ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 12) Año 2017. Pág. 19

Fatores associados à insegurança alimentar em populações pobres do município de Diamantina-MG

Factors associated with food insecurity in poor populations in the city of Diamantina-MG

Karla Karolina Duarte SANTOS 1; Sabrina Maria Pimenta MANDACARU 2; Roseane Amado da MATTA 3; Nadja Maria Gomes MURTA 4; Ronilson Ferreira FREITAS 5; Angelina do Carmo LESSA 6

Recibido: 18/09/16 • Aprobado: 21/10/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados e discussão

4. Conclusão

Referências


RESUMO:

O presente estudo teve por objetivo avaliar os fatores associados à insegurança alimentar em populações pobres residentes no município de Diamantina, Minas Gerais. Foram pesquisadas 395 famílias residentes na periferia e distritos do município, sendo utilizados a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar, questionário socioeconômico e demográfico. Foram realizadas análises bivariada e multivariada através de regressão logística. Entre a população estudada, 6,84% encontrava-se em Segurança Alimentar, 57,97% em Insegurança Alimentar Leve, 29,62% em Insegurança Alimentar Moderada e 5,57% em Insegurança Alimentar Grave. Observou-se que entre as famílias pesquisadas os fatores associados à Insegurança Alimentar Moderada e Grave foram: pertencer ao Programa Bolsa Família (OR=2,22; IC=1,41-3,52), ter número de filhos superior a quatro (OR=2,34; IC=1,36-4,03) e renda familiar inferior a um salário mínimo (OR=1,8; IC=1,15-2,81). Pode–se concluir que a Insegurança Alimentar esteve associada à vulnerabilidade social, sendo necessárias ações estruturais para reverter tal quadro.
Palavras-chave: Políticas Públicas, Direito Humano à Alimentação, Transferência de Renda, Escala Brasileira de Segurança Alimentar.

ABSTRACT:

This study had the objective to evaluate the associated factors to insecurity food in poor populations resident in Diamantina, Minas Gerais. Were researched 395 families on the city’s periphery and its districts, using the Brazilian Insecurity Food Scale, social-economic and demographic questionnaires. Were done Bivaried and multivaried analyses through logistic regression. In the studied population, 6.84% were in Insecurity food, 57.97% in Light Insecurity food, 29.62% in Moderated Insecurity food and 5.57% in Serious Insecurity food. The associated factors observed to Moderated and Serious Insecurity food on the researched families were: belong to Bolsa Família program (OR=2.22; IC=1.41-3.52), have at least five children (OR=2.34; IC=1.36-4.03) and have family income under 465 R$ (minimum wage) (OR=1.8; IC=1.15-2.81). It is possible to conclude that Insecurity food was associated to social vulnerability, becoming necessary structure actions to change this situation.
Keywords: Public Policies, the Human Right to Food, Cash Transfer, Brazilian Scale Food Security.

1. Introdução

A alimentação adequada é um direito fundamental do ser humano. No Brasil, este é indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal. Assim sendo, o país deve adotar políticas públicas que garantam a segurança alimentar e nutricional da população, levando em consideração fatores socioeconômicos, culturais e ambientais. O Governo deve, ainda, criar mecanismos de fiscalização e monitoramento para garantir a implementação adequada das políticas estabelecidas (Carvalho, Rocha, 2011; Custódio et al., 2011; CONSEA, 2004; Belik, 2003).

No Brasil, as primeiras políticas públicas surgiram no início do século XX, ao mesmo tempo em que a sociedade civil começava a organizar movimentos com este propósito (Belik, 2003).

Neste contexto, em 1993, surge o movimento social Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida, articulado por Hebert de Souza, o Betinho, tendo como meta a diminuição do número assustador de 32 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza. Este foi um dos primeiros movimentos de expressão de combate à fome no país.

As forças civis e governamentais se fundem no governo de Itamar Franco (1992 – 1994) com a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), órgão de consultoria e assessoria para a elaboração de diretrizes que contribuam para o alcance do direito à alimentação. Tais políticas sofreram uma estagnação com o Plano Real criado no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, voltando a ganhar força, somente no segundo mandato, com a criação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) (Zimmermann, 2006; CONSEA, 2004).

Entretanto, as ações de maior repercussão neste âmbito surgiram com o governo de Luís Inácio Lula da Silva, que iniciou o seu mandato com a implementação do Programa Bolsa Família, criado pelo governo federal em outubro de 2003, através da unificação de quatro benefícios anteriores (Bolsa Escola, Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação). A Bolsa Família tornou-se um dos principais programas de combate à fome no Brasil, pois para muitas famílias pobres, os benefícios desse Programa são a única possibilidade de obtenção de uma renda (Pires, Jardim, 2014; Zimmermann, 2006).  

Tais políticas levam em consideração o conceito de Segurança Alimentar e Nutricional que:

 “Consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis” (CONSEA, 2004).

Ao contrário, a (in)segurança alimentar pode ser detectada por diversas manifestações, desde fome, desnutrição e carências específicas como também pelo excesso de peso e doenças decorrentes da alimentação inadequada (Morais et al., 2014).

 A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) é um método utilizado para avaliar a situação de Segurança Alimentar e Nutricional em estudos populacionais.  Tal escala leva em consideração a situação atual e prévia de privação alimentar vividas pelas famílias classificando-as em: situação de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) quando a disponibilidade de alimentos é frequente e não há preocupação com a falta destes no futuro; Insegurança Alimentar que pode ser subdivida em três níveis: Insegurança Alimentar Leve (IAL) que é caracterizada pela presença do medo da falta de alimentos, Insegurança Alimentar Moderada (IAM) quando ocorre um déficit na qualidade em busca da quantidade dos alimentos consumidos e Insegurança Alimentar Grave (IAG) quando há diminuição da quantidade e/ou ausência de alimentos que satisfaçam às necessidades da família (Segall-Correa et al., 2004). Medir a insegurança alimentar domiciliar é um desafio em função da complexidade e do extenso número de fatores associados a este fenômeno. Assim sendo, nenhum indicador, isoladamente, consegue abranger as múltiplas dimensões da (in) segurança alimentar e nutricional (Morais et al., 2014).

Em pesquisa realizada pelo IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, PNAD), em 2004, 23 milhões dos domicílios (65,2%), entre os 52 milhões entrevistados, encontravam-se em insegurança alimentar nos seus variados níveis (IBGE, 2006). No estudo realizado pelo IBASE, que avaliou as repercussões do Programa Bolsa Família quanto ao estado de SAN em 5.000 domicílios distribuídos no país, verificou-se que, do total de beneficiados, 83,1% conviviam com algum tipo de IA, havendo diferenças significativas entre as regiões (IBASE, 2008). 

Em estudo realizado entre famílias residentes em 14 municípios da Paraíba, foi possível observar que 52,5% das famílias estavam em situação de (in) segurança alimentar (Vianna, Segall-Corrêa, 2008). Em uma comunidade localizada no Alto Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, foi observado que 46,4% das famílias pesquisadas estavam em situação de IA (Nobre et al., 2009). Em 2010, um estudo realizado no Sul do Brasil, foi possível observar que a prevalência de insegurança alimentar familiar foi de 11% (IC95%: 9,3-12,6), sendo que 3% foram classificados em insegurança alimentar com fome (Santos, Gigante, Domingues, 2010).  

O Brasil, por possuir uma vasta área territorial, é um país de contraste. O modo de apropriação do espaço ao longo da história, associado às variações climáticas, foi o fator responsável pela desigualdade existente. Por este motivo, o estudo da relação entre insegurança alimentar, perfil socioeconômico e fatores associados é de suma importância para a caracterização das condições de vida das populações dos diferentes sub-espaços, o que é fundamental para tomada de decisões em relação às políticas públicas loco-regionais (Fraga et al., 2007; Pereira et al., 2006).

Conforme o que foi exposto, o presente estudo teve por objetivo avaliar os fatores associados à insegurança alimentar em populações pobres residentes no município de Diamantina, Minas Gerais.

2. Metodologia

 A presente pesquisa foi realizada em parceria com a coordenação do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional da Secretaria Municipal de Saúde e Promoção Social da cidade de Diamantina e caracterizou-se por ser um estudo transversal descritivo no qual a coleta dos dados ocorreu durante visitas realizadas às residências de cada família, beneficiada ou não pelo Programa Bolsa Família (PBF) desenvolvido pelo Governo Federal, durante os meses de julho de 2008 a janeiro de 2009. 

 A amostra foi composta de 395 famílias distribuídas entre três bairros da sede urbana do município (233 famílias) e três distritos (162 famílias) do município de Diamantina. Os locais foram escolhidos, intencionalmente, levando-se em consideração as baixas condições socioeconômicas da população. As famílias participantes foram selecionadas através de sorteio e escolhidas somente aquelas com, pelo menos, um integrante com idade menor ou igual a sete anos de idade.

Para as entrevistas foram utilizados os questionários sociodemográfico e econômico com as seguintes variáveis: cor alto referenciada, renda familiar, água canalizada no domicilio, luz elétrica, esgotamento sanitário, beneficiário ou não do Bolsa Família, sexo do respondente, número de pessoas no domicílio, escolaridade paterna e materna e número de filhos. A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar – EBIA foi utilizada para medir a situação de segurança alimentar das famílias. As entrevistas foram feitas na presença de um Agente de Saúde para maior aceitação por parte dos entrevistados. A EBIA é composta por 15 questões fechadas contendo respostas do tipo sim ou não, referente aos últimos doze meses, reproduzindo a preocupação de a comida acabar antes de se ter condições de adquirir mais até sua completa falta.  Na totalidade das perguntas sete são direcionadas apenas à famílias onde há moradores menores de 18 anos. Cada resposta afirmativa corresponde a um ponto, a soma obtida representa a pontuação da escala cuja amplitude varia de 0 a 15 pontos. Os resultados obtidos são assim categorizados: SA nenhuma resposta positiva; IAL: 1-5 pontos em famílias com menores de 18 anos ou 1-3 pontos nas sem menores; IAM: 6-10 ou 4-6 pontos; e IAG: 11-15 ou 7-8 pontos (IBGE, 2009; Fraga et al., 2007; Pereira et al., 2006).

Para as analises estatísticas, os seguintes procedimentos foram adotados: inicialmente, foi realizada análise descritiva da população e, posteriormente, realizou-se análise bivariada entre condição de segurança alimentar e diversas variáveis sociodemográficas e econômicas das famílias. Para a análise multivariada, foram utilizados procedimentos de regressão logística estimando a razão de chances da situação de insegurança alimentar moderada/grave segundo variáveis independentes. Iniciou-se com o processo backward contendo todas as variáveis disponíveis no estudo, e a permanência de cada variável no modelo obedeceu ao nível de significância estabelecido de 5%.  Para a construção do banco de dados e análises estatísticas utilizou-se o Software Epiinfo versão 6.04 e Stata 7.0 ®.

O presente estudo faz parte do projeto intitulado “Avaliação do Programa Bolsa Família: Aspectos sócio-econômicos, Qualidade alimentar e Segurança Alimentar e Nutricional dos Beneficiários do Município de Diamantina - MG”, que foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri sob o número de registro permanente 004/08. As pessoas selecionadas foram esclarecidas sobre os objetivos da pesquisa, e só participaram da mesma, aquelas que formalizaram o aceite do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, através da assinatura.

3. Resultados e discussão

Do total das 395 famílias entrevistadas, 199 (50,8%) eram beneficiárias do Programa Bolsa Família. Este resultado se assemelha ao encontrado por Pereira et al., (2006) no qual 53,0% das famílias avaliadas recebiam algum tipo de auxílio ou doação, seja Governamental ou não.

Entre a população estudada, 6,8% encontrava-se em Segurança Alimentar e Nutricional, 57,9% em Insegurança Alimentar Leve, 29,6% em Insegurança Alimentar Moderada e 5,6% em Insegurança Alimentar Grave (Tabela 1).

Os valores encontrados para a insegurança alimentar (93,2%) foram superiores aos observados em estudos realizados em diferentes regiões do Brasil. Em Campinas, a insegurança alimentar atinge 60,5% das famílias (Panigassi et al., (2008), no   Mato Grosso do Sul, foi possível observar uma prevalência de insegurança alimentar em 75,5% das famílias (Fávaro et al., 2007). A prevalência de insegurança alimentar em uma localidade da região metropolitana de Curitiba foi de 81,6% (Monteiro et al., 2014). Em estudo realizado em Itumbiara, Go, a prevalência de insegurança alimentar foi de 51,4% na famílias analisadas (Peixoto et al., 2014). Em Minas Gerais, estudo realizado em uma comunidade rural de Diamantina – Galheiros, a prevalência de insegurança alimentar foi de 46,4% (46,4%) (Nobre at al., 2009). Diante destes dados, é possível perceber que a situação de insegurança alimentar é peculiar a cada sub-espaço, variando até mesmo dentro do próprio município. Motivo pelo qual, estudos abrangentes podem mascarar a verdadeira realidade vivenciada pelas populações de cada localidade.

Tabela 1. Características socioeconômicas e demográficas
da população de estudo. Diamantina, 2008.

Variáveis

N

%

Situação de Segurança Alimentar

Segurança Alimentar

27

6,8%

Insegurança Alimentar Leve

229

57,9%

Insegurança Alimentar Moderada

117

29,6%

Insegurança Alimentar Grave

22

5,6%

Beneficiário do Programa Bolsa Família

Não

196

49,6%

Sim

199

50,8%

Cor alto referenciada

 

 

Branca

47

11,9%

Parda

218

55,2%

Negra

130

32,9%

Renda familiar

 

 

Menor que 1 salário mínimo

142

36,0%

1 a 3 salários mínimos

249

63,2%

3 a 5 salários mínimos

3

0,8%

Água canalizada no domicílio

Sim

348

88,1%

Não

47

11,9%

Luz elétrica

Sim

387

97,9%

Não

8

2,0%

Esgotamento sanitário

Sim

337

85,3%

Não

58

14,7%

Sexo do respondente

Feminino

384

97,2%

Masculino

11

2,8%

Escolaridade materna

Analfabeta ou 1 a 3 anos

106

26,9%

4 ou mais anos

288

73,1%

Escolaridade paterna

 

 

Analfabeto ou 1 a 3 anos

108

27,4%

4 ou mais anos

286

72,6%

Número de pessoas no domicílio

1 a 4 pessoas

185

46,9%

Mais de 4 pessoas

209

53,1%

Observa-se ainda, pela Tabela 1, que a maioria (97,9%) dos domicílios era provida de energia elétrica, água canalizada no domicílio (88,1%) e esgotamento sanitário (85,3%). Contudo, os resultados para: água canalizada e esgotamento sanitário no domicílio foram inferiores quando comparados aos dados encontrados para o Brasil e o Brasil urbano, respectivamente: 92,6% e 95%; 96,1% e 98,9%. Em relação a energia elétrica os dados foram semelhantes aos encontrados para o Brasil e Brasil urbano (98,6% e 99,8%) (IBGE, 2008). Esta comparação nos permite afirmar que o acesso aos serviços básicos, na área estudada, ainda é um problema.

Quanto à renda familiar, 36,0% do total das famílias recebia menos de um salário mínimo, valor este superior aos achados para o Brasil (29,8%) e o Brasil urbano (22,5%) (IBGE, 2008), o que demonstra a precária condição econômica em que vivem as famílias pesquisadas.

Em relação à cor alto referenciada pelos respondentes foi encontrada a seguinte distribuição: 11,9% eram brancos, 55,2% pardos e 32,9% negros; diferindo do encontrado para o Brasil urbano: 50,3%, 41,7% e 7,1% respectivamente [14]. Tais achados podem ser explicados em decorrência da história do município: elevado número de escravos oriundos da colonização mineradora.   

Para a análise bivariada e multivariada, houve novos agrupamentos das variáveis socioeconômicas e demográficas, sendo estas relacionadas à situação de segurança alimentar e nutricional (SAN), insegurança alimentar leve (IAL), insegurança alimentar moderada (IAM) e insegurança alimentar grave (IAG) em um primeiro momento. Entretanto, com esse modelo de cruzamento nas correlações em que houve significância, os intervalos de confiança foram de elevada amplitude, comprometendo assim a precisão dos resultados. Para exemplificar, a razão de chances para famílias com renda inferior a um salário mínimo foi de 7,2 (p=0,009; IC= 1,65 a 31, 39) para IA. Motivo pelo qual, optou-se no segundo momento, para o cruzamento entre SAN + IAL com IAM + IAG e as demais variáveis.

Observou-se (Tabelas 2 e 3) que entre as famílias pesquisadas os fatores associados a IAM e IAG foram: pertencer ao Programa Bolsa Família (OR=2,22; p=0,001; IC=1,41-3,52), ter número de filhos superior a quatro (OR=2,34; p=0,002; IC=1,36-4,03), renda familiar inferior a um salário mínimo (OR=1,8; p=0,009; IC=1,15-2,81), não sendo encontrada associação significativa para as demais variáveis do estudo.

Tabela 2. Associação entre situação de segurança alimentar e
variáveis socioeconômicas e demográficas. Diamantina, 2008.

Variáveis

SAN+IAL

IAM+IAG

Valor de p

Cor alto referenciada

 

 

 

0,88

Branca

30

17

Negra e parda

226

122

Número de filhos

 

 

 

0,00

1 a 4 filhos

223

95

4 ou mais filhos

33

44

Número de pessoas no domicilio

 

0,49

Até 4 pessoas

123

62

Acima de 4 pessoas

132

77

Escolaridade materna

 

 

 

0,00

Analfabeta ou até 3 anos de estudo

57

49

4 ou mais anos de estudo

198

90

Renda familiar

 

 

 

0,00

Até 1 salário mínimo

78

64

Acima de 1 salário mínimo

177

75

Energia elétrica

 

 

 

0,16*

Não

7

1

Sim

249

138

Esgotamento sanitário

 

 

 

0,28

Não

34

24

Sim

222

115

Água tratada

 

 

 

0,14

Não

26

21

Sim

230

118

Beneficiário do programa Bolsa Família

 

 

 

0,00

Sim

106

93

Não

150

46

* teste exato de Fischer

Tabela 3. Modelo final de regressão logística para a insegurança
alimentar Moderada/ Grave, Diamantina, 2008.

Variáveis

OR

Valor de p

IC

Ser beneficiário da Bolsa Família

2,22

0,001

1,41-3,52

Ter mais de 4 filhos

2,34

0,002

1,36-4,03

Renda familiar inferior a 1 salário mínimo

1,8

0,009

1,15-2,81

Em relação à cor, número de pessoas no domicílio, escolaridade materna, presença de energia elétrica, esgotamento sanitário e água encanada no domicílio, nossos achados são discordantes com os encontrados em diferentes estudos (Hoffmann, 2008; IBASE, 2008; Vianna, Segall-Corrêa, 2008; Nobre et al., 2009; Salles-Costa et al., 2009), o que pode ser explicado pelo agrupamento utilizado e número de famílias do presente estudo.

As famílias beneficiadas pelo Bolsa Família tinham 2,22 vezes mais chances de conviverem com a situação de IAM e IAG  que aquelas não beneficiadas. Esses resultados são concordantes com os dados do IBASE (2008) onde entre os beneficiários do BF mais da metade (54,8%) se encontravam nessa situação. Vianna e Segall-Corrêa et al. (2008) e Segall-Corrêa et al., (2008), ao analisarem a estratificação de IA relacionada com o recebimento de algum tipo de auxílio financeiro, verificaram que mais da metade das famílias em IAG estavam incluídas em algum programa oficial de transferência de renda.

Os achados demonstram que as famílias atendidas pelo programa Bolsa Família são aquelas que apresentam uma maior vulnerabilidade social.  Por outro lado, o recurso recebido pode ser a única fonte de renda familiar, fazendo com que seja necessário o uso do mesmo com outros gastos essenciais (IBASE, 2008) cooperando, ainda mais, para a situação de IA. Além disso, o valor máximo repassado está sujeito às oscilações do mercado e é inferior ao preço da cesta básica, que em julho de 2009, na cidade de Belo Horizonte, custava 214 reais e 55 centavos (DIEESE, 2009).

As famílias com mais de quatro filhos apresentaram 2,34 vezes mais chances de estarem em situação de IAM e IAG quando comparadas àquelas com menor número de filhos. Não foram encontrados, na literatura, estudos que correlacionassem o número de filhos com a situação de IAM e IAG, o que impossibilitou a realização de uma análise comparativa.

As famílias com renda inferior a um salário mínimo tinham 1,8 vezes mais chance de conviverem com a situação de IAM e IAG do que aquelas com maior renda. Em estudo realizado por Panigassi et al., (2008) em Campinas, foi constatado que as famílias com renda inferior a dois salários mínimos tinham 12,95 mais chances de estarem em IAM e IAG.  A diferença encontrada entre as razões de chances nos dois estudos pode ser explicada pelos diferentes pontos de corte para a renda.

Tais variáveis retratam a situação de pobreza em que se encontravam as famílias pesquisadas.

4. Conclusão

Pelo exposto, pode-se concluir que mais de um terço das pessoas residentes nos domicílios encontram-se em situação de insegurança alimentar moderada e grave, não tendo acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas ao consumo. E que a insegurança alimentar esteve associada à vulnerabilidade social. Para reversão de tal quadro são necessárias políticas publicas que garantam a estas populações o Direito Humano à Alimentação Adequada.

Referências

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1. Graduada em Nutrição pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM

2. Graduada em Nutrição pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM

3. Graduada em Nutrição pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM. Nutricionista da Secretaria Municipal de Saúde de Diamantina-MG

4. Doutorado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Docente do Curso de Nutrição, do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Sociedade e Ambiente e do Programa de Pós-Graduação em Estudos Rurais da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM.

5. Mestre em Saúde, Sociedade e Ambiente pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM. Docente do Curso de Engenharia de Alimentos das Faculdades Integradas do Norte de Minas – FUNORTE.

6. Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal da Bahia – UFBA. Docente do Curso de Nutrição e do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Sociedade e Ambiente da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM. E-mail: angelinalessa@hotmail.com  


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 12) Año 2017

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