Espacios. Vol. 35 (Nº 2) Año 2014. Pág. 16 |
Mercado mundial e as disputas na Região Metropolitana de Campinas-SP pelo Aeroporto Internacional de ViracoposThe world market and the disputes for the Viracopos International Airport in the Campinas Metropolitan RegionJosmar CAPPA 1, José Henrique SOUZA 2 Recibido: 19/06/13 • Aprobado: 12/01/14 |
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1. IntroduçãoNa primeira parte desse estudo, os referenciais teóricos da Economia Urbana e Regional e do Direito Administrativo foram utilizados para analisar a dinâmica da economia contemporânea e a constituição da Região Metropolitana de Campinas (RMC). O intuito foi de constituir elementos para analisar a inserção do Aeroporto de Viracopos na RMC. Isto porque as grandes empresas atuam em redes de inovação, produção e comercialização de mercadorias no mercado mundial, e optam por municípios inseridos em regiões metropolitanas devido à maior capacidade de oferta de bens, serviços e o conjunto das infraestruturas (energia, água, transporte, entre outras). Na segunda parte, procurou-se analisar as políticas públicas de prefeitos para gerar desenvolvimento aproveitando-se da proximidade com Viracopos. Para tanto, foi feita uma pesquisa empírica nos Planos Diretores dos 19 municípios que integram a RMC e visitas técnicas às respectivas secretarias de planejamento. E para analisar a importância estratégica de Viracopos para as empresas instaladas na Região de Campinas foram analisados dados empíricos de 2006 a 2010 sobre o fluxo de comércio exterior das empresas filiadas ao Centro das Indústrias do Estado de São Paulo Regional Campinas, doravante Ciesp – RC. 2. Economia organizada em redes de inovação, produção e comercialização no mercado mundialA economia contemporânea está organizada em redes de inovação, produção e comercialização de mercadorias entre países no comércio internacional. O conceito de redes utilizado, entre outros, por Porter (1986), Chesnais (1996) e Castells (1999) serve para compreender a dinâmica de funcionamento da economia contemporânea numa dimensão mundial, propiciada, especialmente, pelas telecomunicações e pela informática. Ambas permitem, em tempo real, relações econômicas entre agentes no mercado mundial localizados em distâncias continentais ou nacionais e menos regionais ou locais. As novas tecnologias supracitadas criaram condições para integrar a gestão de numerosas relações entre empresas e formar alianças estratégicas entre grandes grupos industriais, principalmente os oligopólios internacionais, por meio de fusões ou incorporações. Sem implicar absorção de empresas, possibilitaram redução de custos operacionais e de trâmites burocráticos e jurídicos no desenvolvimento de produtos e processos produtivos de mercadorias. Essa é, segundo Castells (1999), a essência da dinâmica da economia em rede, que caracteriza a atuação dos oligopólios internacionais na concepção de Chesnais (1996). Na formulação de Porter (1986), essa mesma dinâmica da economia moderna é compreendida pelo conceito de indústria global; ou seja, aquela que tem atuação fragmentada no mercado mundial, com apoio das telecomunicações e da informática. De todo modo, os oligopólios internacionais fazem alianças estratégicas por meio de acordos de cooperação relativos, principalmente ao desenvolvimento de inovações tecnológicas. As alianças estratégicas constituem verdadeiras redes que organizam as atividades econômicas através de relações contratuais entre seus membros pelo mercado mundial. Os termos mercado mundial ou economia global não se referem ao espaço geográfico ou geopolítico. São utilizados no sentido de espaço como meio abstrato circunscrito pelas próprias relações econômicas. Para Chesnais (1996, p.120-123) o mercado mundial pode ser caracterizado por dois fatores principais. Primeiro, é que a fase da mundialização da economia contemporânea não abrange todos os processos econômicos do planeta. Embora seus efeitos alcancem todo o planeta como, por exemplo, os impactos ambientais, suas operações e estruturas econômicas reais dizem respeito somente aos segmentos econômicos, países e regiões que variam conforme suas posições particulares na divisão internacional do trabalho. O segundo é que os oligopólios internacionais representam os principais agentes econômicos que atuam no mercado mundial porque constituem “(...) estruturas de oferta muito concentradas para a maior parte das indústrias de alta intensidade de P&D ou alta tecnologia (...). As maiores exceções são os setores onde as estruturas de oferta são ainda mais concentradas: é o caso dos lançamentos espaciais, aviões civis de longo curso ou produtos especializados da indústria militar (Chesnais, 1996. p.94). O Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) considera que as 500 maiores empresas oligopólicas no mundo são responsáveis pela geração de 50% do PIB mundial. A dinâmica da economia contemporânea gerou novas competências relacionadas ao desenvolvimento socioeconômico das cidades e alterou o papel das instituições, especialmente quanto às relações entre os governos federal, estadual e municipal para atender novas demandas que necessitam de soluções cooperadas para problemas similares entre municípios integrantes de regiões metropolitanas ou conurbadas sobre as funções públicas de interesses comuns especificadas na Constituição Federal de 1988, como transporte, saneamento ambiental, habitação, saúde, educação e segurança. Exigem uma cultura metropolitana baseada, principalmente, na solução de novas demandas por infraestrutura urbana e em gestões compartilhadas entre prefeitos, Estado e União, que estimule o planejamento de ações integradas na prestação de serviços públicos como, por exemplo, a maior necessidade de deslocamentos diários diante da nova dinâmica econômica e urbana, além de outras competências relacionadas ao desenvolvimento socioeconômico como a sustentabilidade ambiental. Inclusive porque, “(...) a responsabilidade pela gestão metropolitana compete, juridicamente, ao Estado Federado. Mas, no exercício dessa responsabilidade, ele [o Estado] depende da cooperação dos municípios, sempre que a decisão envolver ações na área de competência destes (Cadaval e Gomide, 2002:p.185)”. Para as grandes empresas é preciso ampliar as relações com os poderes públicos, com intuito de eliminar obstáculos nas diferentes cadeias produtivas e intensificar o uso de infraestruturas de apoio às atividades econômicas, principalmente a de transportes diante da necessidade de reações rápidas e flexíveis no mercado mundial. Constituem, desse modo, novas possibilidades para promover desenvolvimento socioeconômico local e regional. Como a produção das grandes empresas está fragmentada no mercado mundial, ganham importância municípios inseridos em regiões metropolitanas, devido à oferta de bens e serviços diversos entre espaços urbanos integrados pela conurbação. Isto porque para promover desenvolvimento no Século XXI é preciso ampliar a capacidade endógena de oferta do conjunto dos municípios de uma região, envolvendo comércio e serviços diversificados dos setores públicos e privados, mão de obra qualificada, centros de pesquisa e de ensino e as infraestruturas (transporte, energia, telecomunicações, saneamento ambiental, entre outras). Nesse caso, a promoção do desenvolvimento local e regional ocorre a partir de políticas públicas que qualifiquem os recursos humanos, tecnológicos e de infraestruturas disponíveis, bem como pelo atendimento das demandas sociais para garantir qualidade de vida à população (Cappa, 2004). Torna-se mais importante valorizar recursos regionais disponíveis e eliminar obstáculos na cadeia produtiva do que compensar déficits por meio de disputas entre municípios com evasão fiscal e tributária sem contrapartidas efetivas quanto à geração de emprego e renda duradouros. Cria-se melhor oportunidade para endogeneizar processos produtivos e ampliar a geração de valores e técnicas nas cadeias produtivas, com efeitos multiplicadores no emprego, na renda e nos tributos. É uma forma de superar as políticas de desenvolvimento regional, introduzidas entre as décadas de 1950 e 1980, baseadas em programas de infraestruturas para organizar distritos industriais, como mencionado (Jaccoud, 2001). A valorização de recursos regionais e a eliminação de obstáculos nas diferentes cadeias produtivas necessitam de convergência de ações institucionais, entre os governos federal, estadual e municipal, para solucionar problemas comuns e valorizar os espaços local e regional (problemas comuns x escala espacial). Estimula-se a articulação horizontal entre os atores institucionais de uma região (prefeitos e sociedade civil organizada) e sua integração a nível vertical com as instâncias políticas de decisões (estadual e federal), viabilizando planejamento regional de forma negociada e integrada. Os novos papéis das cidades inseridas em regiões metropolitanas e a necessidade de gestões compartilhadas entre prefeitos, Estado e União para estimular a capacidade endógena de oferta do conjunto dos municípios de uma região e eliminar obstáculos na cadeia produtiva, gerou para o setor de logística industrial uma dimensão estratégica para as grandes empresas que atuam no mercado mundial por meio de redes e produção fragmentada. A logística industrial representa um diferencial de competitividade sistêmica, e países ou regiões que não possuem infraestrutura de transporte adequada à dinâmica de reprodução da economia contemporânea contribuem para elevar custos operacionais na cadeia de suprimentos, limitando a extensão do mercado consumidor aos locais de produção (Meyer-Stamer, 2005). E a disponibilidade de infraestrutura aeroportuária eficiente torna-se necessária para alcançar distintos mercados, com rapidez e segurança, e permitir a realização da produção e comercialização de mercadorias, com estoques mínimos orientados pela demanda, numa escala internacional, e não apenas local ou regional. O setor de transporte aéreo e os centros aeroportuários vêm, portanto, ganhando relevância na reprodução da dinâmica da economia contemporânea, com impactos positivos para o país e para as economias regionais. Integram circuitos comerciais e processos produtivos, de diversas cadeias industriais e redes de inovação, que conectam fornecedores de insumos, usuários de tecnologias e clientes finais no comércio internacional. Desse modo, os centros aeroportuários integram o desenvolvimento de cadeias produtivas que necessitam intercambiar mercadorias, insumos, máquinas, equipamentos, tecnologias, partes e componentes diversos. Ajudam a promover desenvolvimento nacional, regional e local, na medida em que atraem empresas e expandem atividades industriais, comerciais e de serviços, além da geração de tributos (federais, estaduais e municipais), emprego e renda, como sinaliza a literatura internacional (Airports Council International, 2002 ; Memphis, 2005 ; United Nations Conference on Trade and Development, 2008; Button, et. al. 2009). Para melhor compreender as novas demandas e relações socioeconômicas entre as empresas que atuam em redes no mercado mundial e as cidades, especialmente, conurbadas ou inseridas em regiões metropolitanas, a abordagem microeconômica neo schumpeteriana, que coloca o processo de inovação da empresa como elemento central da análise do progresso técnico, foi, segundo Sbica e Pelaez (2006), relativizada por uma visão sistêmica. Considera que a inovação tecnológica no país é resultado de um processo contínuo que demanda investimentos de longo prazo, inter relação e cooperação entre empresas, poder público, universidades, empresas, institutos de pesquisa, instituições financeiras, entre outros, com intuito de induzir a oferta e a demanda simultaneamente. A partir da visão sistêmica procura-se estimular as diversas fontes de conhecimento, as interações entre agentes econômicos privados e instituições públicas para fomentar o aprendizado, a inovação e a difusão do conhecimento, codificado e tácito, entre os agentes locais e regionais envolvidos. É possível inovar nas relações com o cliente e com a produção, que é o learning by learning (aprender a aprender). Por meio do learning by interacting (aprender por interação), o processo de inovação é social porque depende das interações e sinergias entre os agentes econômicos. Por meio dessas interações são formados vínculos entre produtores, fornecedores e instituições de apoio que aumentam a eficiência da produção (learning by doing) (Correa, et al, 2009). A noção de inovação tecnológica como processo contínuo de aprendizagem é compreendida pelo conceito de Sistema Nacional de Inovação (SNI), que também pode ser regional (Sbica e Pelaez, 2006 ; Scatolin et al, 1998 ; Scatolin, et. al, 2003 ; Lastres e Szapiro, 2000). O SNI refere-se às redes complexas de comunicação entre atores e instituições que atuam no ambiente nacional. O Sistema Regional de Inovação (SRI) ajuda a compreender a influência das economias local e regional para potencializar a inovação e sua difusão entre os agentes envolvidos no processo de aprendizagem contínuo. O SRI compreende “(...) I) as interações entre instituições (públicas e privadas) na produção e difusão de tecnologia; II) que essas interações são organizadas e canalizadas através de instituições e não se restringem ao sistema de preços, [porque] as instituições são definidas como regras sociais (formais e informais), regularidades e hábitos de comportamento que organizam a interação entre os indivíduos em sistemas complexos; e III) a diversidade de arranjos institucionais e produtivos que servem de base ao processo de aprendizado contínuo” (Scatolin, et. al., 1998: p.8). A literatura especializada sobre sistema de inovação, nacional ou regional, enfatiza o ambiente institucional na promoção da inovação e sua difusão entre os agentes, mas reconhece a necessidade de incorporar questões relativas à estrutura produtiva da região. Compreende que “(...) políticas voltadas para a promoção da interatividade, de forma alguma substituem as ações de apoio público à infraestrutura científica e tecnológica (Sbica e Pelaez, 2006:p.18). Andersen (1992) sugere ainda que o potencial de aprendizagem dependerá das características das atividades econômicas existentes no país ou na região, devido às melhores possibilidades para gerar sinergias e efeitos multiplicadores do processo contínuo de aprendizagem tecnológica, envolvendo a disponibilidade de infraestrutura local e regional. Compreende que o padrão de especialização das atividades econômicas de países ou regiões tende a ser relativamente estável no tempo, porque está associado ao potencial de inovar ou assimilar inovações. Com a competitividade sistêmica as instituições, públicas e privadas, ganharam importância na promoção do desenvolvimento das economias local e regional, com implicações para as estratégias das organizações. Para obter eficiência, melhoria constante da inovação e sustentabilidade econômica, social e ambiental, as empresas precisam ampliar suas relações com as instituições (de pesquisa, ensino, treinamento, bancos, fornecedores, além dos poderes federal, estadual e municipal. O intuito maior é otimizar o uso das infraestruturas de apoio às atividades econômicas disponíveis nas economias local e regional. A competitividade sistêmica, na interpretação de Mugnol (2006) e Casarotto Filho, et. al., (2006), exige nas empresas (nível micro), investimentos em pesquisa, desenvolvimento, engenharia e inovação, logística, qualificação dos recursos humanos e gestão (da qualidade, do relacionamento com clientes, fornecedores e parceiros, de serviços, ambiental, econômico-financeiro, comércio exterior). No nível “meta”, a competitividade sistêmica depende de valores culturais e sociais, da propensão ao empreendedorismo, à cooperação entre agentes econômicos e à geração de sinergia pelo trabalho conjunto dos integrantes das cadeias produtivas, além da velocidade de aprendizagem coletiva, do padrão de vida e da coesão social. O nível “meso” refere-se às condições tecnológicas da região, à disponibilidade de financiamento e centros de ensino superior e pesquisa, à infraestrutura de apoio às exportações e às operações das cadeias produtivas, à mão de obra disponível e a certificação de produtos e materiais. No nível “macro”, a competitividade sistêmica depende da estabilidade política e macroeconômica do país. A primeira decorre da valorização dos princípios republicanos e do aperfeiçoamento das democracias representativa e participativa. A segunda decorre de políticas econômicas que assegurem estabilidade cambial, monetária, fiscal e tributária. Nessa concepção, as cadeias produtivas das indústrias precisam de um ambiente institucional favorável para se desenvolver. Para isso, os instrumentos de apoio público devem estar presentes para fomentar e apoiar diferentes atividades econômicas, cuja síntese aparece nas políticas públicas para atender demandas institucionais. Trata-se, entre outras, de atrair investimentos externos, fortalecer empresas locais e apoiar o surgimento de novas empresas e atividades de comércio e serviços (Krugman, 1998 ; República Federativa do Brasil, 2004 ; Bezzi, 2004). 3- Novos desafios de gestão na RMCPor meio da Constituição de 1967 foram editadas as Leis Complementares 14/1973 e 20/1974 que definiram regiões metropolitanas como áreas administrativas formadas entre os maiores municípios do país e entre aqueles conurbados entre si. Essas leis foram aplicadas às principais aglomerações urbanas existentes no país naquele período, criando-se as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Fortaleza e Belém (Lei Complementar 14/1973) e a Região Metropolitana do Rio de Janeiro (Lei Complementar 20/1974). A gestão compartilhada de interesse comum foi instituída pelo artigo 25, § 3º da Constituição de 1988. A Lei Maior determina que cabe aos Estados, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum e regular, conseqüentemente, sobre a forma de gestão e administração dos interesses metropolitanos. O Estatuto da Cidade aponta a ação integrada dos municípios da região metropolitana (Lei 10.257/2001, artigos 4º, II e 45). As regiões metropolitanas são compostas por vários municípios, mantendo-se, porém, a autonomia municipal. Então, a região metropolitana representa um órgão de planejamento, dele derivando a execução de funções públicas de interesse comum (Temer, 2000, p. 113). Os pressupostos, portanto, da formação de uma região metropolitana no Brasil são os seguintes: I) lei complementar estadual; II) agrupamento de municípios limítrofes; e III) integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. Do ponto de vista jurídico, a constituição da RMC está fundamentada nos pressupostos acima por meio da Lei Complementar Estadual 870, de 19 de junho de 2000, sendo composta por 19 municípios: Americana, Artur Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara D’oeste, Santo Antonio de Posse, Sumaré, Valinhos e Vinhedo. Esses municípios constituem uma estrutura econômica e social importante no país, na medida em que compõem um território de aproximadamente 3.700 km2 onde vivem mais de 2,3 milhões de habitantes ou 1,4% do país e 6,3% do Estado de São Paulo, resultando numa densidade demográfica de 630 habitantes por quilômetros quadrados. Constituiu um PIB estimado em US$ 33,3 bilhões em 2002, o que representa 7,6% do PIB do Estado de São Paulo e 2,5% do PIB nacional. A maior parte da população da RMC (cerca de 42%) encontra-se em Campinas, que possui pouco mais de um milhão de habitantes. Predomina, portanto, a existência de municípios de tamanho médio, com destaque para Sumaré, Americana, Santa Bárbara D’Oeste e Hortolândia. Entre as cidades com 50 e 500 mil habitantes, somente sete municípios somam 975 mil habitantes e apresentam uma taxa de urbanização de 98,43%, próxima à de Campinas, que é de 98,34%. Apenas Santo Antonio de Posse, Engenheiro Coelho e Holambra, ou 15,7% do total, possuem menos de 20 mil habitantes. A Lei Complementar 870 estabelece, também, a estrutura de gestão pública da RMC, fundamentada: I) no Conselho de Desenvolvimento Econômico; II) no Conselho Consultivo; III) na criação de uma agência de desenvolvimento; e IV) na constituição do Fundo de Desenvolvimento da RMC. O Conselho de Desenvolvimento Econômico tem caráter normativo e deliberativo. É composto por 19 prefeitos das cidades que integram a RMC e por 12 membros indicados pelo Poder Executivo do Estado; todos nomeados pelo Governador do Estado de São Paulo por meio do Decreto sem número de 29 de junho de 2001. A Lei Complementar 870 assegura paridade de 50% entre os votos dos prefeitos e dos membros do Estado no Conselho de Desenvolvimento Econômico da RMC. Por isso, nas votações de qualquer matéria, pode-se ter as seguintes situações: I) os membros do Poder Executivo Estadual, que sempre votam em conjunto, fazem prevalecer a sua decisão se tiverem o apoio de apenas um prefeito de qualquer partido político; ou II) teremos empate, no caso dos prefeitos votarem juntos. A legislação que institui a RMC reforça, portanto, a centralização política e administrativa no âmbito do Estado de São Paulo em detrimento das Prefeituras. Assim, dificulta uma descentralização regional que desse maior autonomia aos municípios por meio da instituição de regiões metropolitanas, melhorando as condições para obter financiamentos, internos e externos, e para reivindicar junto a entidades públicas e governamentais melhorias econômicas e sociais por meio de projetos ou ações específicas. O Conselho Consultivo da RMC é composto por representantes dos Poderes Legislativo, Estadual e Municipal, escolhidos entre seus pares e representantes da sociedade civil organizada. Pode elaborar propostas para serem deliberadas pelo Conselho de Desenvolvimento, bem como propor a instituição de câmaras temáticas para discutir assuntos de interesse público e sugerir projetos para solucionar problemas comuns à própria região como, por exemplo, a Câmara Temática do Aeroporto Internacional de Viracopos. A agência de desenvolvimento tem a função de integrar a organização, o planejamento e a execução das citadas funções públicas de interesse comum da RMC, sendo responsável ainda pela gestão do Fundo de Desenvolvimento da RMC, supervisionado por um Conselho de Orientação composto por seis membros: quatro do Conselho de Desenvolvimento e dois diretores da autarquia. A RMC ainda está por ser consolidada do ponto de vista político e socioeconômico, inclusive porque a Lei Complementar 870, de 19/6/2000, que a criou, não contempla os novos papéis das grandes cidades em regiões conurbadas e interdependentes, diante das atuais demandas geradas pelas grandes empresas que atuam no comércio internacional por meio de uma produção fragmentada e dispersa entre países e blocos econômicos. Historicamente, a organização das metrópoles baseada na concepção corporativa, que tem no setor industrial e nas grandes cidades o centro polarizador e irradiador do desenvolvimento econômico, também não foi suficiente para resolver problemas semelhantes aos vividos hoje na RMC (Rochefort, 1998). Trata-se de um processo complexo que exige articulação política suprapartidária e ações integradas entre prefeitos e o governo do Estado de São Paulo para viabilizar as melhores alternativas técnicas e políticas aos problemas comuns da metrópole, considerando-se as qualidades e as assimetrias de cada município. Essas soluções devem ser compartilhadas entre municípios e o Estado, admitindo-se que, embora cada município tenha seus principais problemas, alguns são comuns entre eles e podem ser solucionados por meio de ações integradas no âmbito da metrópole. A Constituição Federal de 1988 contempla a gestão integrada das funções públicas de interesse comum (planejamento e uso do solo, transporte e sistema viário regional, habitação, saneamento básico, meio ambiente, desenvolvimento econômico, saúde e educação), especialmente entre Estados e Municípios integrantes de regiões metropolitanas. Mas “(...) a cooperação intermunicipal precisa ir além dos programas de investimentos e avançar na direção da gestão operacional compartilhada dos serviços de transporte e das demais funções [de interesse comum], por maiores que sejam os obstáculos políticos e culturais a esse tipo de cooperação (Cadaval e Gomide, 2002: p.191-193). 3.1 - Análise dos planos diretores dos municípios da RMCA Constituição Federal de 1988 (art. 182, §1º), o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/01, art. 41) e a Constituição Estadual do Estado de São Paulo (art. 181, §1º) tornam o Plano Diretor obrigatório para os municípios integrantes de regiões metropolitanas. E o Estatuto da Cidade explicita a necessidade da formalização desse documento para os municípios que: I) possuam mais de vinte mil habitantes; II) integrem regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III) pretendam utilizar instrumentos urbanísticos (parcelamento ou edificação compulsórios; imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo e desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública); IV) sejam integrantes de áreas de especial interesse turístico; e/ou V) estejam inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. Esse referencial jurídico e o campo de estudos da Economia Regional serviram para analisar os dados da pesquisa empírica sobre os planos diretores dos 19 municípios integrantes da RMC. O objetivo foi de verificar se as referidas leis de planejamento urbano foram compatibilizadas no planejamento local levando-se em consideração o contexto metropolitano. Orientaram também a visita técnica junto às secretarias de planejamento desses municípios para compreender como pretendem estabelecer relações econômicas com Viracopos, considerando seus impactos para a RMC. A pesquisa empírica junto aos 19 municípios da RMC, sistematizada no Quadro 1, mostrou que Indaiatuba, Monte-Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara D’Oeste, Cosmópolis, Engenheiro Coelho e Holambra não incluíram a RMC e Viracopos em seus planos diretores, totalizando nove municípios. Oito municípios contemplaram apenas a RMC em seus planos diretores, sem, contudo, mencionarem Viracopos, como Americana, Artur Nogueira, Itatiba, Jaguariúna, Santo Antonio de Posse, Sumaré, Valinhos e Hortolândia. Apenas dois municípios (Campinas e Vinhedo) incluíram a RMC e Viracopos em seus planos diretores. Com a visita técnica junto às secretarias de planejamento das 19 cidades da RMC, constatou-se que a maioria de seus municípios desenvolve projetos isolados para atrair empresas devido à proximidade com Viracopos. Monte Mor, que não incluiu a RMC e Viracopos em seu Plano Diretor, constituiu seu primeiro Distrito Industrial a 12 quilômetros de Viracopos. Trata-se do Loteamento Empresarial Bandeirantes, formado por 96 lotes de 2500m² cada um, que atraiu empresários do ABC Paulista, da Grande São Paulo e também de Campinas. Indaiatuba, que também não incluiu a RMC e Viracopos em seu Plano Diretor, planeja construir um terminal intermodal regional para contêineres ao lado de Viracopos e do ramal férreo que permite acesso ao Porto de Santos. Trata-se de uma área de 1,2 milhão/m² declarados pela prefeitura como utilidade pública, além de conceder incentivos fiscais nas áreas situadas ao longo da Rodovia dos Bandeirantes, que permite acesso a Viracopos. Valinhos, que incluiu apenas a RMC em seu Plano Diretor, pretende construir um centro logístico de distribuição de mercadorias no bairro Capivari, situado nas imediações da Rodovia dos Bandeirantes. Trata-se de uma área de 50 mil/m² onde serão construídos galpões para armazenagem, estocagem e distribuição de mercadorias diversas. Hortolândia, que também incluiu apenas a RMC em seu Plano Diretor, tem oferecido incentivos fiscais e terraplenagem para atrair empresários na cidade, por meio do Programa de Incentivo Empresarial, anunciando que está a 14 km de Viracopos. As vantagens são isenção total para alvarás de funcionamento e impostos municipais (IPTU, ITBI e ISS), este último por dez anos. Outros dois municípios, Engenheiro Coelho e Nova Odessa, que também não fizeram menções sobre a RMC e o Aeroporto Internacional de Viracopos em seus respectivos planos diretores, criaram os seus primeiros distritos industriais. Engenheiro Coelho desapropriou uma área de 60 mil m² para a construção de seu Distrito Industrial a um custo de R$ 250 mil. A área, com lotes a partir de 1000 m², está localizada às margens da Rodovia Prof. Zeferino Vaz e foi escolhida pela proximidade com universidades e centros de pesquisas como Unicamp, PU Campinas, Laboratório Sincroton e CNpQ. O município de Nova Odessa criou o Loteamento Industrial fechado denominado Jardim Dona Esther com lotes a partir de 1000 m². Oferece toda a infraestrutura urbana, além de IPTU reduzido e avenidas de 20 metros de largura, que facilitam o acesso ao centro da cidade e às rodovias que permitem acesso a Campinas e Viracopos. Campinas, que incluiu a RMC em seu Plano Diretor de 2006 e considerou o entorno de Viracopos como Área de Influência Aeroportuária, pretende alavancar R$ 20,6 bilhões na construção de um complexo comercial no entorno das estações do Trem de Alta Velocidade (TAV), no centro de Campinas e em Viracopos, com redes de hotéis, postos de armazenagem de cargas, shopping-centers, área residencial e setor logístico, envolvendo 23,6 milhões de m². Com esse projeto, a prefeitura indicou aos futuros construtores e operadores do TAV os locais onde poderão investir e qual o valor geral da venda dessas áreas. A Prefeitura de Americana fez referencia apenas à RMC, mas acredita que o crescimento do transporte aéreo, de mercadorias e pessoas, em Viracopos pode gerar demanda derivada para os aeroportos regionais como oficinas de manutenção de aeronaves, testes e vôos complementares ao de Viracopos por meio de aeronaves menores. Por isto, faz gestões junto ao governo estadual para impulsionar seu aeroporto municipal. A estratégia é investir no local para criar um polo de empresas aeronáuticas e oferecer uma alternativa na região para pousos e decolagens de pequenas aeronaves. O governo pretende expandir a área que hoje é de 214 mil metros quadrados para 260 mil metros quadrados. A pista deverá passar de 1.100 metros de comprimento e 18 metros de largura para 1.350 de comprimento e 30 metros de largura. O aeroporto recebe 900 voos mensais da aviação geral, sendo táxi aéreo, aviação executiva, aviação militar, helicópteros. Atende também a montadora de aeronaves Flyer, que utiliza esse aeroporto para finalizar a produção de aviões de até 4 lugares e para manutenção de aeronaves. O custo desses aviões varia, em média, de US$ 100 mil a US$ 300 mil. As ações isoladas de prefeitos da RMC para aproveitarem os benefícios da ampliação de Viracopos expressam o paradoxo da Constituição Federal de 1988, que promoveu a descentralização administrativa por meio da maior autonomia dos municípios, mas não equacionou a forma de gestão pública entre regiões metropolitanas e aglomerações urbanas. Delegou para Estados e municípios a gestão de problemas comuns sem, contudo, assegurar a participação da União. Motivo pelo qual, a pesquisa nos planos diretores dos municípios da RMC e a visita técnica junto às respectivas secretarias de planejamento mostraram que, de forma espontânea, não teremos ações integradas na promoção do desenvolvimento econômico regional, como forma de eliminar obstáculos nas cadeias produtivas e endogeneizar habilidades técnicas desenvolvidas pelas grandes empresas por meio de redes de produção no mercado mundial. Trata-se de outra contradição porque na Região de Campinas estão localizadas filiais de empresas transnacionais que utilizam Viracopos como infraestrutura de logística industrial para complementar suas atividades econômicas como, por exemplo, Robert Bosch, IBM, Toyota, Valeo, Gevisa, Honda, Motorola, Tetra Pak, Rhodia, Eaton, Texas Instrumentos, 3M, Magnetti Marelli, Lucent Tecnologies, Unilever e Pirelli. Para compreender as relações econômicas dessas empresas com Viracopos, foram analisados dados empíricos de 2006 a 2010 sobre o fluxo de comércio exterior das empresas filiadas ao Ciesp-RC. Apesar do curto período da série estatística (2006-2010), e da crise econômica internacional de 2008, a persistência de déficits comerciais em quase todos os anos disponíveis representa um indicador qualitativo que sinaliza a utilização de Viracopos como logística industrial para as empresas filiadas ao Ciesp RC (Tabela 1). Essas empresas utilizam Viracopos, especialmente, para importar matérias primas, insumos, peças, partes e componentes diversos para produzir mercadorias manufaturadas, sobretudo de tecnologia sofisticada como eletroeletrônico e comunicação. Mantém, contudo, estoques mínimos para reduzir custos operacionais e obter vantagens competitivas em diversos países ou regiões, diante da produção, comercialização e inovação em redes espalhadas pelo mercado mundial. TABELA 1 – BALANÇA COMERCIAL DAS EMPRESAS FILIADAS AO CIESP REGIONAL CAMPINAS (milhões US$) Sinais nessa direção estão dados pelo fato de que as importações são de origem de países com elevado potencial de inovação tecnológica como EUA, União Européia e China. Trata-se de países que concentram a geração e a difusão de inovação tecnológica no mercado mundial, como assinalaram (Chenais, 1996 ; Porter, 1989 ; Castells, 1999). Além disso, utilizam Viracopos para exportar essas mercadorias manufaturadas, sobretudo para países da América Latina como Argentina, Bolívia, Caribe, Chile, Equador, Paraguai e Venezuela (Gráficos 1 e 2). Nesse caso, trata-se de países receptores das inovações tecnológicas geradas pelos países desenvolvidos. Então, os oligopólios internacionais utilizam toda a infraestrutura disponível na Região de Campinas como estratégia de ocupação do mercado latino americano. GRÁFICO 1 – PRINCIPAIS MERCADOS DE ORIGEM DAS Fonte: CIESP CAMPINAS – Julho e Agosto de 2010 – Elaboração do autor. ---- Gráfico 2 – Principais mercados de destinos das
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1 Pesquisador na PUC Campinas. Email: josmar.cappa@puc-campinas.edu.br
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QUADRO 1 – PLANOS DIRETORES MUNICIPAIS E AS RELAÇÕES COM A REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS E VIRACOPOS
Fonte: Pesquisa empírica nos Planos Diretores realizada de março a junho de 2010. Elaboração dos Autores. PD = Plano Diretor ; DL = Decreto Lei ; LC = Lei Complementar
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TABELA 1 – BALANÇA COMERCIAL DAS EMPRESAS FILIADAS AO CIESP REGIONAL CAMPINAS (milhões US$)
Fonte: CIESP CAMPINAS – Elaboração do autor *Dados das principais empresas importadores e exportadores de
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TABELA 2 – BALANÇA COMERCIAL DAS EMPRESAS FILIADAS AO CIESP REGIONAL CAMPINAS POR SETORES ECONÔMICOS (valores em milhões US$)
Fonte: CIESP CAMPINAS – Elaboração do autor Outros = Borracha, Mecânica, Produtos de Minerais (Cerâmica), Alimentos, Farmacêutico, Têxtil.