Espacios. Vol. 36 (Nº 01) Año 2015. Pág. 12

Sistema de solução de controvérsias no Mercosul nos anos 1990: Uma abordagem estrutural

Dispute settlement system in Mercosur in the 90's: A structural approach

Silvio Parodi Oliveira CAMILO 1, Kelly GIANEZINI 2

Recibido: 12/09/14 • Aprobado: 24/11/14


Contenido

1. Introdução

2. A integração como tendência mundial

3. O sistema provisório de solução de controvérsias

4. Protocolo de ouro preto

5. Reclamações de particulares

6. Aspectos críticos

7. Considerações finais

Referências


RESUMO:
Este estudo trata de aspectos relevantes relacionados ao Sistema de Solução de Controvérsias no Mercosul nos anos 1990. Perpassando por questões relacionadas a meios e procedimentos adotados pelo ordenamento jurídico intergovernamental deste Bloco Econômico, buscou-se destacar as formas de integração econômicas mais usuais. Abordou-se, usando revisão de literatura da época, a evolução histórica dos tratados e protocolos relacionados a matéria, as competências e atividades dos órgãos do Mercosul, as controvérsias entre os Estados-Partes e os conflitos entre os particulares (pessoas físicas e jurídicas). Os resultados apontam para a necessidade de mudança na Constituição brasileira, como forma de validar a primazia das decisões prolatadas pelos órgãos do Mercosul, evocando a necessidade da supranacionalidade do sistema. Como conclusão observa-se que por meio de um sistema jurídico definido, os agentes econômicos darão maior segurança as transações comerciais entre os países do Mercado Comum do Sul, gerando benefícios mútuos.
Palavras-chave: Sistema de Solução de Controvérsias; Política e Mercosul; Gestão e arbitragem.

ABSTRACT:
This paper is a result of a research about the Dispute Settlement System in Mercosur, focused in specific aspects in the 90´s. We study the ways and procedures adopted by Law system and intergovernmental law in Mercosur. We highlighted the more usual forms of economic integration and give special attention to historical development of treaties and protocols related with this issue, as well the powers and activities of the Mercosur´s agencies and the controversies between the countries (members) and the conflicts between individuals. The results show that some changes are needed in the Brazilian Constitution, in order to validate the primacy of decisions handed down by the Mercosur´s agencies, evoking the need for supranational system. As a conclusion we observed that through a defined (and clear) legal system, the economic agents will provide a better assurance in business transactions between the countries of Mercosul, generating mutual benefits.
Keywords: Dispute Settlement System. Policy and Mercosur; Management and arbitration.

1. Introdução

Historicamente as nações têm se voltado para a ampliação das relações políticas e econômicas e muito se fez no sentido de produzir acordos de âmbito internacional, as vezes com amplitude restrita e outras em maior dimensão para o planejamento e gestão e ordenamento jurídico.

A uniformização de regras comerciais foi de fato marcante nas relações internacionais, haja vista iniciativas como a regulamentação de contratos mercantis, tais como: as Ordenações de Burgos e de Bilbao (séculos XVII e XVIII); o Sales of Googs Act da Grã-Bretanha (1893), a lei  sobre compra e venda dos países escandinavos (1906); o projeto de unificação de compra e venda internacional de Haia de 1964; as Leis Uniformes sobre a formação de contratos e a compra e venda internacionais de mercadorias; as Incoterms; o código de Bustamente; a Convenção de Viena em 1980; entre outros (Pabst, 1998).

Assim, regras de caráter internacional foram estabelecidas ao longo da formação histórica, visando a ordem e a organização das relações comerciais, bem como a troca de bens e serviços, com segurança e rentabilidade.

Esse propósito tem se verificado, por meio desses sinais supramencionados, com conteúdo integracionistas e desenvolvimentistas. O Tratado de Roma, indubitavelmente, foi um marco histórico de grande relevância para a conquista do estágio atual. Esse tratado, denominado como Anexo I, datado de 25 de março de 1957 em Roma, instituiu a Comunidade Econômica Europeia.

No âmbito da América Latina, o processo de integração teve sua primeira iniciativa em 1844, por intelectuais como o chileno Andrés Bello e o argentino Juan Bautista Alberdi. Na ocasião Juan Bautista asseverou que o equilíbrio regional deveria ter como fonte as potencialidades comerciais e não o equilíbrio militar, como fato principal. Contudo, somente após a Segunda guerra mundial é que houve o fortalecimento e a formalização das intenções de cooperação econômica, tais como: a Associação Latino Americana de Livre Comércio – Alalc, posteriormente transformada em Associação Latino-Americana de Integração – Aladi (Pabst, p.7, 1998).

Posteriormente, com o avançar dos acordos e tratados entre os países da América Latina, impulsionados pela crescente globalização da economia e a transnacionalidade dos capitais, surge o Tratado de Assunção, datado de 26 de março de 1991, tendo um período de transição preparatório de 45 (quarenta e cinco) meses, para confirmação em dezembro de 1994.

Com fins de promover o desenvolvimento integrado das economias, o MERCOSUL foi constituído com os seguintes países signatários: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Juntos prometeram constituir um Mercado Comum do Sul até 31 de dezembro de 1994, com objetivos voltados para a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os Estados Membros, com a eliminação e barreiras e restrições alfandegárias vigentes.

No seu art 3º estava previsto que os Estados-Partes adotariam um Regime Geral de Origem, um Sistema de Solução de Controvérsias e Cláusulas de Salvaguarda, que constam nos anexos II – Tratado de Assunção; III- Protocolo de Brasília para a Solução de Controvérsias/16.12.1991; e IV- o Protocolo de Ouro Preto, adicional ao Tratado de Assunção Sobre a Estrutura Institucional do MERCOSUL/17.12.1994.

Os estudos que seguem tratam do Sistema de Solução de Controvérsias, com base na primeira década de vigor do Mercosul, onde os Estados-Partes, em seu anexo III, se comprometeram a adotar um Sistema transitório, no sentido de fortalecer as relações, visando a segurança com base na justiça e na equidade, e posteriormente avançaram o sistema com o advento do anexo IV. 

Neste estudo, a revisão de literatura, resultados e considerações foram realizados em uma perspectiva interdisciplinar histórico-descritiva, das ciências sociais aplicada, englobando o Direito Processual Comunitário, a Economia Internacional e a Gestão e Planejamento de políticas e ações para organização do sistema jurisdicional; seus limites de competência; meios de solução de conflitos e procedimentos dos órgãos competentes.

2. A integração como tendência mundial

O processo de integração no mercado internacional é decorrente da necessidade de troca de bens e serviços entre as nações e do esgotamento dos mercados locais. Os produtores de inovações tecnológicas almejam expansão nos mercados globais.

Assim, se faz necessário que os países, em razão dos processos de trocas e transações comerciais, realizem o regramento das operações emitindo tratados, acordos e procedimentos para a regulamentação dessas operações.

O processo de organização das relações dá-se por meio dos agentes econômicos e dos governos dos Estados partícipes. Juntos, objetivam a harmonização das estruturas produtivas, dos fluxos financeiros e comerciais, avaliando os efeitos sociais em cada comunidade (Branco apud Oman, 1997).

A globalização das relações internacionais tem um interesse econômico. As repercussões são favoráveis às organizações que ditam os padrões de mercado, as chamadas paradigmas. Essas, em razão da ampliação das bases de atuação, buscam os meios de produção mais favoráveis a nível de custos, maximizando os potenciais de competição em outros mercados.

Os acordos regionais dos mercados visam o fortalecimento das forças políticas e econômicas locais, assim, assegurando uma melhor performance aos agentes de produção e maior poder de negociação com os blocos e mercados externos.

Luizella Branco (1997, p 23) expõe que "o Direito Internacional Econômico admite que a integração econômica pode assumir muitas formas institucionais, consoante o maior ou menor aprofundamento verificado, ajustando-se aos diferentes propósitos". As principais formas são: zonas de livre comércio, uniões aduaneiras e mercados comuns, sintetizadas no quadro 1 a seguir.

Quadro 1: Síntese das principais formas de integração

 

Zona de livre comércio

 

Nessa modalidade os Estados-membros possuem a liberdade na movimentação dos seus produtos, mantendo a autonomia na sua política comercial. Baptista (1993) expõe que: "a zona de livre comércio é o estabelecimento, pela via dos tratados internacionais, da livre circulação das mercadorias sem barreiras ou restrições quantitativas ou aduaneiras, conservando aos Estados integrantes, total liberdade nas relações com terceiros países, inclusive em matérias relacionadas com importação e exportação". O autor alerta para os cuidados que se fazem necessários na firmação dos acordos. Observa que a prova de origem dos produtos evita que os vindos de fora da zona recebam o mesmo privilégio. Os critérios estabelecidos como "regras de origem" e "nacionalização" devem ser cumpridos, evitando o desequilíbrio e a insegurança nas operações comerciais.

União aduaneira

 

Há a liberdade na circulação das mercadorias, porém com uma política comercial unívoca, abrangendo uma pauta comum e única em relação as transações com o exterior, inclusive em nível de negociação e acordos, que no caso é conjunta. Medeiros (1995) coloca que essa política comercial unificada é consubstanciada numa Tarifa Externa Comum (TEC), como exemplo regimes comuns para a defesa contra práticas desleais de comércio e procedimentos aduaneiros. Baptista (1993) alerta, em via reflexa, que os portos com infra-estrutura mais custosas ficarão fora dos grandes volumes de trânsito comercial. Pois, Os portos como os uruguaios, Paranaguá, se beneficiarão, enquanto Bueno Aires, Rio e Santos serão prejudicados. Gerando, por consequência, efeitos prejudiciais para as suas regiões. Cita que para evitar esse problema na CEE, foram adotadas medidas para evitar o desequilíbrio. Destinando parte dos impostos de importação à comunidade, que incorporando a verba a sua receita a destina a modernização dos portos.

Mercados comuns

 

Ao natural, a união dos mercados para a ser a terceira etapa do processo. Consequência da experiência acumulada anterior. Representam uniões aduaneiras que permitem a liberdade de circulação, em especial do trabalho e do capital, através das fronteiras. Permitindo a livre circulação de bens e serviços entre os Estados-Membros.  Na instituição de um mercado comum, tem-se o ponto de vista econômico-comercial um único universo, lhe faltando somente a adoção de moeda única (Baptista, 1993).

União econômica

e monetária

 

Talvez seja a forma de maior profundidade, compreendendo a harmonização das políticas monetárias e fiscais e até mesmo a transferência das diretrizes políticas gerais, outorgando poderes para uma hierarquia superior, de caráter supranacional. A livre circulação de mercadorias é obtida com a eliminação das barreiras tarifárias e extra tarifárias. Por evidente, essa forma é alcançada por intermédio de um programa de redução progressiva das tarifas, até a eliminação total. Igualmente as barreiras não tarifárias deverão ser excluídas no tempo (Baptista, 1993).

Elaborado pelos autores a partir de Baptista (1993), Medeiros (1995) e Luizella Branco (1997).

3. O sistema provisório de solução de controvérsias

3.1 Considerações gerais

Com o advento do Tratado se Assunção, em 26 de março de 1991, iniciou-se o processo de integração subregional, com a formalização institucional do MERCOSUL.

Com a ampliação dos mercados nacionais a integração desejou, na sua constituição, a conquista de desenvolvimento econômico com justiça social e a melhoria das condições de vida de seus habitantes. Isso não se torna exequível sem a constituição de um sistema de soluções de controvérsias, para dar segurança, celeridade e equilíbrio no processo de consolidação dos Estados-Membros.

O Tratado de Assunção, na sua origem, estabelece, no seu artigo 3º, que: 

Durante o período de transição, que se estenderá desde a entrada em vigor do presente Tratado até 31 de dezembro de 1994, e a fim de facilitar a constituição do mercado Comum, os Estado-Partes adotam um Regime Geral de Origem, um Sistema de Solução de Controvérsias e Cláusulas de Salvaguarda, que constam como Anexos II, III, e IV ao presente Tratado.

Assim, em cumprimento a ordem ditada pelo Tratado maior originou-se em 16 de dezembro de 1991, o Protocolo de Brasília Para a Solução de Controvérsias, com intuito de viger durante o período de transição, para fortalecer e amadurecer as relações entre as partes.

Na verdade, a despeito de na sua nascente já estar possuído das regras mestras, foi concebido com o caráter provisório. A prova está no prescrito no Artigo 34 do Tratado supra citado, qual seja: "O presente Protocolo permanecerá vigente até que entre em vigor o Sistema Permanente de Solução de Controvérsias para o Mercado Comum a que se refere o número 3 do Anexo III do Tratado de Assunção".

O Protocolo de Ouro Preto, de 17 de dezembro de 1994, atua supletivamente e completa o Protocolo de Brasília com do seu Art. 44, como segue: "Antes de culminar o processo de convergência da tarifa externa comum, os Estados-Partes efetuarão uma revisão do atual sistema de solução de controvérsias do Mercosul, com vistas à adoção do sistema permanente a que se referem o item 3 do Anexo III do Tratado de Assunção e o artigo 34 do Protocolo de Brasília". 

As relações políticas e econômicas adquirirão maturidade e fortalecimento somente com o advento de um sistema permanente de solução de controvérsias. A implementação desses instrumentais jurídicos formarão maior segurança entre os Estados-Membros garantindo o cumprimento das transações comerciais, por corolário proporcionando a troca de riquezas.

Na atualidade evoca-se a necessidade da constituição de um sistema definitivo, que contenha uma etapa extrajudicial com negociações diretas, mediações e conciliações e jurisdicional por intermédio de tribunais judiciais e tribunais arbitrais (Kirmser, 1996).

3.2 Controvérsias entre os Estados-Partes

Como já mencionado, o Anexo II cria um Sistema Provisório de Solução de Controvérsias, posteriormente substituído pelo Anexo III, e complementado pelo Anexo IV, Protocolo de Ouro Preto.

3.2.1 Negociações diretas

Já estabelecido que no caso de controvérsia os Estados-Membros procurarão resolvê-la, antes de tudo, mediante negociações diretas. Informarão o Grupo Mercado Comum, por intermédio da Secretaria Administrativa, sobre as gestões que se realizarem durante as negociações e os resultados das mesmas. Não podendo exceder a um prazo de 15 (quinze) dias, a contar o levantamento formalizar a controvérsia (Art. 2º, 3º e 4º).

3.2.2 Intervenção do Grupo do Mercado Comum

Se as negociações diretas, em razão de alguma controvérsia anterior, não lograrem êxito, qualquer dos Estados-Partes poderá submetê-la à apreciação do Grupo Mercado Comum(GMC). Esse dará nova oportunidade aos opositores para que exponham as contrariedades, suas posições, onde poderão fazer uso de experts, disponíveis da lista de credenciados, visando o ajustamento entre os litigantes (Art.  4º).

Ao final deste procedimento, que não poderá ultrapassar o prazo de 30(trinta) dias, o GMC fará recomendações aos Estados-Partes em controvérsia, objetivando a solução definitiva do conflito. (Art. 5º e 6º).

Os procedimentos definidos no Protocolo de Brasília demonstram que o GMC atua como mediador, não tendo, portanto, o poder de prolatar decisões e sim de harmonizar as diferenças entre as partes.

3.2.3 Procedimento Arbitral

Quando inexitosas as formas anteriormente estabelecidas, os Estados-Partes, qualquer um, por sua iniciativa própria, poderá dar andamento processual no seu direito violado, recorrendo ao procedimento arbitral. Iniciará o trâmite processual por meio da comunicação formal à Secretaria Administrativa (Art. 7º). Destaca-se que é aplicável a Secretaria Administrativa o princípio da inércia, ou seja, para atuar precisa ser provocada.

Iniciado por um dos litigantes, logo a seguir a Secretaria levará ao conhecimento do Estado adverso ou dos outros envolvidos e ao GMC, encarregando-se da tramitação.

Essa instância é arbitral e não judicial. Porém tem cunho obrigatório reconhecido pelos Estados-Partes (Art. 7º).

O anexo III estabelece ao Tribunal Arbitral a competência para resolução das controvérsias. Esse atua quando provocado por um Estado, somente após vencidas e fracassadas as tentativas de mediações anteriores.

O procedimento arbitral terá sequência num Tribunal ad hoc, constituído por três árbitros designados a partir das listas contendo 10 (dez) árbitros nacionais, elaboradas por cada membro e registradas na Secretaria Administrativa (Art. 9º).

Cada Estado-Parte indica um árbitro nacional, enquanto o terceiro árbitro será escolhido por ambas as partes, obviamente sem ter a mesma nacionalidade dos litigantes. Esse árbitro   presidirá o Tribunal Arbitral. Quando houver discordância ou não indicação de árbitros a Secretaria Administrativa assume a titularidade na indicação. Ressalta-se o fato que os árbitros a serem indicados devem ter reconhecida competência relativamente a matéria objeto da controvérsia (Art. 9º ao 13).

É assegurado as Partes a constituição das provas para a sustentação das suas alegações. O Tribunal terá fonte para sua decisão, além das provas processuais, as disposições do Tratado do Mercosul, seus protocolos, os acordos, decisões, as resoluções, e os princípios e disposições de direito internacionais aplicáveis na matéria controvertida (Art. 16 a 18).

O Tribunal terá 60 (sessenta) dias, prorrogáveis por mais 30 (trinta) dias para a decisão final, por maioria, que será motivada e fundamentada pelo Presidente, assinada pelos árbitros, com votação confidencial (Art.19). Essa visa assegurar a independência do Tribunal e a total liberdade de decisão de seus árbitros. As decisões prolatadas são inapeláveis, tendo força coerciva para o Estado-Parte vencido.

Observa-se que o Tribunal tem poderes para estabelecer as medidas provisórias de cautelas, que estime necessárias para prevenir danos graves e irreparáveis a uma das partes em disputa.

4. Protocolo de ouro preto

O Protocolo de Ouro Preto, designado como anexo IV, subscrito em 17 de dezembro de 1994, originou-se como adicional ao Tratado de Assunção e aos artigos 19 e 25 do Protocolo de Brasília, incorporando as diretrizes da Comissão de Comércio do MERCOSUL, também modificando a estrutura institucional vigente, criando os órgãos descritos no Quadro 2 a seguir:

Quadro 2: Estrutura institucional e órgão do Mercosul no âmbito do tema estudado

Conselho Mercado Comum:

é o órgão superior do Mercosul, que tem por incumbência a condução  da política do processo de integração e assegurar o cumprimento dos objetivos estabelecidos pelo Tratado de Assunção;

Grupo Mercado Comum:

é o órgão executivo do Mercosul;

Comissão de Comércio do MERCOSUL:

encarregado de assistir o Grupo Mercado Comum e velar pela aplicação dos instrumentos de política comercial comum acordados pelos Estados-Partes para o funcionamento da união aduaneira, como acompanhar e revisar os assuntos ligados a políticas comerciais comuns, no Mercosul e com outros países;

Foro Consultivo Econômico-Social:

Representa os setores econômicos e sociais;

Secretaria Administrativa do Mercosul:

é o órgão de apoio operacional, responsável pela prestação de serviços aos demais órgãos do Mercosul, com sede em montevidéu.

Elaborado pelos autores

O Art. 2º prescreve que os órgãos de capacidade decisória são o Conselho do Mercado Comum, o Grupo Mercado Comum e a Comissão de Comércio do Mercosul.

Luizella Branco(1997) apresenta o que Guerreiro (1995) sintetiza as novidades do Protocolo de Ouro Preto:

O Art 44, prevendo a necessidade de modificações posteriores, estabelece que:  

Antes de culminar o processo de convergência da tarifa externa comum, os Estados-Partes efetuarão uma revisão do atual sistema de solução de controvérsias do Mercosul, com vistas à adoção do sistema permanente a que se referem o item 3 do Anexo III do tratado de Assunção e o art. 34 do Protocolo de Brasília.

Luizella Branco (1997) confia na criação de um Tribunal Supranacional, com competência para o controle constitucional de normas do direito comunitário, formando, assim, uma verdadeira jurisprudência comunitária para uniformizar as interpretações desses direitos. Elucida que somente com a criação de órgãos independentes dos interesses dos Estados é que o sistema pode-se consolidar.  A mais, diz que:

a substituição do atual modelo de solução de controvérsias para um tribunal permanente contribuiria para a legitimação e sustentação de um verdadeiro projeto integrador, atendendo às demandas que naturalmente surgirem, à medida que a integração for sendo apurada.

Finalizadas as apreciações anteriores segue-se a análise dos reclames dos particulares.

5. Reclamações de particulares

O Protocolo de Brasília nos Artigos 25 a 32, do Capítulo V, que fixava os procedimentos aplicáveis às reclamações por particulares, pessoas físicas e jurídicas, foi modificado pelo artigo 21 do Protocolo de ouro Preto e seu Anexo.

Esse artigo estendeu aos particulares os procedimentos previstos para a solução de controvérsias entre os Estados-Partes, quando relacionadas com as situações previstas nos artigos 1º ou 25 do Protocolo de Brasília, dentro da sua área de competência. Assim, ampliou a sua competência para a resolução de conflitos entre particulares – pessoas físicas e jurídicas-.

Dessa forma, qualquer medida legal ou administrativa de natureza discriminatória ou restritiva imposta por qualquer Estado-Parte, violando o tratado de Assunção, acordos, Decisões, Resoluções e Diretrizes, dará justo motivo a qualquer particular atingido a reivindicar o status quo ante. Na ocorrência da violação as normas estabelecidas, o particular lesado, por sua iniciativa, deverá dirigir-se à Secretaria Nacional da Comissão de Comércio de seu país de residência. Essa encaminhará a reclamação à Comissão de Comércio local.

As reclamações deverão respeitar os aspectos formais para o inicio do processo. Para tal, o reclamante deverá estar munido dos elementos de prova que permitam tipificar o fato gerador da iniciativa processual. A Comissão fará a avaliação da questão posta em causa, podendo fazer uso de Órgão superior (GMC) caso os seus especialistas não emitam conclusão consensual no prazo fixado.

Recebida a reclamação, o GMC fará avaliação dos conteúdos e fundamentos, para o exame de admissibilidade, recusando-o, se for o caso de falta de cumprimento dos requisitos essenciais. Admitida a reclamação, procederá a continuidade convocando um grupo de especialistas para que emitam parecer, no prazo previsto. Dentro do prazo (30 dias), o grupo dará oportunidade as partes de se manifestarem, apresentando seus argumentos (Art. 29).

Conforme o Art 32, os especialistas entregarão o seu parecer ao GMC. Havendo procedência do reclame qualquer outro Estado-Parte poderá requerer a adoção de medidas corretivas ou a anulação das medidas questionadas.  Caso não prosperar o pedido – no prazo de 15 dias – a parte poderá recorrer diretamente ao procedimento arbitral.

6. Aspectos críticos

Luizella Branco (1997) aponta como problemático o fato da Secretaria Nacional levar adiante a questão, mesmo sendo rejeitada por consenso pela Comissão de Comércio. Conclui que as reclamações dos particulares, quando julgadas improcedentes por este órgão, somente podem ser levadas ao exame do Tribunal Arbitral convertendo-se numa questão intergovernamental.

Assim, somente se o Estado-Membro, a que pertence o particular, chamar para si a titularidade da reclamação, é que poderá ser iniciado o procedimento arbitral. Luizella faz referência ao que pronunciou Florência Gonzáles: "Hay así una relativa indefensión del particular afectado que podrá crear insatisfacciones en relación con el sistema".

 Os particulares estão desprovidos de defesas contra as Decisões do Conselho ou das Resoluções do GMC que considerem violar o Tratado de Assunção. O Protocolo de Brasília em nenhum momento faz referência a revisão dos atos prolatados por essas instituições comunitárias.

Aduz que no pertinente a executoriedade dos laudos arbitrais no Mercosul é dirigida somente aos Estados-Membros. Nada falando a respeito da obrigatoriedade no cumprimento pelos particulares. Guido Soares conclui que a regulamentação ficará a encargo de cada Estados.

As arbitragens comerciais internacionais são reguladas pela Convenção Interamericana sobre a Arbitragem Internacional, de 30 de janeiro de 1975, a luz dos termos da Convenção de Nova York, tratando das relações comerciais entre as pessoas físicas e jurídicas nos países do Continente Americano. A Argentina foi o único país a não ratificar. Os demais membros já converteram esse tratado para a lei interna nos ordenamentos jurídicos dos seus países.

Ambas as convenções preveem que quando prolatada uma decisão arbitral terá força de sentença judicial definitiva. Nesta direção, no Brasil, a lei de Arbitragem brasileira (Lei n. 9.307), promulgada em 23 de setembro de 1996, estabelece no seu artigo 35 que para ser reconhecida ou executada no país, a sentença arbitral estrangeira está sujeita, unicamente, a homologação do Supremo Tribunal Federal (STF). Para registrar, a luz do que expõe Adriana Pucci (1996) na Argentina, no Paraguai e no Uruguai os laudos arbitrais têm força executiva, não requerendo homologação judicial. No Brasil, com o advento da Lei retro mencionada, não mais há necessidade, também, de reconhecimento judicial por meio de homologação.

Todavia haja essa prescrição legal, discute-se a inconstitucionalidade da previsão supra mencionada, justamente pela falta de guarida constitucional. Por fixar no seu art. 102, inc. I, letra h, a competência para homologar somente as sentenças estrangeiras, não tocando nas questões vinculadas a laudos arbitrais.  

7. Considerações finais

Observando a coletânea temporal realizada para este estudo, percebe-se complexidade deste tema. Portanto optou-se por uma última seção na qual não são trazidas conclusões, mas sim considerações e questionamentos – igualmente alicerçados em autores do período – por entender a necessidade da constituição de um Sistema Permanente de Solução de controvérsias no Mercosul desde os anos 1990. O estudo histórico-descritivo, englobando o Direito Processual Comunitário, a Economia Internacional e a Gestão e Planejamento de políticas e ações para organização do sistema jurisdicional aponta que a solução dos conflitos entre particulares – pessoas físicas e jurídicas – poderia ser acelerado com a constituição de uma Corte Supranacional.

Para tal feito, o Brasil necessitaria alterar a Constituição para recepcionar e reconhecer a legislação supranacional. Esta discussão só ganhou corpo a partir de 2004 com o encontro das cortes supremas dos países membros em Brasília e atualmente ainda não é claramente previsto na Carta Magna brasileira, não tendo como reconhecer plenamente as decisões tomadas por essa corte.

Ainda na década de 1990, Deisy Ventura (1996) colaborou sobremaneira nesta discussão, afirmando que as regras que existem em torno do bloco não apresentam indícios da formação de sistema, sobretudo pela ausência de poder de sanção originado de disposição coletiva, por incorporar-se ao direito pátrio com origem nos Tratados.

Cabe mencionar que as Constituições do Paraguai e da Argentina já incorporaram o princípio da supranacionalidade. Admitindo um ordenamento jurídico supranacional. Na verdade esses países abriram mão de certa soberania, para que no seu ordenamento jurídico recepciona-se validamente órgãos supranacionais.

A União Européia e o Pacto Andino preferiram adotar um mecanismo de solução baseado na supranacionalidade de sua estrutura, onde a norma comunitária tem primazia sobre a norma nacional.  O NAFTA e o MERCOSUL instituíram tribunais arbitrais ad hoc preservando as suas estruturas soberanas, mantendo o caráter intergovernamental nas relações jurídicas.

O professor João Grandino Rodas (1998), ex-consultor do Itamaraty, admitia na época que se fosse criada uma Corte no Mercosul ela não terá o caráter supranacional, sendo apenas uma "Corte Clássica". Entende que dessa forma as decisões que a Corte tomaria não precisariam ser seguidas obrigatoriamente pelos países do Mercosul. A Corte não teria capacidade para interferir diretamente no ordenamento jurídico dos Estados-Membros. Contudo seria o primeiro passo para o aperfeiçoamento de uma justiça comunitária entre os Estado-Membros do Mercosul (Gazeta Mercantil, 1998).

Por enquanto, a alternativa das empresas e dos prejudicados, com algum problema jurídico previsto no ordenamento prescrito no Mercosul, é recorrer ao Sistema Provisório de Solução de Controvérsias, por meio da arbitragem. Que serve como integrador do Mercosul, com afirma Brindeiro (Gazeta Mercantil, 1998).

Por conseguinte, Vicente Rangel (1999) dizia que forçoso era convir que a implantação tanto do mecanismo de controle efetivo de legalidade como de um sistema orgânico de interpretação dos tratados de integração somente se torna possível com a incorporação de um Tribunal de Justiça nas estruturas comunitárias.

Neste tópico de considerações finais, surgem então questionamentos para estudo e disseminação do conhecimento como a da força da norma externa sobre a interna, quando um Estado-Membro não acolhe as decisões ou deixa de incorporar uma ordem jurídica, mesmo que produza alguma consequência jurídica ou econômica. Na concepção "Pontiana" (Pontes de Miranda), a norma existe, tem validade porém não produzirá eficácia. Se a norma de poder internacional tem o poder de produzir um poder cogente ou somente é um imperativo ético? Será que a estrutura orgânica do Mercosul pode fazer garantir, em todos os Estados-Membros, a aplicação das normas emanadas pelo bloco? O professor Baptista (1996) lança o problema das diferenças culturais, interpretações e adequações das normas. Cassella (1997) proclama que em processo de integração é imperiosa a harmonização, unificação, aproximando as legislações nacionais, assim, eliminando os pontos de colidência entre estas.

Portanto, entende-se que para se estabelecer um quadro de maior segurança nas relações comercias, o Sistema jurídico do Mercosul teve e ainda tem muito a trilhar. Este caminho passa necessariamente pela formação do Direito Comunitário e pela internalização da norma em cada país, adequando-se a nova realidade. Passando pela instauração de uma Corte de Justiça para tratar das questões do Direito Comunitário (Michelon, 1997).

Há então a perspectiva da formação de um sistema jurídico definitivo, nos moldes do modelo europeu. O binômio hierarquia dos tratados e o controle de constitucionalidade, quedam-se suplantados pelo princípio da autonomia do direito comunitário; pelo princípio da aplicação direta e efeito imediato da norma comunitária; pelo princípio da primazia do direito comunitário sobre as normas internas (Bastos, 1997).

Portanto, ao analisar as discussões do período, constata-se um clamor por planejamento, autonomia e hierarquização, na busca por um contexto verdadeiramente comunitário. Neste panorama, o sistema jurídico tornar-se-ia estável, possibilitando maior segurança entre os agentes econômicos, repercutindo favoravelmente na economia e gestão de políticas dos Estados-Membros.

Referências

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1. Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais, Economia e Administração, Mestre em Administração e Negócios, Doutor. Professor do PPGDS da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). E-mail: parodi@unesc.net
2 Graduada em Direito e Ciências Sociais, Especialista em Relações Internacionais, História e Integração Regional, Mestre em Sociologia. Doutora. Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). E-mail: kellygianezini@terra.com.br



Vol. 36 (Nº 01) Año 2015
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