Espacios. Vol. 37 (Nº 04) Año 2016. Pág. 7

(Re)pensando a intersecção entre sustentabilidade e cadeia de suprimento

(Re)thinking the intersection between sustainability and supply chain

Minelle Enéas da SILVA 1; Luis Felipe NASCIMENTO 2

Recibido: 23/09/15 • Aprobado: 23/10/2015


Contenido

1. Introdução

2. Sustentabilidade: contradições e contribuições

3. Relacionamentos Interorganizacionais e Cadeia de Suprimento

4. Sustentabilidade e Cadeia de Suprimento: o que se discute hoje?

5. Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento (SCS)

6. SCS: uma proposta de Agenda

7. Considerações Finais

Referências


RESUMO:

Muitas são as discussões sobre o papel e os desafios que empresas possuem em incorporar práticas que facilitem sua contribuição à sustentabilidade, principalmente em relação aos seus stakeholders. Assim sendo, este artigo objetiva analisar as possibilidades de intersecção entre Sustentabilidade e Cadeia de Suprimento no sentido de discutir a aplicabilidade dessas abordagens de forma integrada no âmbito organizacional, apresentando uma agenda de pesquisa. Por meio de um ensaio teórico, a discussão demonstra que a aproximação atual tem como foco o conceito de Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento (SCS), o qual tem sido observado nas publicações nacionais, todavia percebe-se que reflexões devem ser realizadas, tanto no que se refere aos aspectos teóricos quanto aos metodológicos. O artigo propõe uma discussão a ser observada por pesquisadores da área em relação ao que vem sendo publicado e às futuras pesquisas, na busca pelo avanço da temática no país.
Palavras-chave: Sustentabilidade; Cadeia de suprimento; Agenda de Pesquisa.

ABSTRACT:

Many are the discussions on the role and challenges that companies have to incorporate practices that facilitate their contribution to sustainability, especially in relation to its stakeholders. Therefore, this paper aims to analyze the possibilities of intersection between Sustainability and Supply Chain in order to discuss the applicability of these approaches in an integrated manner in the organizational context, from a research agenda. Through a theoretical essay, the discussion demonstrates that the approach current focuses on the concept of Sustainable Supply Chain Management (SSCM), which has been seen in Brazilian publications, but realizes that reflections should be made, both with regard to the theoretical aspects and to the methodological. The article proposes a discussion that can be observed by researchers in the field in relation to what is being published and future studies in order to seek the advancement of the theme in Brazil.
Keywords: Sustainability; Supply Chain; Research Agenda.

1. Introdução

A tentativa de conceituar a Sustentabilidade como parte da Cadeia de Suprimento – seja no design, nas operações ou no desempenho – é muitas vezes descrita, em relação à Gestão da Cadeia de Suprimento, como uma extensão de atuais abordagens teórica e prática. [...] No entanto, ao invés de focar mais nos atributos da Cadeia de Suprimento como a solução, deve-se dar um passo atrás e explorar [melhor] a intersecção entre Sustentabilidade e Cadeia de Suprimento. (Halldórsson, Kotzab & Skjøtt-Larsen, 2009, p.84)

Em meio à construção de um maior alinhamento entre as pesquisas existentes sobre sustentabilidade e cadeia de suprimento e o entendimento de seus conceitos ainda como emergentes em sua base teórica (Ahi & Searcy, 2013; Ashby, Leat & Hudson-Smith, 2012), percebe-se ser necessária a ampliação do conjunto de abordagens que contribui nesse sentido, como por exemplo, dar um caráter estratégico as atividades de operações. Com inspiração na reflexão de Halldórsson, Kotzab e Skjøtt-Larsen (2009), sobre a necessidade de dar um passo atrás para explorar melhor a intersecção entre as duas perspectivas, o repensar e a revisão desses conceitos torna-se uma construção necessária voltada a uma consistência teórica e a utilização de diferentes lentes de análise que rompam obstáculos existentes.

Muito do que se discute sobre sustentabilidade e cadeia de suprimento, de forma individual ou sobreposta, traz a necessidade de um novo olhar para uma abordagem teórica concisa, uma vez que ao se focar a perspectiva prática centra-se na busca por um conjunto de soluções imediatas. Seguindo esse pensamento, apesar da gama de contradições que envolvem os temas, sejam internamente ou mesmo na tentativa de aproximação entre os mesmos, abre-se como lacuna de pesquisa a necessidade de articulações entre as temáticas, as quais necessitam de uma compreensão clara das origens e evoluções que estão sendo trabalhadas, buscando-se novas construções teóricas, pela importância dos temas para a sociedade.

As discussões sobre sustentabilidade ainda possuem inconsistências na apropriação de suas características, pelo desconhecimento dos vários caminhos a serem trilhados (Munk & Souza, 2011). Com isso, sob uma perspectiva crítica, surge como questionamento principal sobre o conceito: a epistemologia assumida é inclusiva, fundada na ética e no valor real? (Fergus & Rowney, 2005a; 2005b). Tal indagação é válida, à medida que para Lelé (1991) e Banerjee (2003) são muitos os entendimentos equivocados do tema, desde a compreensão clara sobre sua proposta e impacto, até a preocupação de para quem vão seus holofotes. Pelo surgimento em meio ao contexto econômico, a Sustentabilidade ainda assume uma limitação quanto a sua atuação, pois na maioria dos casos o foco na manutenção do status quo, sem assumir a proposta de mudança atribuída ao tema (Hopwood, Mellor & O'Brien, 2005).

Mesmo com a existência dessas discussões internas, percebe-se que à medida que se assume um contexto de mudança nas atividades desenvolvidas por um conjunto de atores, um novo contexto pode surgir. Segundo Peattie (2007), para que a sociedade consiga incorporar os desafios inerentes a Sustentabilidade, o principal aspecto a ser visualizado relaciona-se com a ideia de gestão, tendo em vista que os padrões de produção e consumo praticados não são sustentáveis e necessitam de uma melhor orientação. Com isso, diferentes organizações, dentre as quais as empresariais, devem assumir novos comportamentos e preocupações ao se voltar para a redução dos atuais impactos sobre a sociedade.

De acordo com Parmigiani e Rivera-Santos (2011), nenhuma organização é uma ilha atuando no mercado, todas necessitam de relacionamentos com outras organizações para sobreviver. Tais relacionamentos interorganizacionais podem ser entendidos como sendo estrategicamente importantes e cooperativos entre uma organização focal e uma ou mais organizações para compartilhar ou trocar recursos no atendimento de suas metas (Oliver, 1991; Parmigiani & Rivera-Santos, 2011). Para tanto, como apresentam Santos e Eisenhardt (2005), deve-se observar as fronteiras organizacionais que demarcam a estrutura social que constitui a organização, as quais podem facilitar a compreensão da atuação da organização focal individualmente e em relação aos demais participantes do mercado.

A partir dessas visões e com a compreensão individual de cada um dos temas, como indicam Besk e Seuring (2014) e Pagell e Schevchenko (2014), a sustentabilidade está sendo integrada no mainstream de pesquisa de gestão da cadeia de suprimento (GCS). No mesmo sentido, segundo Ashby, Leat e Hudson-Smith (2012), a sustentabilidade e a GCS tem apresentado um crescente foco de estudo enquanto área de pesquisa, no entanto, como se ressalta, ainda existe pouca literatura que examine os temas em suas características principais e essenciais. Com essa noção, de acordo com Halldórsson, Kotzab e Skjøtt-Larsen (2009), questiona-se como estão sendo aproximadas essas temáticas, à medida que se observa uma mudança coletiva necessária.

São muitos os autores que têm buscado realizar uma aproximação entre os conceitos (Ahi & Searcy, 2013; Carter & Rogers, 2008; Carter & Easton, 2011; Gold, Seuring & Beske, 2010; Pagell & Wu, 2009; Seuring & Müller, 2008b), todavia as contribuições estão mais direcionadas para uma sobreposição de temas, sem uma maior construção teórica tida como necessária, que seria baseada na inserção de práticas relacionadas a todas as dimensões da sustentabilidade. Considerando esta perspectiva, existe disseminado atualmente o conceito de Sustainable Supply Chain Management (SSCM), aqui traduzido como Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento (SCS), que busca a realização desta aproximação, todavia exige que novas lentes teóricas sejam utilizadas para contribuir com as evoluções do tema, ou seja, estimula-se dar um passo para trás, entender o que se propõe, e continuar caminhando.

Com tais considerações, o objetivo do artigo é analisar as possibilidades de intersecção entre Sustentabilidade e Cadeia de Suprimento no sentido de discutir a aplicabilidade dessas abordagens de forma integrada no âmbito organizacional, a partir de uma agenda de pesquisa. Para tanto, o estudo caracteriza-se como ensaio teórico, pois não se restringe a analisar o que a literatura versa sobre o assunto, mas configura-se como uma escrita reflexiva que busca estabelecer relações, convergir pensamentos e propor questionamentos que enriquecem o debate do assunto (Meneghetti, 2011). Considerando que as temáticas selecionadas para a construção deste estudo possuem considerável amplitude, entende-se que a utilização dessa abordagem busca contribuir com uma visão mais clara e efetiva sobre tais discussões.

Como forma de melhor entendimento da proposta, o artigo está organizado em cinco partes distintas além desta introdutória, a partir da seguinte sequência: uma visão sobre sustentabilidade, uma discussão sobre relacionamentos interorganizacional e cadeia de suprimento, a apresentação de como se tem estudado o tema até então, ao se questionar se existe de fato relação completa entre os mesmos, a realização de reflexões e aproximações entre os temas e, por fim, a apresentação das considerações finais. Com isso, percebe-se que a discussão apresenta uma contribuição positiva para os estudos a serem realizados sobre os conceitos, uma vez que a partir do entendimento de suas origens e convergências, torna-se facilitado a construção de discussões mais consistentes.

2. Sustentabilidade: contradições e contribuições

Os debates sobre as mudanças que ocorrem em todo o ambiente mundial vêm sendo realizados a mais de três décadas e em suas pautas estão sempre a relação entre o homem e o meio, na qual uma interação mútua pode ser observada. Com a evolução de discussões e a partir de um conjunto de conferências mundiais realizadas, a essa preocupação com os impactos denominou-se desenvolvimento sustentável (DS). Para Hopwood, Mellor e O'Brien (2005), a ideia de DS é resultado de uma consciência crescente dos problemas ambientais e socioeconômicos globais. Segundo Lelé (1991), é uma temática que não pode ser considerada como oximoro intelectual, mas que necessita uma base teórica consistente que balize as discussões sobre o tema (Fergus & Rowney, 2005a; 2005b; Lelé, 1991).

De acordo com Banerjee (2003), o desenvolvimento sustentável é uma tentativa de reconciliar interesses opostos, visando benefícios econômicos e ambientais simultaneamente. O que é uma contradição, segundo o autor, porque o sustentável e o desenvolvimento são baseados em suposições incompatíveis. Em contrapartida, para Lelé (1991) essa contradição não pode ser ressaltada, uma vez que seguindo o pensamento dos economistas neoclássicos a ideia de desenvolvimento relaciona-se com a ampliação do bem-estar social, e não a má interpretação que tem recebido, a qual se deslocou para a ideia de crescimento econômico. Com essa noção, como apresentado no Relatório de Brundtland, entende-se que:

Desenvolvimento sustentável é um processo de mudança na qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico, e a mudança institucional estão todos em harmonia e aumentando o potencial atual e futuro em atender as necessidades e aspirações humanas (World Commission on Environment and Development [WCED], 1987, n.p.).

Segundo o relatório, essas necessidades e aspirações estariam relacionadas à pobreza mundial, o que poderia ser modificado por uma nova organização tecnológica e social (WCED, 1987). No entanto, uma consideração deve ser realizada: os pobres dependem do biofísico, e a noção de conservação e proteção inerente aos países desenvolvidos pode ser contestada em países em desenvolvimento (Banerjee, 2003), então se questiona haver uma discussão sobre um DS mundial. Para Banerjee (2003), a sustentabilidade significa coisas diferentes para pessoas diferentes, assim um questionamento que pode ser feito é: não estariam as proposições de desenvolvimento sustentável submetidas as necessidades de um crescimento econômico imposto a partir de uma visão colonialista?

Tal questionamento mostra-se pertinente, pois na discussão sobre DS não se sabe para quem se busca um desenvolver sustentável. Nesse sentido, entende-se ser necessária a criação de uma visão própria para cada realidade vivenciada, sem que haja submissão a uma ideia dominadora e silenciadora. O que se alinha, por exemplo, ao pensamento de Dussel (2003), o qual indica o surgimento de um contradiscurso Latino-americano, que não se submete as imposições hegemônicas continuamente apresentadas. Apesar de considerar a possibilidade de discussão sob um campo crítico a partir da busca de uma identidade local sobre diferentes temas, observam-se as diferentes visões de Hopwood, Mellor e O'Brien (2005).

Como argumentam esses autores, existem linhas de pensamento em um continuum, as quais demonstram a possibilidade de deslocamento de perspectivas que vão desde aquela que apesar de querer alguma mudança não acreditam que os problemas atuais sejam insuperáveis, os que permanecem no status quo, passando pelos reformistas – com mudanças pontuais, até aqueles que discutem um pensamento de transformação de ações, havendo maior preocupação com o bem-estar humano e o meio ambiente. Assume-se aqui um pensamento mais voltado para uma transformação total, no entanto como ainda existe muita resistência sobre essa visão, busca-se a partir do contexto do status quo, contribuir com discussões que possam em certo período de tempo alcançar a mudança esperada.

Considerando essa perspectiva, principalmente em relação ao Triple Bottom Line – TBL, as definições sobre como abordar a sustentabilidade em determinada área de estudo deve considerar: as singularidades do tema, a possibilidade de interação entre as abordagens e a busca por uma consistência dentro do contexto de pesquisa. Assim, à medida que são diferentes as atuações dos atores sociais que podem contribuir para a sustentabilidade, surgem como uma perspectiva de análise positiva salientar o que pode ser trabalhado para uma mudança na maneira que se realizam aproximações entre os campos de pesquisa, assim como nas ações práticas que podem ser realizadas quando se observam as dinâmicas da sociedade. Portanto, assume-se aqui que as organizações possuem uma contribuição, individualmente e dentro de formatos de relacionamento.

3. Relacionamentos Interorganizacionais e Cadeia de Suprimento

Em meio às influências de muitas pressões que são identificadas na atual dinâmica de mercado, cada vez mais as organizações necessitam se posicionar, seja como respostas ao que lhe vem sendo imposto, seja assumindo um comportamento de pró-atividade na busca por uma melhor alternativa de sobrevivência (Oliver, 1991). Para Parmigiani e Rivera-Santos (2011), alguns acadêmicos tradicionais indicam que um relacionamento interorganizacional facilita o alcance de maior eficiência e de recursos valiosos, noutra perspectiva observando as parcerias que são criadas, destaca-se que as atividades são mais eficazes e que as relações interorganizacionais e interpessoais são reforçadas. Apesar dessa noção, ao se considerar sua construção teórica como heterogênea, são necessárias explicações mais claras sobre essas em meio as interações de mercado (Oliver, 1991; Parmigiani & Rivera-Santos, 2011).

As discussões sobre o tema têm suas origens mais consistentes dentro do contexto de dinâmica econômica, no entanto como destacou Granovetter (1985) as ações econômicas estão envolvidas com a estrutura de relações sociais que representam o mercado. De acordo com o autor, as relações sociais contínuas contribuem para um maior entrelaçar de relações entre as instituições que compõem uma estrutura social. Com isso, a formação desses relacionamentos é influenciada por alguns determinantes, os quais segundo Oliver (1991) podem ser definidos como: necessidade, assimetria, reciprocidade, eficiência, estabilidade e legitimidade, os quais são contingenciais e assumidos em relação ao que apresenta o mercado.

Segundo a autora, normalmente os relacionamentos de uma organização com outras advém de múltiplas contingências, as quais explicam o porquê as organizações escolhem entrar em um determinado tipo de relacionamento. Para tanto, surge a importância de se observar as fronteiras organizacionais, as quais são entendidas por Santos e Eisenhadt (2005) como demarcações das estruturas sociais. São consideradas como fronteiras: a eficiência, o poder, a competência e a identidade. Como destacam Santos e Eisenhadt (2005) criar uma visão mais relacional entre esses conceitos contribui para o entendimento melhor da posição organizacional no mercado. Se tais fronteiras forem consideradas na formação de diferentes tipos de relacionamento, a interação entre várias organizações se torna facilitada.

Como se observa, tais relacionamentos surgem como basilares para a continuidade das organizações, as quais são formadas de diversas maneiras e com diferentes abordagens, dentre as quais o relacionamento vertical, denominado de cadeia de suprimento (Parmigiani & Rivera-Santos, 2011). De acordo com Burgess, Singh e Koroglu (2006), existe pouco consenso sobre o conceito utilizado para se estudar cadeia de suprimento, sendo esta entendida ainda como uma disciplina muito fragmentada (Giunipero, Hooker, Joseph-Matthews, Yoon & Brudvig, 2008). No entanto, assume-se cadeia de suprimento como um conjunto de três ou mais entidades (organizações ou indivíduos) diretamente envolvido com os fluxos de produtos, serviços, finanças e/ou informações, do recurso até o consumidor final (Mentzer et al., 2001).

Segundo Mentzer et al. (2001), a cadeia de suprimento pode ser observada como um fenômeno que existe nos negócios, mas que necessita ser gerido, por isso utiliza-se o termo Gestão da Cadeia de Suprimento, para lidar com pesquisas inerentes a esse relacionamento interorganizacional. Apesar dessas delimitações, está clara a necessidade de maior aprofundamento teórico desse conceito, no qual se ratifica a necessidade de se ultrapassar o obstáculo das operações e aprimorar as discussões sobre o tema (Burgess, Singh & Koroglu, 2006). Isso se torna possível a partir da utilização de certos "tipos" de teorias, ou mesmo, pela realização de pesquisas com uma abordagem multi teórica (Giunipero, Hooker, Joseph-Matthews, Yoon & Brudvig, 2008). Assim, para este ensaio define-se gestão da cadeia de suprimento como:

A coordenação sistemática e estratégica das funções empresariais tradicionais e das táticas empresariais, dentro de uma empresa específica, e através dos negócios dentro de uma cadeia de suprimento, com o objetivo de melhorar o desempenho em longo prazo das empresas individuais e da cadeia de suprimento como um todo (Mentzer et al., 2001, p.18).

Essa é considerada por Burgess, Singh e Korglu (2006) a definição mais clara para o tema, apesar de haver algumas inconsistências na construção teórica do conceito. Segundo os autores pela falta de consistência teórica existente em relação ao conceito em si, deve-se buscar ultrapassar o obstáculo em relação às operações, que recebe maior foco nas pesquisas sobre o tema, e buscar adequar outras visões como a estratégica e aquela relacionada aos estudos organizacionais. Em contrapartida, Giunipero, Hooker, Joseph-Matthews, Yoon e Brudvig (2008) afirmam que diferente do que foi argumentado por esses autores, a questão estratégia obteve um salto de pesquisas no começo deste século, necessitando assim de outros aprofundamentos. Vale ressaltar que para Burgess, Singh e Korglu (2006) o termo gestão da cadeia de suprimento já está consolidado na teoria, o que falta é uma maior consistências em sua base teórica de discussão enquanto tema individual e em suas relações com os demais, como é o caso da sustentabilidade.

4. Sustentabilidade e Cadeia de Suprimento: o que se discute hoje?

Observando-se as origens e como os temas separadamente vêm sendo trabalhos em seus campos de atuação, criar um perfil de como os mesmos estão sendo trabalhados surge como pressuposto para melhor aproximá-los. Isso é necessário, pois como apresentam Seuring e Müller (2008a), o alcance da sustentabilidade e de uma gestão da cadeia de suprimento sustentável, tem sido assumido como um objetivo secundário, pois os conceitos são discutidos separadamente, não se demonstrando como eles se completam. Essa ideia é ratificada por Gold, Seuring e Beske (2010) à medida que esses indicam a existência limitada de uma literatura que englobe os temas.

No momento atual de discussões, o termo mais disseminado é Sustainable Supply Chain Management (SSCM) que pode ser traduzido como Gestão da Cadeia de Suprimento Sustentável (GCSS), ou Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento (SCS), tradução aqui utilizada. Como apresentam Ashby, Leat e Hudson-Smith (2012), as discussões iniciais sob essa perspectiva apontam o ano de 2003, mas apenas em 2008 uma gama maior de artigos foi sendo publicada sobre o conceito. Para Carter e Easton (2011) a discussão teve maior crescimento, pois a Sustentabilidade após se tornar um grande chavão no mundo empresarial pode ser observada como uma licença de negócios para o século XXI. Apesar desta visão puramente mercantilizada e limitada, a mesma não é observada como a mais disseminada entre os pesquisadores do tema.

As discussões atuais não aprofundam seu conhecimento na busca por entender como criar cadeias verdadeiramente sustentáveis (Pagell & Schevchenko, 2014). Como se pode observar na literatura, Ver Tabela 1, vários autores que trabalham a relação com a cadeia de suprimento, entendem Sustentabilidade a partir do Triple Bottom Line - TBL (Ashby, Leat & Hudson-Smith, 2012; Bommel, 2011; Carter & Rogers, 2008; Pagell & Wu, 2009; Seuring & Müller, 2008a; 2008b) o qual busca por meio da apropriação da sustentabilidade ao contexto empresarial, alinhar as dimensões social, econômica e ambiental visando uma maior contribuição do ator empresa à mudança, seguindo a ideia de valor coletivo compartilhado.

Tabela 1: Definições de Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento

Autores

Ano da publicação

Definições

Jorgensen e Knudsen

2006

Os meios pelos quais as empresas a gerenciar suas responsabilidades sociais em todo processo de produção abrangendo as fronteiras organizacionais e geográficas.

Carter e Rogers

2008

Integração transparente e estratégica e a relação de metas econômicas, sociais e ambientais de organizações na coordenação sistêmica de processos chaves de negócios interorganizacionais para melhorar o desempenho econômico ao longo prazo da empresa individual e sua cadeia de suprimento.

Seuring e Muller

2008

A gestão de material, informações e fluxo de capital, bem como a cooperação entre as empresas ao longo da cadeia de suprimento, com objetivos de todas as dimensões da sustentabilidade (econômico, social e ambiental), em relação ao requerido por consumidores e demais stakeholders.

Seuring

2008

A integração entre a sustentabilidade e a gestão da cadeia de suprimento [em que] pela fusão desses dois conceitos os aspectos ambientais e sociais ao longo da cadeia de suprimento devem ser levados em consideração, evitando problemas relacionados, mas também olhando produtos e processos mais sustentáveis.

Ciliberti et al.

2008

A gestão da cadeia de suprimento onde todas as dimensões da sustentabilidade, nomeadamente a econômica, ambiental e social são levadas em consideração.

Font e outros

2008

Adicionar a sustentabilidade para os processos da gestão da cadeia de suprimento considerando os impactos ambientais, sociais e econômicos das atividades empresariais.

Pagell e Wu

2009

Ações gerenciais específicas realizadas para tornar a cadeia de suprimento mais sustentável, com o objetivo final de criar uma cadeia verdadeiramente sustentável.

Badurdeen etal.

2009

Envolvimento das atividades de planejamento e gestão de recursos, aquisição, conversão e atividades logísticas, envolvidos durante a pré-produção, produção, uso e pós-uso no ciclo de vida fechado a partir de múltiplos ciclos de vida com compartilhamento de informações transparentes sobre todas as fases entre as empresas, considerando explicitamente as implicações sociais e ambientais para alcançar uma visão compartilhada.

Haake e Seuring

2009

Conjunto de políticas, ações e relações formadas na gestão da cadeia de suprimento em resposta as preocupações relacionadas ao ambiente natural e as questões sociais em relação ao design, aquisição, produção, distribuição, utilização, reutilização e descarte de produtos e serviços de uma empresa.

Wolf

2011

O grau em que uma empresa colabora estrategicamente com seus parceiros da cadeia de suprimento e deforma colaborativa gerencia processos intra e inter- organizacionais para a sustentabilidade.

Wittstruck e Teuteberg

2011

A extensão da gestão de cadeia de suprimento tradicional ao se adicionar aspectos ambientais e sócio-éticos.

Ahi e Searcy

2013

A criação da coordenação na cadeia de suprimento por meio da integração voluntária de aspectos econômicos, sociais e ambientais com o desing de sistemas de negócios interorganizacionais chave para efetivamente e eficientemente gerenciar materiais, informações e fluxo de capitais associados com aquisição, produção e distribuição de produtos e serviços, levando em consideração os requisitos dos stakeholders e a melhoria de lucratividade, competitividade e resiliência das organizações em curto e longo prazo.

Fonte: Adaptado de Ahi & Searcy (2013)

Considerando o quadro apresentada e as discussões atuais. Uma análise individual dos temas pode ser realizada. Em relação à cadeia de suprimento, Carter e Rogers (2008) destacam a existência de pouca consistência teórica, o que ressalta o que foi apresentado anteriormente, entendendo-se a cadeia de acordo com a filosofia do negócio e como se integram os atores entre o ponto de origem e consumo (Linton, Klassen & Jayaraman, 2007; Svensson, 2007). No entanto, Svensson (2007) ressalta a necessidade de se observar aspectos além da restrição direta que se faz à visão vertical, trabalhando ainda com aspectos horizontais. Nesse sentido, Bommel (2011) indica que as cadeias de suprimento na realidade não são cadeias lineares, mas redes complexas com links entre diferentes autores, por esse motivo o autor trabalha com a perspectiva de supply network, utilizando uma perspectiva de cadeia-rede.

A partir dessas visões macro, percebe-se que lidar com conceitos amplos como são a sustentabilidade e a cadeia de suprimento, exige uma observação complexa de como integrar as ações desenvolvidas pela área de gestão e as necessidades e aspirações que uma mudança de pensamento por um desenvolvimento sustentável (Linton, Klassen & Jayaraman, 2007). Corroborando a afirmação, Ashby, Leat e Hudson-Smith (2012) indicam esses conceitos como implicitamente exigindo uma visão holística e integrada, o que representa as limitações observadas atualmente. Isso se relaciona com a falta de conhecimento consistente sobre os conceitos, principalmente na busca por uma construção teórica (Wolf, 2011).

Para Carter e Easton (2011), de todos os artigos analisados em sua pesquisa, entre 1991-2000 nenhum artigo foi trabalhado sobre sustentabilidade; entre 2001-2010 começou-se a trabalhar com Responsabilidade Social empresarial (RSE) (18,75%); e entre 2001-2010 apenas 25% dos artigos analisados usam propriamente a sustentabilidade. Essa visão havia sido apresentada por Carter e Rogers (2008) quando os autores comentam que as definições de sustentabilidade têm preocupações econômicas e ambientais, bem como conceituações de RSE buscando alinhar as questões sociais e ambientais. De todas as informações, pode-se destacar que raras são as discussões que conseguem a visão completa da sustentabilidade.

Num entendimento completo de como se pesquisa atualmente a sustentabilidade em relação à gestão da cadeia de suprimento, tomam-se como base os artigos publicados por Pagell e Wu (2009), no qual seria necessário observar três vertentes de atuação: (1) existência de melhores práticas; (2) reconceituação de toda a cadeia; e (3) integração entre elos da cadeia; e por Seuring e Muller (2008b): (1) gestão dos fornecedores para avaliação de risco e de desempenho; e (2) gestão da cadeia de suprimento para produtos sustentáveis. No entanto, tais características tem maior foco no aspecto operacional. Com o avanço das discussões, Beske, Land e Seuring (2014) e Beske e Seuring (2014) já trazem discussões sobre uma abordagem mais estratégica. Outra alternativa de discussão envolve uma maior integração do tema SCS com a essência da organização, possível a partir dos estudos organizacionais.

5. Sustentabilidade em Cadeias de Suprimento (SCS)

Para uma compreensão mais clara da relação entre a sustentabilidade e a gestão da cadeia de suprimento, Halldórsson, Kotzab e Skjøtt-Larsen (2009) discutem a existência de três abordagens: (1) uma estratégia integrada, na qual a sustentabilidade é consistente com a visão de GCS; (2) uma estratégia de alinhamento, na qual a sustentabilidade é vista como complementar ao foco da cadeia tradicional, em relação aos custos e serviços; e (3) uma estratégia de substituição, na qual o conceito tradicional de GCS é substituído por uma abordagem alternativa em relação aos aspectos sociais e ambientais. De todas essas visões, percebe-se que grande parte das pesquisas foca a segunda abordagem, poucas a primeira e a terceira ainda não é observada.

Em sua pesquisa Carter e Rogers (2008) questionam: Como o termo sustentabilidade pode ser definido e aplicado à gestão da cadeia de suprimento? Nesse ponto, Halldórsson, Kotzab e Skjøtt-Larsen (2009) conseguem demonstrar possíveis vertentes de atuação. Para este ensaio assume-se a primeira como aquela norteadora da discussão que segue, pois se entende que a integração entre os termos é a melhor das opções. Vale salientar que para isso assumem-se também as visões inerentes a cada um dos temas, a sustentabilidade enquanto um valor coletivo e a gestão da cadeia de suprimento como um tema que pode ser melhor trabalhado, uma vez que é possível reduzir o foco puramente econômico atribuído às suas origens, por não ser algo rigidamente definido buscando-se contribuição direta para a sustentabilidade (Burgess, Singh & Koroglu, 2006).

No contexto brasileiro ainda são poucas as pesquisas que assumem o conceito do TBL totalmente (Brito & Berardi, 2010; Carvalho & Barbieri, 2013; Gonçalves-Dias, Labegalini & Csillag, 2012), na busca por se criar um entendimento nacional sobre o tema. Alguns desses autores buscam trabalhar com o Triple Bottom Line, bem como na interação de diferentes atores (multistakeholders) como influenciadores na estrutura da cadeia, mesmo que em certos momentos não fique clara a integração entre dimensões. Existem outros autores que se propõem a trabalhar com o tema, mas que realizam confusões entre conceitos e muitas vezes pesquisam logística reversa, gestão ambiental e cadeia de suprimento verde como sinônimos de GCSS, o que se sabe não poder ser desta maneira, como discutem Silva et al. (2015).

Com isso, para Brito e Berardi (2010), Gonçalves-Dias, Labegalini e Csillag (2012) e Silva et al. (2015), pesquisas nacionais não possuem foco na cadeia e nos relacionamentos como um todo, apenas em aspectos pontuais de operações, por tal motivo opta-se para a discussão a partir de uma integração. Apesar dessas limitações, percebe-se que aos poucos o tema vem se aprofundando no Brasil no sentido de entender os motivadores para a inserção de estratégias sustentáveis ao longo das cadeias. Segundo Gonçalves-Dias, Labegalini e Csillag (2012, p.529) "é preciso dar ênfase à realidade do país, ressaltar inovações genuinamente brasileiras, [...] e sobre iniciativas práticas ainda não sistematizadas pela academia". Essa perspectiva abre campo de pesquisa nacional, que pode a partir de uma visão crítica, demonstrar um discurso próprio a partir de suas especificidades.

Griesse (2007) argumenta que para a melhor construção de interações entre organizações no mercado, pelo Brasil ser considerado como multifacetado, devem ser observadas: a diversidade geográfica, as desigualdades nas questões socioeconômicas, e as tendências atuais da política e da economia, os quais tendem a adaptações nas práticas que são desenvolvidas nas cadeias de suprimento a depender das características que as circundam. Ao se considerar esta reflexão, pode-se retomar um questionamento realizado por Sharma e Ruud (2003), estaria a sustentabilidade nas cadeias de suprimento condicionadas a grupos ou redes de organizações em uma mesma região geográfica, fragmentando-se as cadeias globais? Tal ideia considera a necessidade de uma repensar os motivos para esta estratégia.

Em meio a uma perspectiva de apreensão sobre o que melhor poderia representar as práticas de sustentabilidade, principalmente trazendo o foco para um país emergente, assume-se que um maior destaque pode ser considerado sobre os aspectos sociais. Isso ocorre, pois como apresentado anteriormente, poucas são as pesquisas que consideram a dimensão social em si, bem como que observam o conjunto de desigualdades e assimetrias existentes. De acordo com Ashby, Leat e Hudson-Smith (2012), um dos motivos para essa condição limitada de pesquisa pode estar na natureza humana da dimensão. Apesar disso, Sharma e Ruud (2003) e Seuring e Müller (2008b) discutem a necessidade de integração e inserção desta dimensão social no discurso sobre GCSS, no sentido de deixar claro o TBL.

Para tanto, entende-se que há necessariamente que haver uma interação das relações e estruturas sociais consideradas com um processo de institucionalização de práticas voltadas para a sustentabilidade, as quais podem ser bem verificadas com relação a responsabilidade social empresarial e o desenvolvimento de ações e práticas que influenciam a comunidade, em diferentes áreas como educação, por exemplo (Ciliberti, Pontrandolfo & Scozzi, 2008). Assim, para Hutchins e Sutherland (2008), deve-se considerar a identificação das fronteiras que circundam a avaliação do impacto social resultante da interação entre empresas e seus fornecedores, dentre outras ações. Isso contribuiria para que houvesse um estreitamento entre as relações sociais, facilitando assim o surgimento da sustentabilidade.

Uma das melhores maneiras de repensar a intersecção entre os temas, está em entender que diferentes aspectos devem ser observados, os quais devem ser tidos como estímulos à mudança por novos papéis, nova estrutura, novas relações, essenciais para este contexto de discussão (Fabbe-Costes, Roussat & Colin, 2011). Existem diferentes formas de lidar com esta aproximação. Para Ketchen e Hult (2007), uma dessas dá-se a partir da inserção de teorias organizacionais no campo de operações e cadeias de suprimento, para melhor compreensão do relacionamento e, por conseguinte, assume-se a possibilidade de integração com a sustentabilidade. São muitas as discussões realizadas nesse sentido, mesmo que a utilização das teorias não seja tão extensiva (Ver Tabela 2) (Ketchen & Hult, 2007; Parmigiani & Rivera-Santos, 2011). Para Gold, Seuring e Beske (2010), pesquisas relacionadas com teorias organizacionais podem contribuir para um melhor entendimento de processos interorganizacionais.

Tabela 2: Abordagens teóricas em Relacionamentos Interorganizacionais (RIOs)

Economia Organizacional

Teoria dos Custos de Transação

RIOs como estruturas de governança híbridas que  compartilham características de acordo com os mercados e hierarquias que influenciam nos custos de transação.

Resource-Based View

Para a abordagem, os RIOs facilitam a obtenção de recursos complementares as atividades da organização, no qual o acesso torna-se mais rápido para sua identificação.

Teoria da Agência

As firmas usam RIOs para alinhar incentivos entre princípios e agentes quando a propriedade e o controle são separados.

Teoria Organizacional

Teoria da Dependência de Recursos

A teoria enfatiza o poder e a dependência como motivadores para a formação de RIOs, melhorando a parceria entre atores como competidores, legisladores e outros.

Teoria dos Stakeholders

De acordo com os preceitos da teoria, para a formação de RIOs, o papel do gestão está em balancear os interesses dos stakeholders, em relação a legitimidade e poder, por exemplo.

Teoria Institucional

A legitimidade e outros tipos de resultados simbólicos são considerados pela teoria na formação de RIOs, considerando que as ações organizacionais são socialmente construídas.

Redes Sociais

Enfatiza-se nesta teoria a posição de uma organização em relação a sua estrutura social em relação aos laços que são criados pela rede criada juntamente com o RIO.

Fonte: Adaptado de Parmigiani & Rivera-Santos (2011)

No contexto da sustentabilidade, sua aproximação com os estudos organizacionais tem sido realizada de algumas formas. Para Munk e Souza (2011, p. 236), "as abordagens organizacionais contribuem para o desenvolvimento sustentável seja analisado pelas mesmas como fenômeno de investigação desde que permissivas de uma integração paradigmática, epistemológica e teórica possibilitadas pelo paradigma da sustentabilidade". Existem algumas pesquisas envolvendo as teorias organizacionais que vão desde a Teoria dos Stakeholders, Teoria do Agir Organizacional, e mais recentemente com o foco na Teoria Institucional (Munk, Souza & Silva, 2012; Trevisan & Pedrozo, 2010). Para além dessas teorias, a utilização da abordagem de redes sócias, tanto a partir de seus aspectos teóricos como analítico torna-se uma possibilidade de área de pesquisa contributiva para o avanço de discussões sobre a temática.

6. SCS: uma proposta de Agenda

Considerando as discussões até aqui realizadas, bem como compreendendo a emergência que a temática tem para o contexto atual de publicações, principalmente em âmbito internacional, entende-se que uma agenda de pesquisa pode ser desenvolvida no sentido de melhor contribuir para que o país avance nas discussões sobre o tema. Quando se discute o contexto brasileiro, de acordo com revisões de literatura realizadas, fica claro que existem poucas publicações de alto impacto sobre o tema tanto nas grandes conferências acadêmicas nacionais que tem abordado o tema como em periódicos com alta rotatividade nacional (Silva et al., 2015), mesmo assim percebe-se uma grande tendência para avanços. Segundo esses autores, foram identificados 36 artigos em eventos acadêmicos e 7 artigos em periódicos com Qualis A2, B1 e B2.

Este levantamento demonstra o perfil das publicações nacionais de 2008 a 2014, o que ratifica o desenvolvimento da presente pesquisa. Ainda no campo das publicações acadêmicas sobre o tema, podem ser ressaltadas: (1) a tese de doutoramento de André Carvalho na FGV-SP em 2012, sob orientação do professor José Carlos Barbieri; e (2) a tese de doutoramento de Etienne Abdala na FGV-SP em 2013, sob a mesma orientação. Esta informação está em consonância com Silva et al. (2015), quando esses indicam que a FGV tem assumido relevância no contexto nacional. Além disso, os autores ressaltam que o grupo da UFRGS tem avançado na área. Atualmente estão sendo realizadas pesquisas que seguem esta vertente. Assim, podem ser ressaltadas: (1) uma tese de doutoramento de Daiane Neutzling; e (1) uma dissertação de mestrado de Ana Paula Alves, ambas apresentadas em 2014, sob orientação do professor Luis Felipe Nascimento.

As pesquisas até então realizadas estão em consonância com o que vem sendo desenvolvido em pesquisas internacionais, podendo ser utilizadas como referências interessantes, no entanto novas abordagens podem ser ressaltadas. De acordo com Pagell e Schevchenko (2014), apesar de uma boa quantidade de publicações que integram sustentabilidade e cadeia de suprimento, o que se tem publicado não facilita a compreensão de cadeias verdadeiramente sustentáveis. Para os autores atualmente existe um conjunto de confusões e/ou sobreposições que tem tratado os temas como os mesmos, ou ainda não tem dado a devida relevância que o conceito de Sustentabilidade na Cadeia de Suprimento possui para os pesquisadores da área de Operações e Estratégia, principalmente. Tal argumento está em total consonância com a citação inicial deste artigo, na qual repensar a interação até então realizada pode se tornar o melhor caminho.

Para tanto, Pagell e Schevchenko (2014) indicam que os pesquisadores do tema devem considerar no desenvolvimento de suas pesquisas cinco fatores críticos até então pouco observados: (1) foco na redução do dano e não na eliminação deste; (2) visão limitada de stakeholders – tem-se atualmente primazia para os retornos financeiros (lucro); (3) foco no que é familiar; (4) limites do empirismo em relação ao que vem sendo praticado; (5) mensuração dos impactos da/na cadeia de suprimento. Considerando que esta discussão emerge como um ponto de reflexão sobre o que vem sendo publicado sobre a temática, é necessário que os pesquisadores brasileiros adentrem em tal discussão e consigam compreender suas pesquisas da forma mais contributiva possível. Tal lógica relaciona-se diretamente com escolhas teóricas e metodológicas que podem ser utilizadas.

Dentre da vertente teórica, o reconhecimento do que vem sendo publicado é imprescindível e necessário para todos que pesquisam ou irão pesquisar sobre o tema. Assim, a discussão antes realizada pode contribuir para reflexões no contexto nacional, principalmente no que se refere a ideia de aproximação com os relacionamentos e o que se compreende por organização. Além disso, indica-se interessante a análise da proposta apresentada por Beske e Seuring (2014) que sob uma vertente reflexiva de impactos sobre o tema trazem uma vertente mais operacional, sem esquecer a discussão estratégica, o que pode facilitar o desenvolvimento de novas pesquisas, desde o que se entende sobre o tema (enquanto conceituação) até a como se pode pesquisar sobre.

Alinhado a esta discussão, pode-se refletir sobre aspectos metodológicos que contribuem para a evolução da temática no Brasil. Segundo Silva et al. (2015), a maior parte dos artigos teve como foco metodológico a realização de estudos de caso, um total de 19 artigos identificados. Em seguida artigos conceitual/teórico, 13 artigos. Nenhuma outra metodologia até então foi utilizada. Seguindo o que se tem discutido pelos principais autores do tema, o estudo de caso é sim uma boa alternativa de pesquisa. Para Seuring (2011) esta é uma estratégia para pesquisas exploratórias para reconhecimento do campo. Já para Pagell e Schevchenko (2014) esta pode se tornar a principal estratégia metodológica de pesquisa, no entanto com a utilização de técnicas de validação e a observação efetiva dos cinco fatores críticos anteriormente apresentados.

Para esses autores, pode-se utilizar como central pesquisas mais participativas, que indiquem maior ação e reconhecimento de informações do caso, identificando aspectos que uma pesquisa quantitativa pode não conseguir alcançar. Deve-se buscar as especificidades, o que é imprescindível para o contexto brasileiro considerando a dimensionalidade continental existente em seu território. Propõe-se a ampliação de discussões qualitativas para o tema, em relação ao que vem sendo publicado. Assim, para um amadurecimento efetivo da área, técnicas outras podem ser incorporadas e podem contribuir com o avanço desses temas. A partir de todas essas considerações, entende-se que existe uma grande possibilidade de novas pesquisas e projetos desenvolvidos nesta seara, o que pode facilitar a inserção de discussões brasileiras no contexto mundial.

7. Considerações Finais

Como apresentado ao longo de toda a presente discussão teórica, são diferentes as características que devem ser consideradas na construção de uma ideia aproximada entre sustentabilidade e cadeia de suprimento. Percebe-se que para o desenvolvimento do tema diferentes ênfases podem ser realizadas, as quais devem observar quais as especificidades e demandas que dadas localidades possuem em relação ao que está sendo praticado. Verificou-se que existe uma escassez de pesquisas com relação à dimensão social da sustentabilidade que de forma alinhada com as demais necessita ser desenvolvida e considerar os impactos que são gerados a partir das práticas empresariais observadas, individualmente ou em parceria. Com isso, para esta discussão, mesmo que a ênfase tenha sido em aspectos sociais, não se desconsidera a necessidade e a atuação de ações econômicas e ambientais.

Com essas considerações, não se tem a pretensão de demonstrar a efetiva e única forma de observar a relação, mas busca-se estimular reflexões sobre o tema num sentido efetivo: o que se discute até então segue um caminho consistente? Ao longo de todo o ensaio, buscou-se demonstrar que existe certo nível de consistência em grande parte das pesquisas, no entanto é necessário que haja um aprofundamento no alinhamento das questões sociais junto as práticas de sustentabilidade na cadeia, possível inicialmente por meio de estratégias metodológicas flexíveis, o que demanda maior esforço do que se tem discutido em ampliar o escopo de discussão e não apenas indicar a falta de profundidade nesta dimensão. Além disso, ao buscar apresentar uma maior proximidade com as atuais discussões, é possível direcionar para novas inter-relações teóricas.

Assim sendo, percebe-se que o objetivo proposto obteve êxito de análise, na medida em que por meio de uma reflexão sobre os dois temas em sua origem e o entendimento aproximado entre estes, foi possível compreender como o tema vem sendo abordado no Brasil, bem como ressaltar a necessidade de maiores estudos que considerem tanto a ideia de especificidades locais quanto a perspectiva da dimensão social como maior contributiva para a sustentabilidade em cadeia de suprimento, a partir de uma agenda de pesquisa. Toma-se como limite de discussão, estudar apenas a relação direta entre os temas, mesmo que a mesma ainda seja incipiente no Brasil, no entanto, identifica-se uma contribuição positiva à medida que se estimula o desenvolvimento de novas discussões que considerem a ideia de Sustentabilidade na Cadeia de Suprimento.

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Vol. 37 (Nº 04) Año 2016

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