Espacios. Vol. 37 (Nº 18) Año 2016. Pág. E-3

Percepção dos estudantes do curso superior de enfermagem sobre segurança do paciente

Perception of nursing college students on patient safety

Cristiane HARTMANN 1; Márcia Cristina Zago NOVARETTI 2

Recibido: 03/02/16 • Aprobado: 13/04/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Método

3. Resultados

4. Discussão

5. Considerações finais

Fomento e agradecimento

Referências bibliográficas


RESUMO:

Estudar a percepção dos estudantes do curso superior de enfermagem sobre segurança do paciente. Método: Estudo exploratório, quantitativo e qualitativo, realizado em universidade brasileira com participação de 93 alunos. Resultados: Os participantes entendem o conceito de segurança do paciente, porém 50,5% não registram as ocorrências relacionadas, principalmente pelo medo de punição (50,5%) e não há consenso sobre o que constitui sobrecarga de trabalho. Conclusão: A falta de internalização da cultura de segurança do paciente torna os estudantes de enfermagem vulneráveis aos erros, evidenciando a necessidade de intervenções durante a graduação para modificar a percepção desses profissionais nessa temática.
Descritores: Enfermagem, Segurança do Paciente, Qualidade.

ABSTRACT:

To study the perception of nursing students about patient safety. Method: This is an exploratory study of quantitative and qualitative approach, held in an Brazilian University with participation of 93 nursing students. Results: Participants understand the concept of patient safety, but 50.5% did not register related events, primarily by fear of punishment (50.5%). There is no consensus among participants of what constitutes work overload. Conclusion: The lack of internalization of patient safety culture and work overload make nursing students vulnerable to errors, highlighting the need for interventions during graduation to change the perception of these professionals in this subject.
Keywords: Nursing, Patient Safety, Quality.

1. Introdução

A segurança do paciente, enquanto componente da qualidade dos cuidados em saúde, tem assumido grande relevância (LIMA, 2014). Por consequência, cresce o reconhecimento dos gestores da saúde sobre sua importância e recebe destaque com a implantação de medidas de prevenção à exposição de riscos, bem como aos danos advindos da assistência à saúde (FASSINI & HAHN, 2012). Como os profissionais de enfermagem correspondem ao mais numeroso contingente nas instituições hospitalares, surge a importância de reconhecer o trabalho dessa classe profissional, sua contribuição e sua avaliação sobre o desenvolvimento dos processos dos quais fazem parte (DAS DORES PEREIRA et al, 2014)..

Entende-se segurança do paciente como a redução de riscos desnecessários associados aos cuidados de saúde a um mínimo aceitável. Estes danos são decorrentes ou ligados aos planos de trabalho ou as ações tomadas durante a prestação de assistência diferentemente de doenças ou lesões adjacentes (LIMA, 2014). Em 2004, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu como prioritário o desenvolvimento de pesquisas baseadas em evidências científicas com melhores práticas bem como iniciativas de pesquisas de maior impacto nos problemas sobre o tema (CARVALHO et al, 2012)..

Os incidentes relativos à segurança do paciente podem ser classificados de acordo com o dano, este denominado de prejuízo na estrutura ou funções do corpo e/ou qualquer efeito nocivo daí resultante, e inclui doença, lesão, sofrimento, incapacidade ou morte. Um incidente pode ser uma ocorrência comunicável, um quase evento, um incidente sem danos ou um incidente que envolva danos (evento adverso). Uma ocorrência comunicável é uma situação com potencial significativo de causar dano, mas em que não ocorreu nenhum incidente. Um quase evento é um incidente que não alcançou o doente. Um evento sem danos é um incidente que chegou ao doente, mas não resultou em danos discerníveis. Um incidente com danos (evento adverso) é um incidente que resulta em danos para o paciente (Organização Mundial da Saúde- OMS, 2011).

Os eventos adversos são a forma mais simples de se reconhecer um erro quantitativamente pois causam danos e são mais facilmente identificados, afetando em média 10% das internações hospitalares, desses mais de 65% seriam danos evitáveis, o que aumenta o tempo de permanência, mortalidade e custo hospitalar. O valor gasto com internações hospitalares é 200% maior na ocorrência de eventos adversos e o tempo de internação aumenta, em média, 28 dias (DUARTE et al., 2015).

A partir dos estudos do médico Avedis Donabedian, o modelo estrutura-processo-resultado passou a orientar a avaliação sistemática da qualidade do atendimento em saúde. Estrutura é o ambiente onde os serviços são prestados, processos são as etapas envolvidas na prestação dos serviços e os resultados são medidos por diferentes critérios, por exemplo, os indicadores de qualidade e satisfação do cliente (RIBEIRO et al., 2014).

A mensuração de incidentes de segurança do paciente é complexa. Muitos sistemas dependem de relatórios voluntários (relatório de incidentes) que detectam uma pequena fração de erros. Outros métodos, tais como indicadores de segurança do paciente, extraídos de conjunto de dados administrativos, podem ser excessivamente sensíveis e, portanto, devem ser complementados por uma revisão detalhada de prontuários. O uso da ferramenta de rastreamento global para a busca de indícios sobre um possível evento adverso, seguido pela revisão detalhada do prontuário, tem se tornado cada vez mais comum nos últimos anos, de acordo com a mudança de foco dos erros individuais para detecção das etapas e situações que contribuíram para a ocorrência dos incidentes de segurança do paciente como alvos para intervenções e mensuração (Organização Mundial da Saúde- OMS, 2011).

Nesse sentido, busca-se uma constância coletiva na prevenção de incidentes, utilizando-se uma abordagem proativa, não punitiva e de incentivo à notificação espontânea e anônima dos eventos (CLARO et al., 2011). Apesar de haver compromisso e empenho de forma individual por parte dos profissionais, isto não é o bastante. É imprescindível que as organizações utilizem de esforços para superar a cultura tradicional de culpa e castigo, e passem a incentivar a cultura do relato e do aprendizado com os erros e acidentes, criando condições para que a segurança do paciente seja percebida como responsabilidade de todos (LIMA, 2014).

A cultura de segurança é um produto de valores, atitudes, percepções e competências, grupais e individuais, que determinam um padrão de comportamento e comprometimento com o gerenciamento de segurança da instituição (CARVALHO et al, 2012).. É compreendida como um fator de desempenho, formação e comportamentos dos profissionais da saúde que os faz visualizar a segurança do paciente como uma de suas prioridades. Para concretizá-la é essencial levantar os fatores organizacionais que impedem a sua formação (LUIZ et al, 2015).

A enfermagem, desde a época de Florence Nightingale, salientou a qualidade da assistência realizada, fato evidenciado pela preocupação em seguir rigorosamente os procedimentos executados, pois assim se alcançariam os resultados aspirados (DE SOUZA OLIVEIRA, de carvalho, & roSSI, 2015). Mas a área da saúde foi uma das últimas a adotar os modelos de qualidade (ALONSO, 2011), influenciada por pressões por parte do governo, indústrias, clientes e da evolução tecnológica da medicina (VITURI & EVORA, 2015).

A qualidade do atendimento realizado no cotidiano é produto de dois fatores: a ciência e a tecnologia em si (saber teórico) e sua aplicabilidade (prática) (CARVALHO et al, 2012).. Dentre os princípios que norteiam a qualidade estão: identificar e priorizar os problemas, gerenciar os processos, valorizar os clientes e os profissionais, prevenir erros e definir metas, por meio de uma gestão participativa. Utiliza conceitos de redução de desperdício, instrumentos de medida, envolvimento, comprometimento e integração de todos na organização (VITURI & EVORA, 2015).

A liderança influencia diretamente na cultura de uma organização portanto tem forte capacidade de redesenhá-la. Os enfermeiros são agentes que influenciam diretamente a qualidade do serviço (RIBEIRO et al, 2015).  A equipe de enfermagem é fundamental em um programa de qualidade, devido à expressiva quantidade de profissionais, por sua atuação direta e permanente com os clientes internos e externos, interação com todas as áreas de apoio e familiaridade com questões gerenciais, de liderança, auditoria, pesquisa e educação. Assim, os processos de acreditação são influenciados pelas ações de enfermagem (MANZO et al, 2012).

O Programa de Acreditação Hospitalar é um procedimento de avaliação de recursos institucionais, de forma periódica, voluntária, racionalizada, ordenadora e, principalmente, de educação continuada dos profissionais, com o intuito de garantir a qualidade da assistência por meio de padrões pré-definidos (segurança, organização, excelência na gestão) (MANZO, BRITO & DOS REIS CORREA, 2012). A avaliação é realizada na própria instituição e é transversal, de forma sistêmica permite analisar os processos de trabalho e as relações com os resultados, não se avaliando um setor ou processo isoladamente (RIBEIRO et al., 2015). Consequentemente, há a distinção das organizações de saúde e o modelo mostra-se uma excelente ferramenta de gestão, à medida que mostra onde melhorar, identifica e entende seus pontos fortes e oportunidades de melhoria, promovendo a cooperação interna entre setores, processo e pessoas da equipe (ALONSO et al., 2014).

A atuação gerencial, peculiar dos enfermeiros, prevalece no processo de acreditação em detrimento da função exercida por profissionais técnicos de enfermagem. Porém, a qualidade será refletida principalmente no cuidado cotidiano dos pacientes, os quais são executados por uma equipe multiprofissional (MANZO et al, 2012). A enfermagem está se adaptando à proposta de reorganização das instituições. Seu envolvimento e a forma de organizar os processos de trabalho podem mudar o sistema de saúde pautado na qualidade e exige mudança no perfil profissional (BRITO et al, 2015).

A maioria dos autores dos trabalhos publicados na área até o momento tem título de doutor ou mestre e está vinculado a instituições de ensino superior, fator indicativo de que os enfermeiros assistenciais ainda se envolvem pouco na pesquisa do tema (DAS DORES PEREIRA et al, 2014)..Neste contexto, o principal objetivo deste estudo é saber qual a percepção dos estudantes do curso superior de enfermagem sobre a segurança do paciente e como objetivos secundários determinar se são cientes que suas rotinas e procedimentos fazem parte do processo de qualidade em saúde e se têm entendimento do seu papel no processo de acreditação hospitalar.

2. Método

Esta pesquisa, prospectiva, de tipo exploratória com abordagem qualitativa e quantitativa foi realizada em uma universidade privada, com mais de 130.000 alunos, localizada na região Sudeste do Brasil. Os participantes deste estudo foram os alunos de graduação do curso de enfermagem, de ambos os sexos, do primeiro ao oitavo semestres de um Campus localizado no município de São Paulo.

O instrumento de coleta de dados foi um questionário auto administrado, com perguntas de múltipla escolha acerca de: dados demográficos (idade, sexo, estado civil), trabalho (número de horas semanais), influência de horas trabalhadas na qualidade dos serviços prestados, conceito de sobrecarga de trabalho para enfermagem,  se sobrecarga de trabalho pode influenciar na qualidade dos serviços, conceito de segurança do paciente, relato de erros, motivos para não reportar erros, conceito de qualidade e processos de qualidade em saúde, conceito de acreditação hospitalar, importância de acreditação hospitalar.

Foi utilizada a escala de cinco pontos de Likert para a tabulação de respostas que variam do concordo totalmente ao discordo totalmente. O questionário foi enviado por via eletrônica através da plataforma Survey Monkey®. A plataforma Survey Monkey® é uma plataforma eletrônica que permite a coleta de dados, análise e transferência dos dados diretamente para programas de análise estatística. Após explicação dos objetivos e escopo da pesquisa, a participação foi voluntária, baseada na vontade de colaborar para o estudo e assinatura eletrônica do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

As variáveis contínuas foram analisadas pelos testes estatísticos descritivos e as variáveis categóricas serão apresentadas com frequências absolutas e relativas.

3. Resultados

Um total de 93 questionários enviados eletronicamente foi respondido e as respostas armazenadas na plataforma Survey Monkey, sendo 83 (89,2 %) participantes do sexo feminino e apenas 10 (10,8%) do sexo masculino. A maioria dos respondentes (81, 93,7%) tem idade entre 18 e 40 anos idade. Quanto ao estado civil, praticamente a metade (46, 49,5%) são solteiros.

Nesta pesquisa, a maioria dos participantes trabalha (72, 77,4%) e destes, 42 (45,2%) trabalham mais que 36 horas semanais excluindo-se os estágios da faculdade. Quando questionados se trabalhar mais de 44 horas semanais poderia comprometer a qualidade dos trabalhos prestados, 86,1% dos pesquisados concordam com a assertiva. Entretanto, os futuros profissionais de enfermagem entrevistados não apresentaram consenso quanto à definição de sobrecarga de trabalho, sendo que apenas 33 (35,48%) participantes consideram que atender três pacientes ou menos seria adequado. Na tabela 1, pode-se observar que a percepção do profissional de enfermagem nesse quesito varia consideravelmente, e que aproximadamente dos alunos envolvidos nesta pesquisa 33,4% discordam dessa afirmação.

Praticamente a metade dos participantes desta pesquisa relatam não registrar todas as ocorrências relacionadas à segurança do paciente (50,6%). A tabela 1 apresenta os principais motivos apontados para o não registro de todos os incidentes de segurança do paciente. Ainda persiste o receio de punição 47 (50,5%), mostrando que se deve elaborar estratégias para que esse desafio seja superado. A segunda resposta mais frequente foi a falta de tempo 41 (44,1%) o que, de certa forma contradiz a resposta anterior quanto à sobrecarga de trabalho ou também pode revelar outras atividades não assistenciais, tais como as tarefas administrativas, dispendendo tempo valioso do profissional de enfermagem. Ressalte-se que cada participante podia assinalar mais de uma alternativa para os motivos de não registro das ocorrências relativas às falhas de segurança do paciente, média de 2,15 respostas/participante variando de 1-3 alternativas escolhidas. Um campo para outras causas de falhas nos registros também possibilitava a livre opinião dos participantes, muito embora nenhum tenha acrescentado outra justificativa para não registras essas ocorrências.  

Deve-se ressaltar o percentual expressivo de participantes (50,6%) que não sabe como notificar/não tem o hábito de fazê-lo, mostrando que há oportunidade para treinamento e, com isso, possibilidade de alterar com o tempo o comprometimento desses profissionais para o adequado registro de ocorrências de segurança do paciente. Por fim, 12,9% dos entrevistados não consideram que seja de sua atribuição a notificação desses incidentes cabendo novamente o reforço no treinamento e no envolvimento de todos os colaboradores da instituição que prestam assistência ao paciente.

Em caso de um evento adverso relacionado à segurança do paciente que tenha ocorrido com um colega de trabalho que não o notificou, a postura de 74,2% seria de convencer o profissional a avisar a coordenação de enfermagem e registrar a ocorrência e 50,5% notificariam a coordenação se o colega não o fizesse. Somente 4,3% não saberiam o que fazer. Para 84 (90,3%) dos entrevistados há o entendimento de que segurança do paciente consiste na redução dos riscos desnecessários associados aos cuidados de saúde ao mínimo aceitável.

No que se refere à qualidade dos serviços de saúde 80 (86,1%) dos entrevistados confirmam que as rotinas e procedimentos de enfermagem podem interferir na qualidade do serviço prestado pela instituição hospitalar, também consideram que avaliar as rotinas e os procedimentos realizados durante a assistência é uma maneira de aumentar a qualidade dos serviços (tabela 1).

Considera-se sobrecarga de trabalho quando um profissional de enfermagem tem sob sua responsabilidade mais que 2 pacientes para dar assistência hospitalar, durante sua jornada de trabalho mais que dois pacientes:

N

%

Concordo plenamente

15

16,13

Concordo

18

19,35

Não concordo nem discordo

29

31,18

Discordo

30

32,26

Discordo fortemente

1

1,08

TOTAL

93

100

Motivos para o não registro de todos os incidentes de segurança vivenciados:

N

%

Medo de punição

47

50,54

Falta de tempo

41

44,09

Não tem o hábito de registrar

22

23,66

Não sabe como registrar

25

26,88

Cansaço

15

16,13

Acha que não é sua atribuição

12

12,9

Acha que avisar o enfermeiro é suficiente

38

40,86

TOTAL

93

100

 As rotinas e procedimentos dos profissionais de enfermagem podem interferir na qualidade do serviço prestado pela instituição hospitalar:

N

%

Concordo plenamente

34

36,56

Concordo

46

49,46

Não concordo nem discordo

9

9,68

Discordo

4

4,3

Discordo fortemente

0

0

TOTAL

93

100

Avaliar as rotinas e procedimentos realizados durante a assistência aos pacientes é uma maneira de:

N

%

Punir os funcionários que cometem erros

1

1,08

Rever os erros e encontrar uma maneira de aprender com eles

38

40,86

Aumentar a qualidade dos serviços prestados

54

58,06

Aumentar o trabalho burocrático da enfermagem

0

0

Não interfere na qualidade dos serviços prestados

0

0

TOTAL

93

100

Quanto ao papel da enfermagem no programa de Acreditação Hospitalar, 75 respondentes (80,6%) acreditam que é fundamental devido a expressiva quantidade de funcionários, sua atuação direta com paciente, interação com todas as áreas do hospital, envolvimento no gerenciamento e na educação continuada. Já 18,3% acreditam que os profissionais de enfermagem têm a mesma importância que os demais profissionais e setores do hospital. Somente um entrevistado acredita que as ações de enfermagem não têm influência no processo de acreditação.

Quanto à importância do processo de acreditação hospitalar, 42 (45,2%) participantes avaliam o processo de acreditação hospitalar como relevante porque certifica que o hospital apresenta um nível de excelência nos serviços prestados enquanto que 38 (40,9%) considera que a segurança do paciente nos processos de enfermagem leva ao aumento da qualidade dos serviços prestados pela instituição, e para 10,8% dos respondentes porque comprova que a equipe de enfermagem, através da educação continuada, busca aprender com os erros e se empenha nesse processo. Somente três participantes (3,2%) consideram que a acreditação não é importante para que um hospital tenha qualidade.

4. Discussão

O amplo predomínio de alunos do sexo feminino na graduação de enfermagem neste estudo (89,2%) reforça o perfil feminino dos profissionais que atuam na área da saúde, em âmbito mundial e no Brasil (SILVA, BATISTA & GRAZZIANO, 2014; AUED et al., 2016).

A maioria dos participantes desta pesquisa (86,1%) considera que trabalhar mais que 44 horas semanalmente poderia comprometer a qualidade dos serviços prestados. Este resultado vem ao encontro de pesquisas já publicadas as quais relatam o processo de trabalho das equipes de enfermagem como carregados de cargas físicas e psíquicas (GUEDES et al., 2014). O desgaste físico aparece com mais frequência entre auxiliares e técnicos de enfermagem. O estresse e o desgaste psíquico são mais frequentes em enfermeiros, ocasionados por forma de organização do trabalho, jornadas de trabalho de mais de 40 horas, trabalho noturno e convivência com situações estressantes (FORTE et al., 2014).

Apesar de Queijo & Padilha terem publicado que quando um profissional de enfermagem tem sob sua responsabilidade mais que dois pacientes para dar assistência hospitalar em sua jornada de trabalho já pode ser considerado sobrecarga de trabalho, a maior parte dos respondentes deste estudo não tem este conceito claramente definido, aumentando a chance de erros (QUEIJO & PADILHA, 2009). Além do mais, uma parcela considerável dos respondentes não tem noção dos riscos associados à sobrecarga de trabalho, não somente ao profissional de enfermagem, mas sobretudo para os pacientes por eles assistidos.

Novaretti et al., em 2014 já demonstraram que a sobrecarga de trabalho está diretamente relacionada a aumento de risco a incidentes de segurança do paciente, a eventos adversos e inclusive a maior risco de óbito. Outro aspecto a ser considerado refere-se aos diferentes graus de complexidade no atendimento de cada paciente (NOVARETTI et al., 2014). A Resolução nº 293/2004 do Conselho Federal de Enfermagem estabelece parâmetros para o dimensionamento do pessoal de enfermagem nas instituições de saúde, com base na aplicação de um Sistema de Classificação de Pacientes, como critério para se estabelecer o perfil de cada paciente internado, as horas mínimas de assistência e a distribuição dos profissionais para cada tipo de cuidado (BARBOSA et al., 2014).

Segundo a ANVISA (2004), é responsabilidade dos gestores zelar que o ambiente hospitalar apresente condições de segurança para os colaboradores e os pacientes. No entanto, cabe a todos os colaboradores técnicos-assistenciais, juntamente com a gestão de serviços a responsabilidade de manter a integralidade do paciente durante seu período na instituição de saúde (DAS DORES PEREIRA et al., 2014).

Embora os participantes deste estudo demonstrem que têm consciência do que deve ser feito e que 84,9% afirmam que o tema segurança do paciente é abordado na graduação de Enfermagem, há um número expressivo (74,2%) que não tomaria nenhuma atitude a respeito, mostrando que, apesar da Publicação do Plano Nacional de Segurança do Paciente em 2013 no Brasil, dos esforços empreendidos para maior conscientização da importância das notificações de incidentes de segurança do paciente, que outras estratégias devem ser planejadas e implementadas durante a graduação do profissional de enfermagem para que haja mudança do cenário apresentado.

A cultura de segurança é constituída pelos seguintes componentes: uma cultura justa, onde há o consenso entre as pessoas no que concerne a comportamentos aceitáveis e inaceitáveis, uma cultura de notificação de incidentes que privilegia a informação e encoraja as pessoas a falarem sobre seus erros e a notificá-los e uma cultura de aprendizagem utilizando a memória dos eventos passados para direcionar a aprendizagem. Na pesquisa aqui apresentada, 91,4% dos participantes entendem claramente esse conceito, de acordo com as respostas coletadas.

Recentemente, um estudo brasileiro inferiu que os profissionais não reconhecem as condições de trabalho como potenciais facilitadores para ocorrência de erros, centrando a responsabilidade pela qualidade e segurança do trabalho nos profissionais (LUIZ, et al., 2015) o que explica, em parte os resultados por nós obtidos em que 50,5% dos entrevistados não notificam os incidentes por medo de punição, conforme tabela 1. NO entanto, do ponto de vista gerencial, é necessária a compreensão de que os eventos adversos estão, muitas vezes, relacionados às falhas de sistema da organização. Assim, mais do que buscar culpados, é necessário identificar as fragilidades existentes nos diferentes processos e adotar medidas preventivas para mitigá-los (DUARTE et al., 2015).

A falta de treinamento e falhas na comunicação podem interferir na interpretação dos funcionários quanto ao seu papel na organização hospitalar. Os dados aqui apresentados ressaltam a necessidade de reforçar a interação entre ensino e assistência, concretizando um processo de formação que reconhece as modificações ocorridas com a implantação de novos modelos gerenciais o que acarreta em mudanças no processo de trabalho em saúde e exige adequação do perfil profissional (MANZO, BRITO & DOS REIS CORREA, 2012).

5. Considerações finais

Os profissionais de enfermagem, em sua grande maioria, concordam que segurança do paciente consiste na redução dos riscos desnecessários associados aos cuidados de saúde ao mínimo aceitável. Entendem que na cultura de segurança do paciente se encoraja a identificação, a notificação e a resolução de problemas relacionados à segurança do paciente, promovendo um aprendizado organizacional e que a participação da enfermagem no processo de acreditação hospitalar é fundamental devido à expressiva quantidade de funcionários, atuação direta com pacientes, interação com todas as áreas do hospital e envolvimento no gerenciamento e educação continuada. Esses são os conceitos elaborados e presentes em grande parte da literatura sobre o tema. Porém, observa-se que os conceitos são conhecidos, mas não estão internalizados nas rotinas e procedimentos diários.

Não há um consenso sobre o conceito de sobrecarga de trabalho mesmo compreendendo a importância de uma assistência adequada ao paciente. A notificação dos incidentes relativos a segurança do paciente é falha, metade dos entrevistados simplesmente não relata e os motivos vão contra o conceito de cultura de segurança do paciente: medo de punição, a falta de tempo, não saber como notificar, não ter o hábito de notificar, não achar que seja sua atribuição são respostas que indicam uma falta de comprometimento da enfermagem ou a falta de regras claras de como se deve proceder frente a esses acontecimentos dentro da instituição.

Os estudantes do curso superior de Enfermagem consideram que avaliar as rotinas e os procedimentos realizados durante a assistência é uma maneira de aumentar a qualidade dos serviços e a acreditação hospitalar mostra que os processos de enfermagem são extremamente relevantes nesta qualidade, mas não relatam os incidentes o que é parte do desenvolvimento destes processos mostrando a necessidade das instituições de adotarem providencias para resolução dessa questão.

Assim, deve-se elaborar estratégias para a melhoria do entendimento da enfermagem quanto ao seu papel profissional, que parece entender o contexto das novas linhas de gerência hospitalar, mas não está atuante e principalmente modificadora de antigos padrões. Investimentos em treinamento, melhora da comunicação, palestras explicativas e continuadas sobre os novos métodos de gestão e valorização explícita do profissional de enfermagem podem modificar, com o tempo, o seu comprometimento fazendo com que a prevenção, detecção, notificação e correção de incidentes de segurança do paciente tornem-se parte da sua rotina de trabalho.

Fomento e agradecimento

A autora Cristiane Hartmann, recebeu bolsa de Iniciação Científica concedida pela Universidade Nove de Julho para a realização deste trabalho. Agradecemos à Diretoria de Pesquisa da Universidade Nove de Julho pelo apoio recebido para o desenvolvimento desta pesquisa.

Referências bibliográficas

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1. Estudante de Enfermagem da Universidade Nove de Julho. E-mail: cris-hart@hotmail.com
2. Médica. Doutora em Medicina pela Universidade de Medicina da Universidade de São Paulo. Diretora, Mestrado Profissional em Administração, Gestão em Sistemas de Saúde da Universidade Nove de Julho, autor correspondente: e-mail: marcianovaretti@uninove.br ou mnovaretti@gmail.com.


 

Revista Espacios. ISSN 0798 1015
Vol. 37 (Nº 18) Año 2016

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