Espacios. Vol. 37 (Nº 01) Año 2016. Pág. 15

Relação Empresa-Universidade e a Transferência de Tecnologia: O Caso da BASF S/A

Relationship Enterprise-University and Technology Transfer: The Case of BASF S / A

Myller Augusto Santos GOMES 1; Angélica Biagi BERTOCCO 2

Recibido: 25/08/15 • Aprobado: 09/10/2015


Contenido

Introdução

1. Referencial Teórico

2. Procedimentos Metodológicos

3. Análise e discussão dos resultados

4. Considerações Finais

5. Referências


RESUMO:

O presente trabalho tem como objetivo identificar de que forma ocorre o processo de transferência de tecnologia, realizados entre empresa e universidade, pontualmente relatados por participantes diretamente envolvidos no processo. Através de estudo de caso descritivo, esta pesquisa busca descrever as ações e responsabilidades dos atores envolvidos no processo, a forma de atuação de cada uma das instituições envolvidas. Os resultados encontrados, apresenta a forma de como os mecanismos de transferência de tecnologia são valorados e apoiados pelas instituições envolvidas, desde a geração de conhecimento até a aplicabilidade de resultados efetivos e eficientes no meio produtivo.
Palavras-Chaves: Tecnologia, Relação Universidade-Empresa, transferência de tecnologia

ABSTRACT:

This paper aims to identify how is the process of technology transfer, held between company and university, promptly reported by participants directly involved in the process. A descriptive case study, this research seeks to describe the actions and responsibilities of the actors involved in the process, the form of action of each of the institutions involved. The results, presented as the form of technology transfer mechanisms are valued and supported by the institutions involved, from knowledge generation to the applicability of effective and efficient results in the production environment.
Key Words: technology, Relationship university-industry technology transfer

Introdução

No atual cenário econômico e negocial vivenciado pelas universidades, sociedade e empresas, o desenvolvimento tecnológico acentuado exige destas instituições e dinâmicas, um intenso esforço financeiro e administrativo em busca de melhores soluções que buscam melhores sistemas informacionais, melhores resultados e melhor posicionamento nos mercados onde as mesmas estão inseridas. As inovações tecnológicas tornam-se, além de necessidade, uma prerrogativa básica para o sucesso de qualquer operação. As dinâmicas, a lógica, e principalmente os desafios do relacionamento entre empresa ou iniciativa privada e universidade - principalmente as públicas são tratadas neste estudo empírico.

Através de uma ação empreendedora idealizada e implementada por um docente da Universidade Estadual de Ponta Grossa juntamente com a empresa Basf, construiu-se uma parceria, visando o processamento e o desenvolvimento de sistemas de conhecimento através da realização de experimentos de campo, voltados ao desenvolvimento de produtos com auxílio da comunidade acadêmica vinculada ao setor de ciências agrárias, desta forma, fortalecendo a pesquisa, o ensino e a extensão desta instituição.

Com o intuito de melhor analisar e até certo ponto compreender esta relação sob a perspectiva dos mecanismos de transferência de tecnologia, foram entrevistados três profissionais que atuaram ou atuam diretamente na criação deste relacionamento e estrutura, mais notadamente um Doutor pesquisador e professor da Universidade que se encontra em seus quadros desde 1986, um Doutor pesquisador, professor e administrador da Fazenda-Escola da Universidade, nos quadros da instituição desde 1991 e que atua como administrador da Fazenda-Escola desde 2006, e o responsável-técnico do Campo Experimental Avançado da empresa Basf, que atua a 16 anos na divisão de desenvolvimento de produtos da empresa.

O objetivo deste trabalho é descrever as ações dos atores envolvidos e identificar a existência de transferência de tecnologia, a forma de atuação das partes envolvidas. Devido à peculiaridade desta relação, foram identificadas duas dimensões específicas que procuram compreender e otimizar as vantagens existentes para ambas as partes na implementação e desenvolvimento de um Campo Experimental instalado e operacional dentro de uma estrutura universitária pública.

Com os resultados esperamos contribuir para a pesquisa na área e, mesmo com limitações, ofertar aos órgãos públicos e privados diretamente relacionados possíveis caminhos a serem trilhados para melhores resultados na sociedade.

 

1. Referencial Teórico

1.1. Relação Universidade-Empresa

A relação Universidade-Empresa pode ser definida como:

Um modelo de arranjo interinstitucional entre organizações de natureza fundamentalmente distinta, que podem ter finalidades diferentes e adotar formatos bastante diversos. Inclui-se nesse conceito desde interações tênues e pouco comprometedoras, como o oferecimento de estágios profissionalizantes, até vinculações intensas e extensas, como os grandes programas de pesquisa cooperativa, em que chega a ocorrer repartição de créditos resultantes da comercialização dos seus resultados (PLONSKI, 1992, p. 08).

Para Fujino (2004) o deslocamento do paradigma da sociedade industrial para o da sociedade do conhecimento coloca no centro da discussão o conhecimento e sua gestão, como fatores relacionados à capacidade competitiva das Empresas e países. A necessidade crescente de conhecimentos científicos para alcance do progresso técnico e o encurtamento do ciclo das inovações, vem exigindo dos atores envolvidos no processo de geração e difusão de inovações esforços para intensificar as práticas de cooperação tecnológica.

Conforme Brisolla et al. (1997), uma maior aproximação entre Universidade e setor empresarial não significa o afastamento do Estado. Para Segatto e Sbragia (2002) as relações promovidas pela integração Universidade-Empresa não significam apenas uma troca de relacionamento. Englobam, também, um processo de transferência e transformação de produtos e serviços e objetivam o crescimento da base de conhecimento de ambos os participantes.

Fundamentalmente, as relações Universidade-Empresa podem ser estudadas mediante a análise de dois itens, a intensidade das relações (com respeito ao tamanho dos parceiros, os setores nos quais as relações são desenvolvidas, os países de origem dos parceiros) e suas características, tipos específicos de colaboração, os termos econômicos dos acordos, os campos científicos que são estudados e assim por diante (REIS, 1998).

Na compreensão de Marcovitch (1999) a Pós-Graduação garante a continuidade da missão acadêmica em seu conjunto. Sem uma Pós-Graduação de qualidade, o quadro de pesquisadores não se renova, o conhecimento se torna obsoleto, o nível de ensino cai e os serviços de extensão perdem substância.

Com o processo de cooperação Universidade-Empresa, este possui a capacidade de reunir recursos e potencializar oportunidades, incentivando projetos de inovação para apoiar o desenvolvimento tecnológico (GONÇALO; ZANLUCHI, 2011).

Para Grynszpan (1999) essas iniciativas de interação entre a comunidade universitária e o meio externo, em especial a indústria, resultam em mais uma das atividades de extensão que a Universidade moderna se propõe a desenvolver. Pode-se dizer que há, hoje, uma atitude positiva dos dirigentes universitários e do Governo em geral na cooperação com o meio empresarial.

Com um sinal de concordância, Cezar (2012) explica que já é consenso entre pesquisadores brasileiros que desenvolver soluções inovadoras por meio de parcerias entre Universidade, empresa, setor público, institutos e fundações é o caminho mais efetivo para integrar o mundo corporativo e acadêmico.

1.1.1. A Transferência de tecnologia na relação Universidade-Empresa U-E

Com a proximidade dessas duas instituições, o processo de transferência de tecnologia pode assumir características específicas, dependendo do objetivo desta relação. O primeiro entendimento necessário é acerca da transferência de tecnologia é a contribuição de Parker e Zilberman (1993, p 89).

Qualquer processo pelo qual o conhecimento básico, a informação e as inovações se movem de uma universidade, de um instituto ou de um laboratório governamental para um indivíduo ou para empresas nos setores privados ou semiprivados.

Este processo de transferência de tecnologia assume diversas formas e características peculiares de vinculação, Bonnacorsi e Piccaluga (1994) propõem uma classificação da relação U-E, está utiliza como critérios de categorização o grau de comprometimento de recursos, duração do relacionamento e o tipo de formalização do acordo, conforme se apresenta no quadro abaixo.

Quadro 1. Classificação da relação entre U-E

TIPO

EXEMPLOS

A

Relações pessoais informais

Consultoria individual com professores e acadêmicos, fóruns de integração, workshops, vitrines tecnológicas.

B

Relações pessoais formais

Intercâmbio de pessoal, especialização de funcionários nas universidades.

C

Instituição de ligação

Relação de parceria via terceiros, sob a forma de associações industriais, institutos de pesquisa aplicada.

D

Acordos formais com objetivos específicos

Pesquisas contratadas, treinamentos periódicos, pesquisa cooperativa, desenvolvimento de protótipos e testes

E

Acordos formais com objetivos guarda-chuvas

Sem objetivos específicos; patrocínios da indústria para P&D nos departamentos universitários; doações privadas para a pesquisa.

F

Criação de estruturas próprias para a relação

Parques tecnológicos, incubadoras de empresas, consórcios de pesquisa.

Fonte: Adaptado de Bonnacorsi e Piccaluga (1994).

Para que este processo ocorra de forma efetiva "duas são as condições mínimas para que ocorra uma efetividade no processo de transferência de tecnologia: o Transferidor precisa estar disposto a transferir e o receptor precisa ter condições de absorver o conhecimento transferido" (Takahashi, 2005, p. 256).

A compreensão desde processo está também em suas formas de transferência de tecnologia da universidade para a empresa, considerando: a) atividades de interação: serviços tecnológicos – análises, ensaios, medições, informes técnicos, certificações de conformidade, consultorias, entre outros; b) serviços de capacitação: cursos in company, capacitações, entre outros; c) serviços de informação: busca em base de dados nacionais, internacionais, e em bancos de patentes e de informação tecnológica em geral; d) projetos de P&D: pesquisa básica, pesquisa aplicada, desenvolvimento experimental e outros; e) projetos de incubadoras de empresas; f) projetos de empresas Júnior: consultoria e prestação de serviço e transferência de conhecimentos por meio de Licenciamento de Títulos de Propriedade Intelectual: patentes, software, transferência de conhecimento protegidos (know-how) a empresas já consolidadas no mercado, entre outros (SANTOS, 2008).

2. Procedimentos Metodológicos

A pesquisa é alicerçada em abordagem qualitativa, e o campo empírico a ser investigado é o da Fazenda-Escola da Universidade Estadual de Ponta Grossa UEPG. A estratégia utilizada para a pesquisa é a de estudo de caso descritivo, foi utilizado como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada, onde se buscou conhecer o processo de transferência de tecnologia, e devido à peculiaridade da pesquisa, a análise qualitativa interpreta a relação entre aplicabilidade dos fatos observados e resultados gerados. Segundo Yin (2001), o estudo de caso é uma inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de um contexto de vida real, quando a fronteira entre o fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de evidência são utilizadas.

Esta pesquisa é classificada quanto a sua natureza uma pesquisa aplicada, quanto à forma de abordagem do problema – considerada uma pesquisa qualitativa, quanto aos seus objetivos – é uma pesquisa exploratória, quanto aos procedimentos técnicos – pesquisa de campo.

Neste contexto, pretende-se analisar a relação da Universidade com a empresa Basf S/A, a qual se iniciou em 1994, desenvolvendo uma trajetória de sucesso até os dias de hoje. Como técnica de pesquisa se utilizou-se roteiros de entrevista semi-estruturadas e análise documental juntamente com publicações sobre o tema investigado.

Analisando a dimensão da transferência de tecnologia, a análise dos dados coletados com base nas entrevistas será realizada no sentido de avaliar como ocorre a transferência de tecnologia à luz da fundamentação teórica. Os dados serão analisados mediante a técnica de Análise de Conteúdo, para Vergara, (2005), que constitui uma técnica que trabalha os dados coletados, objetivando a identificação do que está sendo dito a respeito de determinado tema.

2.1. Caracterização das organizações

2.1.1. Fazenda-Escola Capão da Onça – FESCON

A Fazenda Escola "Capão da Onça" (FESCON) da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), foi criada pela Resolução R. 011/85, em 01 de abril de 1985, sendo subsidiária da administração e serviços, e destinada a prestar apoio à administração central e às atividades de ensino, pesquisa, extensão e produção, a Fazenda Escola é considerada um órgão suplementar dentro do organograma da UEPG.

Apresenta uma área de 311,12 hectares, dividida em duas glebas, cortadas pela Rodovia PR-513 - Ponta Grossa/Itaiacoca. Seu ponto mais alto está a 1027 m de altitude, localizado na Latitude 25°05'49"S e Longitude 50°03'11"W (UEPG, [201-]b).

Para as atividades de ensino estão priorizadas as áreas denominadas de Campo Demonstrativo e Experimental (CDE) com 8,5 ha, Olericultura com 3,0 ha e Fruticultura com 3,0 ha. Para atender as atividades de pesquisa estão disponibilizadas a Área de Pesquisa com 14,0 ha e a Estação Experimental com 9,0 ha. Para conduzir a produção vegetal vêm sendo utilizados talhões que totalizam 200 ha e para a produção animal 23 ha, distribuídos entre áreas de piquetes, instalações e manejo. A FESCON possui toda a infraestrutura necessária para a realização de pesquisas de alto nível no campo agronômico.

Destaca-se a aquisição recente de uma frota totalmente nova de tratores, colhedoras, semeadoras e aduladora de parcelas. A FESCON também possui uma estação agrometeorológica em parceria com a empresa Basf the Chemical Company que oferece suporte para o levantamento de dados climáticos necessários para o acompanhamento das pesquisas no campo e um laboratório de Fitotecnia com estufas de secagem e balanças para avaliações de campo. A FESCON tem apresentado papel de destaque regional, tanto na produção vegetal como na produção animal. Estes fatos são o reflexo dos investimentos conquistados nos últimos anos na estrutura e organização da Fazenda Escola "Capão da Onça".

Considerando todos esses aspectos, a FESCON oferece todo o suporte necessário para a realização de pesquisas avançadas em nível de Mestrado e Doutorado, necessárias para proporcionar um salto de qualidade no desenvolvimento científico e tecnológico da agricultura conservacionista praticada na região dos Campos Gerais do Paraná (UEPG, [201-]b).

2.1.2 Basf – The Chemical Company (BASF S/A)

A BASF é a maior corporação mundial do setor químico, gerencia negócios em mais de 170 países a partir da matriz em Ludwigshafen, Alemanha. Seu complexo industrial possui 350 unidades em 38 países, onde são fabricados 8 mil produtos por cerca de 93 mil trabalhadores, atuando nos setores químico, de plásticos e fibras, óleo e gás, agricultura e nutrição. A BASF é líder brasileira no segmento de tintas imobiliárias, com 70% do mercado (BASF, [201-]).

A Unidade de Proteção de Cultivos da BASF possui um Centro Experimental Avançado credenciado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O centro, localizado no município de Ponta Grossa (Brasil), está apto a emitir laudos de eficácia, fitotoxicidade e de resíduos de defensivos para fins de registro no órgão federal e possibilitará a realização de testes voltados às especificidades da região. Ele está alinhado à estratégia da BASF de investir em inovação e pesquisa, levando as melhores soluções tecnológicas para o campo e integra o Projeto de Extensão da Universidade Estadual de Ponta Grossa, com o objetivo de aumentar o rendimento e a excelência em culturas anuais e olerícolas por meio dos sistemas de produção AgCelence® (MINISTÉRIO, 2011).

3. Análise e discussão dos resultados

Reis (1998) identifica que as relações Universidade-Empresa podem ser estudadas mediante a análise de dois itens: a intensidade das relações (com respeito ao tamanho dos parceiros, os setores nos quais as relações são desenvolvidas, os países de origem dos parceiros) e suas características, tipos específicos de colaboração, os termos econômicos dos acordos, os campos científicos que são estudados e assim por diante.

No estudo realizado observa-se que o pesquisador da UEPG percebe que os estímulos motivadores para a criação das relações entre Universidade e Empresa são desenvolvidos de maneira lenta, e que o ritmo percebido vem sendo o mesmo apresentado ao longo dos últimos anos. O pesquisador acrescenta ainda que a implantação e geração de resultados desta relação era normalmente provinda de iniciativas individuais, ou seja, dependendo de cada pesquisador isoladamente envolvido. Pode-se observar também, sob o ponto de vista do primeiro entrevistado, como fator crítico para o êxito da implantação do processo, a existência do preconceito com relação a modelos e dinâmicas nesse sentido como umas das principais barreiras dessa relação (Zanluchi, 2008; Segatto, 1996).

Em consonância com os dados coletados do pesquisador, o administrador da fazenda-escola indica a existência de uma política para estimular as parcerias, a comunicação e os resultados entre Empresas e Universidade, ressaltando que essa política é nova na instituição. Não obstante, o entrevistado deixa claro que os benefícios dessa relação, para todos os atores envolvidos, começam a ficar mais claros e, consequentemente, mais aceitáveis e de fácil entendimento. "A iniciativa privada precisa de pesquisa, e nós precisamos da iniciativa privada para participar do financiamento". Tal compreensão também foi ressaltada por Porto (2000), de que uma relação mais equilibrada entre U-E do ponto de vista estratégico, alinhados estes, é benéfica para ambas as partes envolvidas.

No entendimento da Basf, o surgimento das relações com a Universidade resulta da postura e visão inovadora existentes no cerne da empresa. Novos cenários e novos produtos, especialmente os de sucesso, dependem de iniciativas de pesquisa, desenvolvimento e inovação das mais variadas e embasadas possíveis, sempre visando atender as necessidades essenciais da empresa. Este entendimento é citado por Mattos e Guimarães (2005) organizações existem para atender as necessidades humanas e, também, a expectativa de sobrevivência da mesma. Semelhante ao resultado da capacidade de desenvolver novos produtos, com o surgimento do estímulo de relação com as Universidades, a virtude descrita é a troca de informações baseada na necessidade em que a Universidade identifica, somada a necessidade identificada pela empresa. Devido aos seus princípios inovadores, Drucker (1989), descreve que a organização inovadora é aberta a novas ideias independente de onde surjam.

Ao analisar e dar-se foco nos processos gerenciais informais, na percepção do pesquisador entrevistado, essa relação Universidade - Empresa acaba levando a criação e a existência de práticas informais de cumplicidade que se estendem até além do contrato firmado, onde a prestatividade da empresa em relação à Universidade torna-se benéfica. Tratando-se de iniciativa privada, a gestão e destinação de recursos materiais e financeiros acaba sendo mais objetiva e mais dinâmica do que aquela observada no serviço público, que apresenta viés e direcionamento mais burocráticos. Não obstante, a existência de processos informais é encarada como prática positiva pelo pesquisador e, neste sentido é perceptível que a informalidade proporciona credibilidade na relação, e que o conhecimento é tratado como um produto fundamental nesta relação passível a um processo de transferência de tecnologia (MORGAN, 2010; NONAKA, 1991; NONAKA; TAKEUCHI, 1997; SANTOS, 2008).

Identificando as contribuições relatadas pela Basf, observa-se a necessidade da empresa em fazer com que o acordo e a parceria ocorram da maneira mais transparente e benéfica possível para as partes interessadas. Reconhecendo ou percebendo que existe ainda uma informalidade exacerbada dentro das relações existentes entre universidade e empresa, o profissional deixa transparecer sua  preocupação em alguns relatos: "a informalidade acaba acontecendo com vários professores e alunos, que, de repente, podem utilizar ou usufruir de algo... não só da estrutura, mas de conhecimento de tecnologia gerada aqui dentro, passar conhecimento... vai um dia nas aulas de agronomia e passa esse conhecimento essa informação que a gente detêm aqui".

Sob o ponto de vista do administrador da fazenda-escola, com um enfoque mais orientado a princípios de gestão, observa-se que em sua percepção não existem processos informais nessa relação Universidade-Empresa. Nesse sentido, o administrador tem claro que a Universidade e a empresa possuem direitos e deveres, e, partindo desse cenário, a realização de uma parceria técnico-científica, como o objeto em questão trata-se de uma Universidade pública, acaba passando por barreiras legais inerentes a construção e transferência de tecnologia (PORTO, 2000).

A divergência de interesses e objetivos entre a Universidade e a empresa, como descrita por Segatto (1996), faz com que a busca do conhecimento, fundamental à Universidade, entre em conflito com a postura e os objetivos da empresa, sempre orientados a melhores resultados nos menores espaços de tempo. Se por um lado temos as Universidades lidando com resultados que só serão alcançados a longo prazo, temos, no outro lado, as Empresas, que não possuem esta disponibilidade de tempo.

Dessa forma, processos informais ganham força dentro desse ambiente, pois a aproximação ocorre naturalmente, fazendo com que fatores facilitadores surjam contribuindo para o amadurecimento da relação.

Fatores esses citados por Porto (2000) como o conflito ideológico, nem sempre explícito, entre a Universidade e o setor empresarial e que tende a ser superado, o que possibilita um incremento na confiança mútua entre os parceiros envolvidos. Nessa linha, incorporando as contribuições de Reis (2004), a Universidade pública tem essências e missões próprias, ligadas ao seu compromisso social, não podendo se submeter indiscriminadamente à lógica de mercado. Não obstante, conforme o relato do administrador da fazenda-escola: "é sempre interesse da Universidade manter essas parcerias com a iniciativa privada".

A iniciativa de implementação de ações mais efetivas e de maior alcance no campo experimental partiu da empresa BASF, a partir de uma necessidade de responder de forma mais rápida e precisa as demandas de pesquisas decorrentes ao novo ramo de negócio adquirido pela mesma. Essa aproximação com a Universidade fez com que elementos de produção voltados às culturas locais, fossem identificados, criados ou melhorados aumentando assim sua capacidade de competir (AUDY; CUNHA; FRANCO, 2002; DRUCKER, 1989; GONÇALO; ZANLUCHI, 2011; STAL, 2002).

Apesar de resultados numéricos, estatísticos e comerciais percebidos a curto prazo por parte da BASF, é possível analisar a situação e buscar os possíveis cenários futuros para a Universidade.

No campo de ensino, pesquisa e extensão, a Universidade sob a perspectiva do pesquisador e do administrador da fazenda-escola mostra estar no caminho correto... Dentro das estratégias de desenvolvimento de parques tecnológicos, o papel da Universidade para ser uma fonte de inovação, bem como, ofertar estruturas como laboratórios equipados para desenvolvimento de testes e ensaios gerando assim um espaço para o desenvolvimento de novas tecnologias ou novos produtos (AUDY; CUNHA; FRANCO, 2002; SOLLEIRO, 1993).

No entendimento da Basf, a vantagem e os benefícios colhidos no estabelecimento de tal operação seriam a aproximação com os professores da Universidade, que detém conhecimento suficiente para aportar cenários e criar soluções para melhorar os resultados da empresa, bem como estabelecer um maior alcance e melhor relacionamento com os talentos da instituição, estudantes esses que possuem conhecimento atualizado e potencial para ingressar no quadro de funcionários da empresa.

Coincide com a ideia de Betz et al (1997) a ideia do profissional da empresa, quando o mesmo coloca que, com a troca de informação com professores e acadêmicos, e correlacionando as informações com as dinâmicas e processos da operação, a empresa consegue, até certo ponto, moldar e ajustar alguns dos seis fatores econômicos descritos por mão de obra, administração, produtos, recursos e tecnologia Betz et al (1997).

Ao final, as vantagens, como relata Audy, Cunha e Franco (2002), demonstra que as Empresas intensivas em conhecimento buscam alguns tipos de benefícios estratégicos como: Recursos humanos potenciais; Disponibilidade de serviços especiais a custos razoáveis; O acesso a uma ampla base de conhecimento; Um ambiente inovativo com novas oportunidades de negócios; Uma rede de terceirização, clientes e parceiros (AUDY; CUNHA; FRANCO, 2002; VEDOVELLO; JUDICE; MACULAN,2006).

A busca de soluções através de sistemas e relações desenvolvidas entre as Universidades e as Empresas são tratadas com extrema ênfase e importância nos cenários nacionais e internacionais, respeitando a cultura e as características de cada região, mas observando e seguindo ritmos positivos de pesquisa que utilizam novas tendências e estudos de caso que procuram identificar características específicas de cada relação, seus conceitos, seu desenvolvimento, o planejamento envolvido, a implementação efetiva e os resultados e suas terminações.

4. Considerações Finais

Este trabalho específico, intencionalmente selecionado a partir de resultados de sucesso e experiências adquiridas, enfoca o estudo da relação Universidade-Empresa sob a ótica do processo de transferência de tecnologia envolvendo a Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e a empresa Basf The Chemical Company (BASF).

 As principais características percebidas pelos entrevistados que trabalham na Universidade foram: a) as relações Universidade-Empresa dependem de iniciativas do pesquisador; b) já existe uma política de estímulo para o surgimento de canais de comunicação entre Empresas e Universidade; c) no desenvolvimento da relação aparecem práticas informais de transferência de conhecimento e de tecnologia que vão além do contrato firmado e que são positivas para o andamento dos processos; d) a ausência de uma política de seleção de pesquisadores que atuam em parceria com a empresa; e) já existem diversos tipos de pesquisa realizados em cooperação entre os dois players; f) os processos existentes funcionam como vitrines tecnológicas e geram a oportunidade de aproximação entre a Universidade e novos parceiros; g) as decisões de cooperação são ainda individuais; h) a decisão de implementação do campo experimental partiu da empresa; i) o tipo de relação permite à Universidade a oportunidade de vender seus serviços para empresas; j) avanços tecnológicos mútuos.

Já na avaliação dos dados coletados em cima da perspectiva da BASF, os principais mecanismos de gestão e localização interna foram: a) o surgimento da relação da empresa com a Universidade é decorrente da necessidade da empresa (área agrícola); b) os relacionamentos interpessoais e informais com professores e acadêmicos geram trocas de conhecimentos e informação; c) a seleção dos pesquisadores que atuam no projeto acaba ocorrendo de forma natural; d) diversos tipos de pesquisa já são realizados em cooperação; e) as decisões de cooperação são tomadas de forma conjunta; f) a decisão de implementação do campo experimental partiu da empresa; g) a relação gera uma maior facilidade de aproximação e contato com os especialistas das áreas de pesquisa; h) as desvantagens são praticamente inexistentes e a empresa utiliza maquinário e as salas para treinamentos tanto da Fazenda-Escola como da Basf The Chemical Company.

Com os tipos de transferência de tecnologia mencionados por Bonnacorsi e Piccaluga (1994), este caso, interpretando todo processo de análise de resultados, e possível afirmar, que existe um comprometimento dos recursos entre ambas instituições, as características de vinculação formais e informais estão evidenciadas, o objetivo do centro experimental e o objetivo dos cursos vinculados aos setor de ciências agrárias da instituição, sob o ponto de vista estratégico estão alinhados, por fim é possível afirmar que o processo de transferência de tecnologia existe, mas, limitado ao contexto inserido.

Após avaliação dos dados coletados e da análise feita no todo, nota-se que os mecanismos utilizados por ambas as organizações são semelhantes e complementares, gerando assim sintonia e sincronia na relação e uma melhoria na prestação de serviços tecnológicos. As ações e responsabilidades dos atores envolvidos no processo, a forma de atuação de cada uma das instituições envolvidas, e o impacto e resultados do processo em sua íntegra, com ações e atividades de interação, geram, além de um aperfeiçoamento e profissionalização dos docentes e acadêmicos envolvidos pertencentes ao setor de ciências agrárias.

Observa-se, portanto, que os resultados encontrados demonstra o processo de transferência de tecnologia que promove o desenvolvimento tecnológico das duas organizações, e que, valorado e apoiado em aspectos que vão desde a geração de conhecimento até a aplicabilidade de resultados efetivos e eficientes no meio produtivo, a relação Universidade – Empresa apresenta muito poucas ameaças e aspectos negativos, e inúmeros benefícios além de potencial imenso de oportunidades.

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1. Mestre em Gestão de Políticas Públicas, professor na UNICENTRO-PR – myller_3@hotmail.com
2. Especialista em Engenharia de Produção. contato.bertagi@gmail.com


Vol. 37 (Nº 01) Año 2016

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