ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 34) Año 2017. Pág. 19

A relação das sociedades rurais com o rádio na contemporaneidade

The relationship between rural communities and the radio in the contemporary age

Kátia de Lourdes FRAGA 1; Ana Louise de Carvalho FIÚZA 2; Jonathan Fagundes da SILVA 3; Janayna Avelar MOTTA 4

Recibido: 17/02/2017 • Aprobado: 23/03/2017


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados e discussão

4. Considerações finais

Referências bibliográficas


RESUMO:

Analisou-se neste artigo os usos e apropriações dos meios de comunicação pela Sociedade Rural, que sofreu grandes transformações sociais, culturais e econômicas nas últimas décadas, incluindo os avanços das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). O intuito foi identificar a “dieta de mídia”, ou seja, as escolhas dos rurais pelas mídias mais pertinentes para suas necessidades de informação e de entretenimento nos dias atuais. Buscou-se averiguar, em especial, o lugar ocupado pelo rádio na vida desta população, em meio ao processo de urbanização na contemporaneidade. Adotou-se como metodologia a coleta transversal de dados através da aplicação de questionários na Semana do Fazendeiro (SEMFAZ), realizada anualmente pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), localizada na zona da mata, em Minas Gerais, no Brasil. Todo ano, agricultores da região e de várias partes de todo o país, frequentam a UFV durante a Semana do Fazendeiro, considerado pelos organizadores o maior e mais tradicional evento de extensão realizado no país há quase 90 anos. Entrevistou-se 201 moradores da zona rural da Zona da Mata mineira, de sexo, idade e local de moradia, diferentes e oriundas de 64 dos 142 municípios que compõem a mesorregião da Zona da Mata mineira, os quais viviam em 130 comunidades rurais diferentes. O questionário semiestruturado utilizado na pesquisa quantitativa contemplou 20 questões relativas aos usos e apropriações cotidianas de mídias. Como resultado identificou-se que o rádio continua fazendo parte do cotidiano dos rurais, apontado em segundo lugar na preferência dos mesmos, perdendo espaço para a televisão, mídia que conquistou o primeiro lugar entre os respondentes.
Palavras-chave: Rural, Modos de vida, Rádio, Dieta de mídia, Tecnologia da Informação e Comunicação.

ABSTRACT:

In this article it was analyzed the use and appropriation of media channels by the Rural Community, which has been through social, cultural and economic transformation in the last decades, including the advancement of Information and Communication Technologies (ICT). The aim was to identify the “media diets”, i.e. the choices made by the rural folk in favor of media outlets that are more relevant to their information and entertainment needs nowadays. There was a special effort to find out what is the radio’s place in these people’s lives given the urbanization process in the contemporary age. The methodology adopted was transversal data collection through the application of questionnaires during the Semana do Fazendeiro (SEMFAZ) – Farmer’s Week, which happens annually at the Federal University of Viçosa (UFV) in the southeast of Minas Gerais, an area known as Zona da Mata. Every year, farmers from that and other areas of Brazil attend the event, which is considered by its managers the biggest and most traditional extension event to take place in the country for almost 90 years. 201 inhabitants of the rural areas of Zona da Mata were interviewed - of diverse gender, age and coming from 64 of the 142 towns that constitute the mesoregion of Zona da Mata, who lived across 130 different rural communities. The semi-structured questionnaire used on the quantitative research covered 20 questions related to the use and appropriation of everyday media outlets. As a result, it was identified that the radio remains part of the daily routine of the rural folk, featuring second place in their preference, losing space only to the television, the media outlet that took first place among the interviewees.
Keywords: Rural, ways of living, radio, media diets, Information and Communication Technology.

1. Introdução

As sociedades rurais vêm passando, na atualidade, por mudanças significativas. O uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) evidencia uma dimensão deste processo de transformação. Os modos de vida das pessoas que vivem no campo passam a estar, cada vez mais, imbricados com as conexões proporcionadas pela “sociedade em rede” (CASTELLS, 2003), que permite a cada indivíduo ter autonomia para escolher a “dieta de mídia” (CARDOSO, 2007) mais pertinente às suas necessidades de se informar e se entreter. Neste artigo, buscamos analisar o espaço ainda hoje ocupado pelas mídias tradicionais como o rádio, na vida das pessoas que vivem no campo, bem como o uso e o significado atribuído às novas mídias. Esta é uma questão que pode possibilitar o avanço na compreensão da forma como as sociedades locais se comportam mediante as influências globais. O uso das mídias pelas pessoas que vivem no campo refletiria um processo de aculturação das mesmas ou mesmo mediante os processos de aproximação entre o campo e a cidade haveria a possibilidade de manutenção das identidades locais?

Segundo Barbero (2003), as características regionais dimensionam o funcionamento de emissoras, ao darem foco às necessidades locais e aos apelos à participação coletiva em ações de apoio às demandas populares. Tal concepção fortalece a premissa da possibilidade das populações locais manterem uma autonomia relativa em relação a sua identidade, mesmo mediante o processo de estreitamento comunicacional característico da aldeia global. A comunicação torna-se, assim, uma questão cultural não só de conhecimento, mas de “re-conhecimento”. As estratégias de produção e as táticas de recepção mediadas pelos movimentos de sociabilidade, em suas mudanças na trama das relações cotidianas, resultariam, desta forma, em modos e usos dos meios de comunicação localmente legitimados. Assim, a cultura local é a base que alicerça o universo de composição identitária do indivíduo, atuando como mediadora em face das influências midiáticas. (CERTEAU, 1994)

Ao analisar as exigências e as necessidades manifestadas pelos moradores de aldeias rurais e vilas, de Portugal, Melro (2013) destacou a “apropriação cultural” dos meios de comunicação por jovens, adultos e idosos. A autora situou a trajetória das novas tecnologias de comunicação desde a década de 1960, com a chegada da televisão nas casas portuguesas, passando pelo computador, nas década de 1980 e 90; e, mais recentemente, nos anos 2000, pela introdução do celular no cotidiano da população. A autora analisou as necessidades manifestadas pelas pessoas em relação aos contextos nos quais encontravam-se habitualmente inseridas, tais como a família, a escola e os ambientes de lazer. Constatou, a autora, que os meios digitais tinham presença diária e transversal em todos os contextos e gerações. Os avós, os pais e os filhos utilizavam com frequência as novas tecnologias. Também em Portugal, Fiúza, Schouten e Pinto (2016), ao estudarem as aldeias minhotas do norte de Portugal perceberam que a vinculação das mesmas à sociedade do consumo e da informação manifestou um processo de desvalorização da importância atribuída ao rádio pelos aldeões. Tal fato reforça a perspectiva de que o uso e o significado atribuído aos meios de comunicação se constituem em um bom indicador das transformações dos modos de vidas nas sociedades locais.

Na década de 1960 Rambaud chamou a atenção para o fato de que as transformações dos modos de vida dos rurais se estabeleciam mediante um complexo processo de expansão da Cultura Urbana, dentro do qual a mídia se fazia presente. Silveira, Coutinho e Fiúza (2013) recuperam este estudo de Rambaud (1969), no qual o autor destacava que as transformações pelas quais a sociedade rural francesa passou, nos anos pós-Segunda Guerra Mundial, apontavam para um processo de expansionismo da “cultura urbana” sobre a sociedade rural. Para evidenciar este processo de expansão da cultura urbana o autor estudou as representações coletivas que os rurais faziam deles mesmos e da cidade, bem como as transformações na esfera do trabalho, a influência da escola, da imprensa e do turismo como mediadores deste processo de aculturação.

No que se refere à comunicação, Rambaud afirmou que este processo de aculturação seletiva, gradual e diferenciado, podia ser percebido, nitidamente, através do jornal impresso lido pelos moradores do campo. O jornal impresso mostrava-se voltado diretamente para o cotidiano da cidade, difundindo informações e cultura tipicamente citadinas, longe das tradições do campo. As notícias e fatos se remetiam ao cotidiano urbano: obituário, casamento, esporte, eventos, etc. A imagem da cidade, elaborada pelo jornal, constituía-se por meio de um mosaico formado por características associadas ao consumo e ao lazer. O morador do campo assume a condição de consumidor da cultura citadina. Mediante esse processo de mudança cultural, busca-se analisar nesta pesquisa o processo de introdução das TIC’s nas sociedades rurais e a forma como os meios de comunicação tradicionais, como o rádio, se acomodam ao longo deste processo de expansão da Cultura Urbana.

2. Metodologia

Com o intuito de analisar os usos dos meios de comunicação nas sociedades rurais utilizamos como procedimento metodológico, a coleta transversal de dados através da aplicação de questionários em um evento voltado, prioritariamente, para as pessoas que vivem no campo: a 86ª Semana do Fazendeiro (SEMFAZ), realizada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), no período de 12 a 18 de julho de 2015. Durante o referido evento, entrevistou-se 201 moradores da zona rural da Zona da Mata mineira. Essa edição da SEMFAZ teve como tema “Campo e cidade: diálogo para um futuro sustentável”. Segundo a Universidade Federal de Viçosa, este é o maior e mais tradicional evento de extensão realizado no país. Todo ano, agricultores da região, mas, também, de todo o país, frequentam a UFV durante a Semana do Fazendeiro [5].

A fim de melhor operacionalizar a aplicação dos questionários, decidiu-se fazer a pesquisa na sessão voltada para as mulheres rurais, para a juventude rural, nas atividades relativas a “dia de campo”, a “troca de saberes”, nas “clínicas tecnológicas”, mas, também, na feira de artesanatos e de comidas. Abordava-se os entrevistados antes do início das atividades oferecidas na semana, bem como nos intervalos para o almoço, para o lanche da tarde e antes das atividades noturnas. Selecionou-se somente as pessoas residentes em localidades rurais que faziam parte da Zona da Mata Mineira. Assim, foram entrevistados 201 pessoas, de sexo, idade e local de moradia, diferentes. Entrevistou-se pessoas oriundas de 64 dos 142 municípios que compõem a mesorregião da Zona da Mata mineira, os quais viviam em 130 comunidades rurais diferentes. Desse total, 82,6 % pessoas residiam em comunidades rurais e outros 17,4 % residiam na sede do município, mas possuíam alguma ligação com o campo. Em relação ao sexo, 48,8% eram homens e 51,2% mulheres.

No questionário semiestruturado utilizado na pesquisa quantitativa foram inseridas 20 questões relativas aos usos e apropriações cotidianas de mídias por parte das pessoas que viviam no campo ou desenvolviam atividades rurais. As questões voltaram-se para a compreensão acerca das preferências que manifestavam e da importância que atribuíam a equipamentos como celular, computador com internet, televisão, rádio e outros. Os questionamentos incluíram hábitos referentes a utilização das mídias, como frequência de dia e tempo de uso, os membros da família que costumam usar cada equipamento, os significados e motivações para o consumo de determinadas mídias, dentre outros aspectos.

3. Resultados e discussão

Na “dieta de mídia” dos entrevistados na pesquisa realizada na Semana do Fazendeiro (Semfaz), na Universidade Federal de Viçosa, o rádio aparece como o segundo veículo mais utilizado, perdendo apenas para a televisão. Algumas pesquisas realizadas no Brasil, como a Pesquisa Brasileira de Mídia (PBM, 2015), e em Portugal já sinalizam indicativos sobre os usos das mídias na sociedade contemporânea. O resultado da pesquisa da Semfaz coincide com a PBM, realizada pela Secretaria de Comunicação do Governo Federal, na qual o rádio também é o segundo veículo de comunicação com maior presença no cotidiano dos brasileiros, sendo a televisão o veículo preferencial no Brasil.

Tabela 1 – Os usos das mídias pelos rurais

Mídia

Sim

Não

Total

Rádio

74,9

25,1

100%

Televisão

93,5

6,5

100%

Jornal Impresso

33,8

66,2

100%

Revista

26,9

73,1

100%

Internet

58,2

41,3

100%

Fonte: uso das mídias entre os entrevistados da SEMFAZ (FRAGA; SILVA, 2015).

No que diz respeito especificamente às áreas rurais da Zona da Mata mineira, na pesquisa realizada durante a Semfaz, constatou-se que o rádio, ocupando o segundo lugar dentre as mídias preferenciais dos entrevistados, é utilizado por 74,9% dos respondentes. Nota-se, que a utilização da internet foi expressiva entre os moradores do campo, enquanto o jornal impresso e a revista apresentaram o menor percentual de utilização, conforme quadro acima. Na PBM (2015), 47% dos entrevistados demonstraram ter o hábito de acessar a Internet. Jornais e revistas corresponderam a 25% e 15%, respectivamente, da preferência do público.

Em Portugal, Cardoso e Santos (2007) analisaram a temática dos públicos dos meios de comunicação tendo como preocupação principal a percepção da forma como os vários dispositivos tecnológicos e comunicacionais ao seu dispor permitem fazer escolhas para satisfazer as necessidades de informação, entretenimento e lazer (CARDOSO; SANTOS, 2007, p. 25-26). Em relação ao Rádio, eles constataram que os hábitos de audição variam de acordo com o perfil do público. Para os mais velhos, o rádio assume a função de companhia, em momentos específicos do dia, como o acordar e o deitar, sem procurarem nenhum programa ou locutor em especial. As emissoras mais antigas e aquelas que mantêm há mais tempo o mesmo formato de programas foram as preferidas pelos ouvintes mais velhos, pela força do hábito (CARDOSO; SANTOS. 2007). Já os mais jovens (15-24 anos) ouviam menos o rádio e buscavam na emissora apenas a música.

Outro perfil de análise, que apresenta os maiores consumos de rádio, compreende dois subgrupos (pelas suas especificidades), sendo o primeiro, o que corresponde a pessoas entre 25 e 34 anos de idade, e o segundo, entre 35 e 54 anos. Nesse caso, a rádio é ouvida para acesso à notícia, ao trânsito, ao tempo, mas também aos debates, à música e a programas específicos. Ela é ouvida em vários contextos, em casa, no trabalho e nos deslocamentos. Nesses dois grupos algumas pessoas afirmam manter o rádio ligado o dia todo. A escolaridade associada à profissão tem uma influência direta nas escolhas. Os entrevistados com profissões intelectuais e científicas são aqueles que fazem uma escolha minuciosa dos programas e das emissoras que ouvem, tendo também desta forma locutores e jornalistas preferidos (CARDOSO; SANTOS, 2007, p. 25-26).

Frequência na escuta de rádio

A respeito da frequência dos que escutavam rádio diariamente em nível de Brasil, a Pesquisa Brasileira de Mídia (2015) revelou que 30% dos brasileiros disseram ouvir rádio todos os dias da semana. No entanto, 44% afirmaram nunca escutar rádio. No que diz respeito à Minas Gerais, a Pesquisa Brasileira de Mídia mostrou um percentual menor de ouvintes diários, que em nível nacional: 27% escutavam rádio todos os dias, enquanto 45% não escutavam dia algum.

Ao analisar especificamente a realidade relativa aos moradores rurais ou residentes nos pequenos municípios da Zona da Mata Mineira, envolvidos com atividades rurais, a pesquisa realizada na Semfaz, constatou que o uso diário do rádio entre eles, era de 46%, sendo, portanto, maior que o encontrado pela Pesquisa Brasileira de Mídia, em nível de Brasil e de Minas Gerais. Entretanto, o uso do rádio em relação a este público de agricultores integrais ou parciais, mostrou-se suplantado pelo celular, com 73,6% de usuários diários e pela televisão com 66,7%. A referida pesquisa revelou, assim, o gosto dos agricultores entrevistados por equipamentos eletrônicos em detrimento do menor interesse dos mesmos pelas práticas de leitura, já que 50,2% dos participantes afirmaram nunca ler jornal e 61,2% afirmaram não se interessar por revista. 

Tabela 2: frequência de uso das mídias

Frequência

Televisão

Rádio

Jornal

Revista

Celular

Computador

Todos os dias

66,7%

46,0%

5,5%

3,5%

73,6%

37,3%

Várias vezes por semana

17,4%

11,5%

5,0%

6,0%

14,4%

10,9%

Uma vez por semana, num dia de semana

5,0%

12,5%

18,4%

10,9%

1,5%

5,0%

Só ao final de semana

6,0%

7,0%

5,5%

2,5%

2,0%

1,5%

Uma vez por mês

1,5%

7,0%

13,9%

13,9%

1,0%

1,0%

Nunca

2,5%

15,0%

50,2%

61,2%

5,0%

40,3%

Não sabe

0%

0,5%

0,5%

0%

0,5%

0%

Não respondeu

1,0%

0,5%

1,0%

2,0%

2,0%

4,0%

Total

100%

100%

100%

100%

100%

100%

Fonte: frequência com que os entrevistados realizam atividades ligadas a mídia (FRAGA; SILVA, 2015).

Celular é o aparelho mais usado

Quando questionados sobre os equipamentos que mais utilizam, o celular saiu na frente com 46,6% das indicações dos entrevistados da Semfaz. E quando a pergunta foi relacionada ao equipamento que mais deseja ter, o computador ficou em primeiro lugar por 19,4% dos entrevistados. Em outra pesquisa realizada em Portugal, Melro (2013) avaliou que a frequência de utilização das novas mídias varia de geração para geração e o fato de residir na área rural também influencia. A televisão tem a preferência de pais e avós por representar entretenimento e sentimento de familiaridade que transmite, enquanto o computador e o celular são os equipamentos preferidos pelos filhos pelas mesmas razões. Todavia, quase todos os indivíduos entrevistados fazem uso dessas formas de comunicação.   

O celular é mencionado como um dispositivo “multifacetado”, ou seja, proporciona muitas utilidades. Como o “contato com familiares distantes, esbater o sentimento de solidão, gerir o quotidiano, saber notícias de modo mais rápido, dar recados” (Melro, 2013, p.381-382).  Por isso, está presente nos contextos da família, do lazer e do trabalho ou da escola. O celular, segundo o resultado da pesquisa da autora, oferece comodismo por facilitar contatos virtuais, evitando deslocamentos para encontros presenciais, transpondo fronteiras. No caso particular do universo no meio rural, existem reveses em relação ao acesso à Internet rápida, o que limita a utilização das novas TIC. Isso significa que no meio urbano existem mais facilidades de utilização dos aparatos tecnológicos.

Horário de escuta do rádio

Entre aqueles que escutam rádio, a PBM identificou que o período da manhã, em especial das 6h às 9h, é o preferido entre os ouvintes. As pessoas, durante a semana, se expõem ao rádio, em média 3h42 por dia, e no final de semana 2h33. Em Minas, de segunda a sexta-feira são 3h48 por dia, e no sábado e domingo são 2h29. O tempo de duração média, em que homens e mulheres gastam ouvindo rádio durante a semana é próximo, eles 3h45 e elas 3h38. Já aos finais de semana eles ouvem 2h34 e elas 2h33, em âmbito nacional. Na Zona da Mata mineira, a preferência pelo horário da manhã também é maior que nos outros períodos do dia, conforme a pesquisa da Semfaz. Isso pode ser explicado pelo fato de nesta parte do dia ser comum ter programas direcionados ao público rural, que tem como uma das características tradicionais realizar as rotinas de casa, a lida na roça, e outras atividades no período matutino.

Tabela 3: Horário em que o rádio é utilizado

Horário

%

Manhã

56,6

Tarde

22,5

Noite

11,6

Todos os horários

9,2

Não sabe

0,0

Não respondeu

0,0

Total

100

Fonte: horário de preferência dos entrevistados para escutar rádio (FRAGA; SILVA, 2015).

Preferência por aparelhos

O aparelho usado para ouvir rádio, em âmbito nacional é o suporte convencional para 80% das fontes (pbm, 2015). Os mineiros não foram diferentes nesta escolha, 79% preferem o tradicional. Para 74% dos brasileiros as emissoras FMs são as preferidas, enquanto 14% preferem as AMs.  Já os mineiros 69% preferem as FMs e 17% as AMs.

O rádio a energia elétrica (ligado na tomada) continua sendo o preferido (61,2%) dos entrevistados na pesquisa da SEMFAZ, seguido da escuta no transporte (13,4%).

Tabela 4: aparelho utilizado pelos rurais para ouvirem rádio

Suporte

%

Rádio a pilha

7,0

Rádio a energia

61,2

Rádio no carro

13,4

Rádio no celular

6,0

Rádio na TV

2,0

Rádio no computador

0,5

Não sabe

0,0

Não respondeu

10,0

Total

100

Fonte: suporte tecnológico escolhido para ouvir rádio (FRAGA; SILVA, 2015).

Na pesquisa da Semfaz, foi possível detectar, também, que o uso do aparelho se dá em 35,5% pelo próprio entrevistado, 26,2% em uso coletivo na casa, 12,8% pela mãe e 7% pelo pai. Sobre a quantidade de aparelhos, 75,3% possuem apenas um, 19,5% dois e em um caso o entrevistado disse possuir 20 aparelhos. É importante ressaltar, porém, que com os avanços tecnológicos, a escuta da mídia radiofônica também ocorre por meio de celular e computador quando perguntamos sobre a utilização do aparelho para este fim.

Tabela 5 – o uso do aparelho radiofônico na residência

Uso do aparelho radiofônico

Possui

Números de aparelhos em casa

Quem mais utiliza

Grau de dificuldade

Sim – 87,1%

1

75,3%

Entrevistado

35,5%

Muito fácil - 44,8%

Não – 12,9%

 

 

 

                   

2

19,5%

Cônjuge

10,5%

Fácil - 52,9%

3

3,4%

Filhos

1,2%

Com alguma dificuldade - 1,7%

4

0,0%

Empregada/o

0,0%

Muito difícil - 0,6%

5

0,0%

Cada um o seu

0,0%

NR - 0,0%

6

0,6%

Todos

26,2%

 
 

7

0,6%

Mãe

12,8%

8

0,0%

Pai

7,0%

20

0,6%

Avó

0,0%

NR

0,0%

Avô

1,2%

 

Outros

2,9%

Ninguém

1,2%

NS

1,7%

NR

0,0%

Considere: NR = Não respondeu e NS = Não sabe. Fonte: uso do aparelho rádio em casa (FRAGA; SILVA, 2015). 

Mas a preferência continua sendo pelo hábito de ouvir rádio no aparelho a energia (61,2%), seguido da utilização no transporte (13,4%). Foi possível notar, ainda, entre os moradores da Zona da Mata mineira que o número de pessoas que gostam de rádio (85,1%) é superior aos do que realmente o utilizam (74,9%). Apenas 17,9% dos entrevistados disseram não gostar de rádio e 25,1% afirmaram não usar este veículo de comunicação. 

Vínculo com o rural

Observa-se, portanto, que em comunidades rurais da Zona da Mata mineira, conforme os entrevistados, o rádio continua fazendo parte do cotidiano dessa população, principalmente pelos vínculos estabelecidos entre essas pessoas e este meio de comunicação tradicional. Outras pesquisas também apontam tal vinculação. Para Bianchi (2003) o relacionamento entre mídia e recepção leva em consideração diferenciados usos, temporalidades, cenários, mediações não apenas pela opção de sintonizar um programa em detrimento do outro, mas também a preferência pelo rádio como instrumento de marca de vivências, histórias nas quais o rádio esteve presente e, por isso, permanece no cotidiano rural.

 Em seu estudo, Bianchi (2003) analisou de que maneira ocorre a construção de sentido entre o rural vivido e o rural midiatizado no relacionamento entre a mídia radiofônica e os ouvintes, levando em consideração as etapas de produção, produto veiculado e recepção. Foram analisados dois programas de duas emissoras distintas, localizadas no município de Erechim, na região norte do Rio Grande do Sul: Hora do Chimarrão, transmitido pela rádio Erechim AM e Brasil de Norte a Sul, da rádio Difusora AM. A recepção foi pesquisada em três comunidades: Linha Bigolin, Povoado Coan e Linha Batistela, todas localizadas próximas ao município de Erechim e caracterizadas pelo perfil econômico de pequenas propriedades rurais. Para além dos produtos e das falas, Bianchi buscou entender como as diferentes lógicas de todas as partes envolvidas no processo comunicacional, com suas dinâmicas e especificidades, configuram sentidos.

Em todos os aspectos de abordagem, a autora considera os processos midiáticos e os processos socioculturais para verificar apropriações, conflitos, dissonâncias e concordâncias entre o que é vivido no cotidiano do campo e a imagem sensorial do rural nas irradiações radiofônicas, No que ser refere a produção e ao produto, observou-se nessa pesquisa e em outros estudos realizados sobre programas radiofônicos, que o conteúdo é estrategicamente planejado para conquistar. Segundo a autora, todas as partes investigadas se relacionam em suas dinâmicas, modos, contextos, no processo comunicacional, lugar de configuração de sentidos.

No caso em questão, a produção prepara programas que tenham vinculação com matrizes culturais do rural, desde músicas sertanejas, temas de interesse dos moradores do campo, comentários e comerciais voltados para o cotidiano rural, o interior. No viés do consumo de mídia, o público tem autonomia para escolher que mídia escutar e qual programa é pertinente aos seus interesses.

 Fraga e Fiuza (2016) apresentam um mapeamento de uma série de pesquisas demonstrativas sobre o fato de programas de rádio voltados para a população rural conquistarem audiência por manterem o vínculo com o cotidiano desse público, cultivando laços identitários e até mesmo garantindo a representação dos rurais nas ondas radiofônicas.

4. Considerações finais

O presente artigo realizou um mapeamento do consumo midiático com moradores do campo em regiões da Zona da Mata mineira, durante a realização de um evento realizado na Universidade Federal de Viçosa em 2015: a Semana do Fazendeiro. As modificações nos “modos de vida” no campo vêm sendo relatadas em vários artigos publicados em revistas nacionais e internacionais. Na presente pesquisa buscou-se analisar de que forma tais transformações nos modos de vidas do rurais poderia ser percebida, também, através da sua “dieta midiática”. Especificamente, pretendeu-se analisar o lugar ocupado pelo rádio na vida dos rurais, mediante o processo de aproximação da cidade que os habitantes do campo vêm experimentando. O rádio se manteve presente na vida dos rurais, no Brasil, desde as primeiras décadas do Século XX, em um período muito anterior a modernização do campo. Mas como o processo de aproximação da cidade e o contato com as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) estaria afetando a tradicional relação dos rurais com o rádio? Estudos internacionais vêm mostrando que o rádio tem entrado em desuso entre os agricultores e demais habitantes das pequenas aldeias e vilas da Europa. Mas como este vínculo tradicional dos rurais com o rádio estaria se configurando em uma sociedade de economia periférica como a brasileira? Esta foi a questão de investigação que conduziu a pesquisa que ora se apresenta os resultados.

Na pesquisa realizada na Semana do Fazendeiro na Universidade Federal de Viçosa, a televisão despontou na dianteira na “dieta de mídia” dos rurais, tal como acontece entre os habitantes das cidades, conforme demonstrado por outras pesquisas realizadas no Brasil. Tal como acontece entre os habitantes citadinos também se constatou entre os rurais a tendência de crescimento no uso da internet. O rádio já não é um desejo de consumo, perdendo para celulares, computadores, tablet’s e similares, apesar de sua posse ser maciça, principalmente quando se considera o aparelho ligado na energia elétrica. Percebeu-se, portanto, que a “dieta de mídia” dos rurais acompanhou a tendência dos citadinos, tendo a comunicação tecnológica ganhado espaço também entre eles. Assim, o presente estudo reforçou a tese dos estudos que apontam que os modos de vida no campo estão em consonância com as transformações pelas quais passam o mundo contemporâneo como um todo.

Referências bibliográficas

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GALVÃO JÚNIOR, Lourival da Cruz. Considerações sobre o rádio brasileiro: um flagrante temporal. Artigo apresentado no XXXVIII Congresso de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, 2015.

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RAMBAUD, Placide. Société Rurale et Urbanisation. 1ª ed. Paris: Ed. du Seuil, 1969.

___________. Sociedade rural e urbanização. Paris: Edições de Seuil, 1973, 2ª edição.

SILVEIRA, Lidiane Nunes; COUTINHO, Elenice; FIÚZA, Ana Louise C. A A atualidade da obra Société Rurale et Urbanisation de Placide Rambaud para a compreensão das transformações do campo brasileiro. Estudos Sociedade e Agricultura (UFRRJ). Rio de janeiro, vol. 21, n.1, 2013: 160-179.


1. Possui graduação em Jornalismo pela Universidade Federal do Espírito Santo (1989); especialização em Gestão em Assessoria de Comunicação pela FAESA (Faculdades Integradas Espirito-santenses), em 2002; mestrado em Comunicação, Imagem e Informação pela Universidade Federal Fluminense, UFF, Niterói (2005). Desde 2006 é professora de Jornalismo na Universidade Federal de Viçosa (UFV/MG), tendo ocupado o cargo de Coordenadora de Comunicação Social da mesma instituição (2008-2015). Atualmente é doutoranda no Programa de Pós-graduação em Extensão Rural da UFV/MG e integrante do grupo de pesquisa GERAR (Grupo de Estudos Rurais: Agriculturas e Ruralidades) vinculado ao mesmo programa e coordenado pela professora Ana Louise de Carvalho Fiúza. Email: katiafraga@ufv.br

2. Possui graduação em Ciências Sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora (1992), especialização em Ciências da Religião, também, na Universidade Federal de Juiz de Fora (1993); mestrado em Extensão Rural pela Universidade Federal de Viçosa (1997); doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (2001); pós-Doutorado no Centro de Investigações em Ciências Sociais da Universidade do Minho, em Portugal (2013). Atualmente é professora do Departamento de Economia Rural da UFV e também do Programa de Pós-graduação em Extensão Rural na mesma instituição. É Coordenadora do GERAR: Grupo de Estudos Rurais: Agriculturas e Ruralidades.

3. Possui graduação em Jornalismo na Universidade Federal de Viçosa (UFV); e atualmente é maestrando no Programa de Pós-graduação de Extensão Rural da UFV

4. Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Viçosa (UFV): e atualmente é mestrado no Programa de Pós-graduação de Extensão Rural da UFV e integrante do grupo de pesquisa GERAR (Grupo de Estudos Rurais: Agriculturas e Ruralidades).

5. Informações do site do evento http://www.semanadofazendeiro.ufv.br/ acesso em setembro de 2015.


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 34) Año 2017

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