Tavares (2000); Bossidy & Charan (2002); Nilsson (2002); Jordão & Souza (2013)
Reconhecimento e potencialização da vantagem competitiva Não foram identificadas vantagens competitivas frente aos concorrentes para serem exploradas. Lacuna gerencial. Contradizem a teoria Porter (1979); Prahalad & Hamel (1990); Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)
Escolha das estratégias internas Não formalizado. Observou-se, à luz da teoria, que a mesma esta mais alinhada a estratégia de manutenção saindo de um período de estratégia de desenvolvimento Confirmam em parte a teoria Tavares (2000); Ribeiro (2012); Jordão & Souza (2013) 
Características das estratégias desenvolvidas quanto à inovação As estratégias da empresa são de caráter incremental. Não há inovações no plano estratégico atual Confirmam em parte a teoria Tavares (2000); Bossidy & Charan  (2002)

Fonte: Elaboração própria com base nos resultados da pesquisa.

Como observado no Quadro 1, também foram encontradas outras questões no processo de IE da empresa como falta de liderança, baixa aprendizagem, problemas de alocação de recursos e conflitos de poder da alta administração. Por sua vez, sistemas de controles falhos, atrasos de planejamento, incorreção na leitura ambiental, falhas na comunicação, falta de envolvimento da alta administração, ausência de comprometimento e resistência a mudanças estão presentes na organização e tem confirmado suas implicações negativas sobre a IE. As divergências encontradas nesse processo parecem ser consequência do fato da estratégia da empresa ser parcialmente informal. Mesmo existindo um processo oficial de FE e IE, ainda existem alguns elementos que ficaram restritos a discussões informais, sendo mais suscetíveis ao insucesso. Como exemplo, conforme análise documental, pode-se citar a criação de novas linhas de produtos que foram discutidas em reuniões, mas não estão nos documentos oficiais, havendo uma lacuna nos planos, nas metas e nos mecanismos de controle.

Quanto a análise do SCG da empresa apresentada no Quadro 2, os resultados demonstram que é possível encontrar elementos no desenho do SCG da empresa oriundos de proposições de vários autores como Ferreira & Otley (2005), Malmi & Browm (2008), Frezatti et al. (2009) e Jordão et al. (2014), caracterizando assim um desenho misto do SCG com aspectos de controle familiar e resultados, segundo a taxonomia proposta por Gomes e Salas (1999). Isto provavelmente se deve ao fato da empresa ter passado por vários processos de consultoria, que trouxeram propostas de mudanças, implantaram novos processos e realizam adequações em momentos diferentes e com focos diferentes. Na busca de confirmar empiricamente a importância do SCG como mecanismo influenciador do comportamento dos indivíduos, os resultados complementam a literatura uma vez que foi possível observar que além de influenciar o comportamento das pessoas, o SCG induz a busca de resultados cada vez melhores de forma aperfeiçoada, sobretudo nas operações de fabricação. Foi possível confirmar a existência de uma estrutura de controle composta controles formais tais como: indicadores, procedimentos, políticas, sistema de informação; e controle informais como as declarações de missão, visão e valores, em linha com os achados de Cravens et al. (2004) e Jordão & Souza (2013). O processo de controle está estruturado em processos de planejamento, AD e atuação sobre os desvios e/ou melhorias identificadas, ressaltando-se que a empresa ainda não faz o uso de técnicas contemporâneas de gestão como o BSC, target constig, custeio ABC ou EVA.

Quanto ao uso do SCG, buscou-se realizar a verificação empírica das proposições de Simons (1994) que descreve o uso dos SCG como sistema de crenças, de restrições, de controle diagnóstico e de controle interativo.

Quadro 02: Análise dos achados empíricos frente à literatura sobre SCG

Oportunidades de melhoria frente às práticas indicadas pela teoria Resultados Situação atual Marco teórico
SCG: Controle das operações de vendas e marketing Não cumprimento de metas.  Baixo nível de controle, confirmando, parcialmente a teoria. Anthony & Govindarajan (2004); Malmi & Brown (2008)
Gestão de devoluções e reposições. Simples acesso a cancelamento e alteração de pedidos
SCG: Controle de operações de logística interna Recebimento de matérias-primas e estoques com altos índices de inventários. Ordens de produção sem os materiais necessários para abastecimento da produção Baixo nível de controle, confirmando, parcialmente a teoria. Anthony & Govindarajan (2004); Malmi & Brown (2008)
SCG: Controle de operações de logística externa Controle dos produtos acabados – altos índices de inventários Baixo nível de controle. Anthony & Govindarajan (2004); Malmi & Brown (2008)
Contradizem a teoria.
SCG: Controle de operações de produção Controle dos produtos em processo – altos índices de inventários Baixo nível de controle. Contradizem a teoria. Anthony & Govindarajan (2004); Malmi & Brown (2008)
SCG e a implementação estratégica SCG não tem facilitado a IE da empresa como esperado Contradizem a teoria Bossidy & Charan (2002); Anthony & Govindarajan (2004); Jordão & Souza (2013)
SCG e o controle estratégico Não foi possível confirmar o uso do SCG para ajudar o controle estratégico Contradizem a teoria Nilsson (2002); Anthony & Govindarajan (2004); Jordão & Souza (2013)
SCG e a avaliação do desempenho estratégico Não foi possível confirmar o uso do SCG para ajudar a avaliação do desempenho estratégico Contradizem a teoria Bossidy & Charan (2002);
 
Malmi & Brown (2008); Ferreira & Otley (2009); Jordão & Novas (2013)
SCG - Tempestividade das informações Há informações que não chegam aos usuários na velocidade esperada.  Contradizem em parte a teoria Ferreira & Otley (2005); Frezatti et al. (2009); Jordão & Souza (2013); Jordão et al. (2014)
Uso de técnicas como benchmarking, BSC e/ou o EVA vinculados ao SCG. Não evidenciadas Contradizem a teoria Ferreira & Otley (2005); Frezatti et al. (2009); Jordão & Souza (2013); Jordão et al. (2014)

Fonte: Elaboração própria com base nos resultados da pesquisa.

Os resultados da análise documental, entrevistas e observações diretas demonstram que foi possível observar o uso do SCG como sistema de crenças na empresa – composto (i) pela estrutura de governança, representados pelas reuniões formais e informais realizadas com o presidente da empresa; e (ii) pelos sistemas de valores, representados pela visão, missão e política da qualidade da empresa. Esses últimos controles informais tem a missão de influenciar o comportamento dos colaboradores, alinhando-os aos objetivos e valores da empresa corroborando com os achados de Jordão et al. (2014).

No que se diz ao uso do SCG como sistema de restrições, com função de delimitar o campo de ação, criando limitações aos usuários, foi possível evidenciar pelos achados empíricos que tal processo na empresa está estabelecido pela a visão e diretriz estratégica, assim como pelas as políticas e procedimentos. A visão tem a atribuição de definir os limites mercadológicos, e a diretriz estratégica delimita e direciona as ações e os procedimentos e políticas responsáveis pelas restrições dos indivíduos em âmbito setorial da execução da atividade, assim como em âmbito empresarial. Já o uso do SCG como sistema de controle diagnóstico foi evidenciado pelos controles estratégicos, metas de produtividade e eficiência, controle do orçamento, controle de custos, controles de vendas, controles financeiros e controles de qualidade. Esse item foi o mais explícito quando se buscou confirmar a teoria nas práticas da empresa, em linha com o pensamento de Simons (1994).

Por sua vez, o uso do SCG como sistema de controle interativo trata das incertezas estratégias estimulando o debate e diálogo. As medidas relativas à produção, custos, orçamentos, indicadores do planejamento estratégico e do sistema de garantia da qualidade são os SCG que melhor representam o uso interativo na empresa demandando acompanhamento constante e promovendo reuniões formais e informais para debater os resultados e para a busca continua de melhoria dos resultados. As reuniões de planejamento estratégico, de análise crítica, reuniões de diretoria e demais reuniões entre gestores são grandes agentes para a ocorrência do controle interativo permitindo a troca de informações e experiências e o aprendizado organizacional, corroborando também com Simons (1994).

A triangulação dos depoimentos, observações e documentos permitiu verificar que o desenho e uso do SCG ainda são incipientes como mecanismos facilitadores da IE. Os achados empíricos demonstraram que alguns setores da empresa alcançaram maior eficiência e eficácia em seus processos de controle, enquanto outros setores ainda possuem processos falhos ou em construção. A partir de tais observações, uma analise mais refinada evidenciou que as estratégias que eram geridas pelos setores que possuíam os processos de controle menos preparados, obtiveram maiores taxas de insucesso na IE. Outro ponto responsável por esse insucesso se refere ao processo de AD – que não segue as proposições de Jordão & Novas (2013), que sugerem que seja estabelecido vínculo entre estratégias e operações para permitir um melhor acompanhamento da IE. Ademais, a AD da empresa se mostra desalinhada ao planejamento estratégico. Isto se deve, em parte, ao fato que o processo de AD atualmente é realizado por meio uma reunião mensal do comitê estratégico onde os resultados de um conjunto de indicadores são analisados. Contudo, alguns dos indicadores escolhidos para o processo de gestão, não tem relação direta com a IE. Foi possível observar também pelos depoimentos dos membros do comitê de gestão estratégica que "é dada maior ênfase aos indicadores financeiros (como EBITDA e rentabilidade), do que aos demais indicadores não financeiros da empresa".

A triangulação entre os depoimentos revelou que existem estratégias que são formalizadas, mas não possuem indicadores de monitoramento, ficando, por isso, esquecidas durante o processo de IE. Adicionalmente, constatou-se que a empresa adquiriu um software no início do ano de 2013 para ajudar a melhorar sua IE e sua AD. Entretanto, fatores como atrasos de planejamento, falta de envolvimento da alta administração, ausência de vínculo entre estratégias e operações e resistência a mudanças se mostraram como entraves ao processo. Sumarizando os resultados encontrados, percebeu-se que principais lacunas encontradas em relação à IE apareceram nos setores que possuem processos de controle mais frágeis, não sendo feito vínculo entre estratégias e operações para permitir a AD.

4.1 Discussão dos Resultados & Conclusões Provisórias

A eficiência na IE se confirmou como um ponto crítico na empresa estudada, em linha com as pesquisas anteriores de Almeida (2004), Rodrigues et al. (2003), Ribeiro (2012) e Stein (2000). Os resultados da pesquisa demonstram que 33,33% das estratégias traçadas para o ano de 2013 foram totalmente implementadas em 2014, 25,49% foram implementadas em parte e 41,18% não foram implementadas, mesmo que de forma parcial. Os números foram classificados como insatisfatórios quando apresentados aos participantes do grupo focal.

Houve evidências claras de que a empresa demonstra preocupação com a IE, contudo, esse processo se mostra em construção com falhas na comunicação, condução, foco e na AD. Ademais, fatores clássicos de insucesso como sistemas de controles falhos, atrasos de planejamento, incorreção na leitura ambiental, falta de envolvimento da alta administração, ausência de comprometimento e resistência a mudanças estão presentes na organização e tem confirmado suas implicações negativas quanto ao processo de IE. Cabe ressaltar ainda uma séria lacuna verificada no processo referente a não identificação das competências distintivas, contradizendo autores como Prahalad & Hamel (1990) e Montgomery & Porter (1991) que defendem que as estratégias precisam ser desenvolvidas com o objetivo central de manter e buscarem manter e ampliar, se possível, a competitiva empresarial, ajudando-a a aumentar seu market share e sua lucratividade. 

Por sua vez, a análise dos resultados do SCG confirmou que esse sistema se mostrou como um importante instrumento para influenciar o comportamento das pessoas e facilitar a IE. Contudo, esse processo tem sido prejudicado por falhas no SCG derivadas de deficiências nos controles culturais, estratégicos, de produção, dos canais de comunicação e sobre a gestão de pessoas. Mesmo assim, foi possível identificar uma evolução em tal sistema ao longo dos anos, especialmente no controle orçamentário, financeiro, de qualidade e da estrutura administrativa. As influências supramencionadas confirmam a interdependência dos referidos elementos como SCG preconizada por Frezatti (2007) e Ferreira & Otley (2009).

 O diretor de TI, que possui vinte cinco anos de experiência na empresa, entende que a causa de alguns processos de controle serem um pouco mais evoluídos do que outros pode estar na diferença na formação e competência dos gestores operacionais. Esse relato confirma as preocupações do diretor-geral sobre as competências da equipe e a necessidade de capacitação das pessoas, aumentando a base de conhecimentos da empresa. O apontamento de que pessoas não capacitadas e controles ineficazes podem afetar a IE já havia sido discutido por autores como Rodrigues et al. (2003), Stein (2000) e Jordão et al. (2013).

Também foram identificadas lacunas entre a literatura e os achados empíricos no processo de controle da AD, assim como entre vínculos de estratégias e operações por meio de controle sobre variáveis-chave que permitiriam indicar se as estratégicas traçadas estão ou não sendo implementadas, como sugerido por Kaplan & Norton (1996), Gomes & Salas (1999) e Anthony & Govindarajan (2004) – que ressaltam a necessidade dos gestores identificarem variáveis ou processo-chaves que possam indicar o nível de implementação de cada uma das estratégias traçadas pela direção da empresa. Como o planejamento estratégico da empresa, até o momento, é monitorado por um conjunto de indicadores, dos quais alguns não têm relação com as estratégias traçadas, pode ocorrer desvios de esforços para itens de menor representatividade para o negócio, colaborando para o insucesso da IE pelo fato de não identificar no tempo correto se as mesmas estão sendo executadas dentro do padrão esperado.

4.2 Refinamentos na Análise & Proposta de Desenho do Sistema de Controle Gerencial

A partir da identificação dos pontos de divergência entre o processo de estratégia e o SCG da empresa e as proposições da literatura (processo dedutivo), desenvolveu-se uma proposta de desenho do SCG que viesse facilitar a IE e a AD na empresa (processo indutivo), aperfeiçoando ambos os processos. Nesse sentido, com o intuito de tornar essa proposta mais completa e adequada às necessidades e realidade da empresa, foi realizado um grupo focal que contou com a participação de membros da presidência, da diretoria, da média gerencia, assim como de coordenadores e analistas, representando, assim, os níveis estratégico, tático e operacional da companhia. Foram apresentados os resultados encontrados no estudo referentes à IE e AD e ao SCG, revelando as lacunas entre as teorias de base e as práticas gerenciais em cada um de tais aspectos. Adicionalmente, foram apresentadas propostas de desenho do SCG desenvolvidas com base em resultados teóricos e/ou empíricos anteriores para apreciação dos respondentes. Os resultados indicam que o baixo nível da IE promoveu grande reflexão no grupo em todos os níveis gerenciais. Vale destacar a surpresa de alguns membros quantos aos resultados, pois alguns respondentes como o diretor de TI ponderaram que "de acordo com as práticas que nos são apresentadas, sustentadas nos autores, nós realmente ainda não temos um planejamento estratégico! Onde estão nossas vantagens competitivas?" O gerente e a coordenadora da qualidade fizeram questão de evidenciar suas aprovações quanto aos resultados da pesquisa. O coordenador de qualidade disse "passamos despercebidos quanto a estas realidades. Com a evidenciação de tais situações pela pesquisa fica fácil entender porque nossos resultados não estão a contento". Especificamente sobre a AD, o gerente da qualidade e o gerente de controladoria, que são os principais responsáveis pelo processo, concordam que a empresa, de fato, tem dado maior ênfase para as medidas financeiras do que as medidas não financeiras. Também cabe destacar que, de todos os pontos apresentados sobre o processo de formulação e IE da empresa, não houve contestação de qualquer dos resultados por nenhum dos respondentes, nem mesmo sobre os resultados que apontam que a empresa não tem entendimento completo do seu desempenho e que não há uma análise das relações de causa-efeito entre os vários indicadores existentes, pois não houve contestação e todos os integrantes do grupo validaram os resultados e confirmaram a necessidade que um trabalho visando uma apuração mais correta do resultado empresarial é emergencial. Perto do fechamento da reunião, o diretor-geral fez uma explanação dizendo:

Concordo com os resultados da pesquisa e, em conversas constantes com colegas dirigentes de outras empresas e clientes que também tem o desafio de criar e implementar estratégias percebo dificuldades similares com as nossas – que também são encontradas em outras empresas como descritos durante a apresentação. Vejo que esse trabalho pode nos trazer muitos benefícios e gostaria que já se iniciasse os trabalhos de intervenção a partir do diagnóstico apresentado de nossa situação atual para buscarmos ajustes, se possível, ainda no plano estratégico deste ano e já utilizarmos de tal aprendizado para os planos estratégicos futuros (Relato do diretor geral).

A partir do diagnóstico feito na empresa com base nos resultados da pesquisa, e potencializados pela realização do grupo focal, foi proposto um novo desenho do SCG na tentativa de aumentar suas contribuições para facilitar a IE, mantendo ou melhorando a eficácia desse sistema em influenciar o comportamento dos indivíduos, em linha com autores da literatura internacional como Anthony (1965), Lorange & Morton, (1974), Hofstede (1978), Simons (1994), Flamholtz (1996), Anthony & Govindarajan (2004) e Atkinson et al. (2011), Jordão & Novas (2013) e Jordão et al. (2014). O novo desenho se fundamentou na teoria contingencial (e.g. Otley, 1980; Govindarajan, 1988; Jordão & Souza, 2013), pela qual não existe um desenho único de controle que seja universalmente aceito em todas as situações. Desse modo cada organização pode selecionar um desenho do SCG conforme suas próprias necessidades. Assim o referido desenho levou em consideração inicialmente as divergências identificadas entre a literatura e a realidade à luz dos conceitos postulados por Gomes & Salas (1999) e Anthony & Govindarajan (2004), Jordão & Novas (2013) e Jordão & Souza (2013), segundo os quais, o desenho do SCG deve ser estruturado a partir da visão e missão da empresa, passando pelos objetivos estratégicos, até chegar aos objetivos e metas operacionais. Adicionalmente, buscou-se aliar estas proposições com as premissas de Hofstede (1978) e Jordão et al. (2014) relativas a necessidade de incorporar as características da cultura organizacional no desenho do SCG. Frente a essa necessidade, o desenho proposto do SCG, teve como elementos principais a visão, missão, objetivos estratégicos, cultura e a estrutura organizacional da empresa – representada por seus departamentos, hierarquias e fluxos de atividades e informações. Segundo Jordão (2009), isso ajuda a facilitar o alcance de tais objetivos e melhorar o suporte decisorial do SCG.

No cerne do SCG foram contemplados o planejamento estratégico com seus respectivos desdobramentos a nível tático e operacional, compondo o núcleo do controle. Nesse núcleo também foram estabelecidos os vínculos entre os processos-chave das operações e os planos estratégicos. A estruturação dos referidos elementos de controle contou com os conceitos postulados por Ferreira & Otley (2009) e Malmi & Brown (2008). Ainda no núcleo se encontra o pacote de AD composto por metas, política de AD, política de recompensas ou sanções e os canais de informação e comunicação, igualmente alinhados com as proposições de Ferreira & Otley (2009) e Malmi & Brown (2008). No desenho de SCG proposto, o cerne se volta para a AD – que se espera facilitar o monitoramento da IE e das operações da empresa, contribuindo para a congruência dos objetivos (cf. Anthony & Govindarajan, 2004) e avaliando quão eficaz e eficientemente os recursos estão sendo empregados no alcance dos objetivos da empresa (cf. Atkinson et al., 2011; Jordão et al., 2014). Ademais, o desenho proposto oferece respostas para os principais fatores de insucesso existentes na empresa. O núcleo de controle oferece recursos/mecanismos para mitigar os problemas de controles falhos, ausência de indicadores confiáveis e atrasos de planejamento. Já a observação de aspectos da cultura organizacional, o alinhamento dos canais de comunicação e o estabelecimento dos sistemas de recompensa, por sua vez, ajudam a reduzir a resistência a mudanças e facilitam a introdução das mudanças. Por fim, a AD promove o processo de accountability promovendo a prestação de contas e influenciando o comportamento das pessoas a começar pela alta administração – que deve se envolver mais no processo de IE, sendo esta uma questão essencial no sucesso de tal processo, conforme verificado por Jordão & Souza (2013) e Jordão et al. (2014). Espera-se que o modelo proposto, cuja concepção respeitou as proposições de Eisenhardt & Graebner (2007), cubra os pontos do SCG que, na atualidade, estão divergentes com as boas práticas de gestão, em geral, e com o potencial do SCG, em particular, conforme observado pelo confronto dos resultados com a literatura.

5. Considerações finais

A literatura internacional evidencia uma clara a relação do planejamento estratégico com o sucesso e continuidade dos negócios, revelando, porém, uma preocupação da academia e do mercado decorrente das dificuldades práticas que as empresas enfrentam na hora de implementar suas estratégias. Uma das principais fatores que a literatura sugere facilitar o processo de IE e AD consiste em um adequado desenho e uso do SCG, ressaltando ainda a escassez de trabalhos empíricos sobre o tema. Reconhecendo e explorando essa lacuna de investigação, o objetivo da pesquisa descrita neste artigo foi analisar o desenho e uso do SCG como facilitadores da IE em uma empresa industrial. Para melhor entender as contribuições do SCG para a IE e a AD, realizou-se um estudo de caso, baseado em entrevistas estruturadas e não estruturadas, observação participante, pesquisa documental e relatos formais e informais, triangulando essas informações entre si e com as teorias de base. Depois se congregou essas informações com outras obtidas em um grupo focal, visando confirmá-las, refutá-las ou complementá-las, além de eliminar qualquer possível viés nas conclusões.

Os resultados indicam que o SCG se mostrou uma importante ferramenta no processo de decisão, no controle operacional, na alocação de recursos, na integração entre setores e na geração de congruência organizacional. Ademais, ficou evidente na pesquisa de campo o quanto o SCG influencia o comportamento das pessoas. Do que fora visto, pode se inferir que o SCG proporciona contribuições reais para o estabelecimento de um processo de AD estratégico e operacional – o que promove o processo de accountability.

O estudo de caso permitiu observar que os setores que já tinham o SCG mais estruturado obtiveram melhores números no cumprimento de suas metas e objetivos estratégicos com resultados mais satisfatórios do que setores que possuíam processos de controle mais incipientes. Foi confirmado que o SCG pode ajudar a relacionar estratégia e operações, permitindo uma melhor AD e a integração entre os processos estratégico e operacional da empresa. No entanto, a empresa ainda não utiliza esse potencial de forma plena, sendo que tais questões podem ser estimuladas pela qualidade da comunicação da empresa. De um lado, uma comunicação clara da estratégia da empresa e de seus objetivos, entre os níveis estratégico, tático e operacional, torna os resultados mais factíveis. Falhas na comunicação e no esclarecimento de responsabilidades, como verificado, impactam negativamente nesses resultados. Observou-se que a estrutura e o processo do controle, de fato, promovem a AD; e que um adequado desenho e uso do SCG tem papel fundamental na geração de informações, que podem ser usadas de forma diagnóstica e/ou interativa, para medir os resultados, corrigir incorreções e avaliar os resultados após os processos de ajuste, além de estimular que as pessoas se comportem no sentido de buscarem os objetivos da empresa. Relatos formais e informais durante a pesquisa confirmaram que colaboradores que tem seus resultados medidos e controlados tem mais preocupação com o cumprimento dos mesmos, ao contrário dos demais. Adicionalmente, durante a pesquisa, percebeu-se que o controle estratégico e operacional passa pela identificação das principais operações da cadeia valor, uma vez que o conhecimento das mesmas possibilita a identificação dos processos-chave de tais operações. Esse ponto proporcionou um conhecimento maior da empresa e daquilo que era mais importante de se controlar. Esse dado permitiu que fosse evidenciado que algumas atividades e alguns processos possuíam uma relação mais íntima de causa-efeito com os resultados do negócio do que outros(as). Vale mencionar que a proposição do desenho do SCG passou por alguns passos que podem ser utilizados por outras empresas em situações similares. Assim, foram feitos esforços para (i) analisar e entender as estratégias da empresa, conhecer as operações e seus processos-chave; (ii) evidenciar quais são os fatores críticos de sucesso para que os objetivos da empresa sejam cumpridos; e para (iii) aumentar o entendimento sobre contexto cultural e algumas características das pessoas que trabalham na organização, a divisão atual de responsabilidades da estrutura administrativa, os instrumentos de planejamento existentes e as ferramentas cibernéticas da estrutura de controle que ajudariam na obtenção das informações importantes para a alimentação do modelo.

Em termos particulares, o SCG existente ajudou a reduzir conflitos de poder da alta administração e resistência a mudanças por parte das pessoas, mas não proporcionou contribuições para mitigar, mesmo que de forma parcial, os riscos operacionais e de negócios em virtude da falta de uma liderança estratégica. Já quanto à aprendizagem, o uso interativo do SCG se mostrou como um importante mecanismo para proporcionar a aprendizagem estratégica dentro da organização.

Tomados em conjunto, os resultados do estudo proporcionaram um diagnóstico do SCG atualmente utilizado na empresa à luz do referencial teórico, permitindo a identificação de pontos que podem ser utilizados na melhoria do modelo em uso. Adicionalmente foi proposto um quadro de indicadores para buscar a promover a IE e a AD estratégica e operacional – que ainda se revelaram incipientes na empresa e carecem de ser aperfeiçoados. Tendo em consideração que a empresa validou os resultados encontrados e se propôs a implementar o novo desenho de SCG proposto pautado nos apontamentos feitos na pesquisa, registra-se essa como uma significativa implicação gerencial – que pode servir de processo de benchmarking competitivo para outras empresas similares, especialmente se levarmos em consideração que o objeto de análise consistiu na segunda maior empresa de calçados de segurança da América Latina. Isso tanto revela tanto o impacto do estudo, pois, de fato, ainda há empresas de grande porte com problemas na IE (como identificado na literatura prévia), quanto revela a necessidade de mais estudos em contextos ou empresas similares – sendo esta uma recomendação para estudos futuros.

Em síntese pode-se concluir que, embora na empresa estudada o SCG ainda não tenha promovido a IE e a AD, (i) esse sistema se revelou um importante mecanismo facilitador da IE e que o adequado desenho e uso do SCG (ii) facilita a comunicação organizacional, (iii) aumenta a congruência entre os setores, (iv) possibilita o aprendizado pelo uso interativo e (v) se mostra um mecanismo eficaz no fornecimento de elementos para estruturação do modelo de AD estratégico e operacional; sendo observado também que (vi) tal mecanismo promove o processo de accountability e estimula a congruência de objetivos entre as pessoas e as organizações, especialmente as empresariais.

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1.  Professor do Programa de Pós-graduação em Administração da Fundação Pedro Leopoldo. (jordaocopnsultor@yahoo.com.br)
2. Mestre em Administração pela Fundação Pedro Leopoldo.

3. Professor do Programa de Pós-graduação em Administração da Fundação Pedro Leopoldo


Vol. 37 (Nº 04) Año 2016

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