Espacios. Vol. 35 (Nº 11) Año 2014. Pág. 8

Aprendizagem organizacional na gestão de projetos: Pesquisa-ação em uma empresa de engenharia consultiva

Learning organization in projects management: Research action in a consulting engineering company

Weslon Charles FERREIRA COSTA 1; José Carlos de TOLEDO 2

Recibido: 20/07/14 • Aprobado: 08/08/14


Contenido

1. Introdução

2. Conceitos da gestão de projetos

3. Processo de Aprendizagem Organizacional

4. Método de pesquisa

5. Apresentação dos resultados da pesquisa-ação

6. Considerações finais

Referências


RESUMO:
O artigo contribui para a expansão do conhecimento sobre a prática da Aprendizagem Organizacional (AO) durante o desenvolvimento de projetos. Foi conduzida uma pesquisa-ação em uma empresa de Engenharia Consultiva, visando aplicar e revisar conceitos e práticas que são recomendados na bibliografia sobre o tema. As ações planejadas e implantadas na empresa visam promover três atividades da AO: transferência de conhecimentos explícitos (documentos e relatórios técnicos), o reaproveitamento das próprias experiências (conhecimento tácito) e a resolução sistemática de problemas. Como resultado do diagnóstico e da análise das ações implementadas foram apontadas oportunidades para reforçar o processo de AO na gestão de projetos da empresa e melhorar o desempenho desta gestão. Do ponto de vista teórico, foi possível delinear categorias de problemas enfrentados pela engenharia consultiva no desenvolvimento de seus projetos, e que podem ser mitigados com a adoção de práticas de AO.
Palavras-chave: Engenharia Consultiva, Gestão de Projetos, Aprendizagem Organizacional

ABSTRACT:
Structured by means of a research action, article contributes to the expansion of the knowledge about projects management investigating actions that promote the practice of the process of an Organizational Learning (OL) during the development of projects in a Consulting Engineering company. The planned and implemented actions aim to promote three activities of OL: transference of explicit knowledge (documents and technical reports etc), the reuse of the own acquired experiences (tacit knowledge) and the systematic problems solving. The interprojects transference of explicit knowledge, in the company, is not effective. Despite the tacit experiences, the learning occurs when the project coordinators register and disclose in a Project Execution Plan the similar contracts developed in the company, inter-related with member of the teams that have worked on them. The generation of knowledge motivated by the dynamic of systematic resolution of problems is incipient, because there are many factors that make it difficult the capture of this knowledge for later reuse. As a result of analyses of the implemented actions it was possible to indicate opportunities of improvement to reinforce the organizational learning process and, additionally, to outline categories of "problems" faced by the consulting engineering in the practice of Projects Management. These activities of the learning must be integrally evaluated, because they are complementary and developing the learning.
Keywords: Consulting Engineering, Projects Management, Learning Organizational.

1. Introdução

Estudos recentes indicam perspectivas otimistas quanto a manutenção do ritmo do crescimento da economia bem como dos investimentos na construção civil, impulsionados especialmente pelos aportes relacionados a eventos esportivos e ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) (DIEESE, 2011; PUGA; BORÇA Jr., 2011). Paralelamente, instaurou-se no país um cenário inédito no setor de negócios baseado em projetos, composto por escritórios de Arquitetura e Engenharia Consultiva, os quais vêm sofrendo mudanças que repercutem na maneira pela qual se organizam para gerir o desenvolvimento desses projetos.

As empresas de Engenharia Consultiva ofertam serviços de natureza intelectual, especializados e customizados, que otimizam e oferecem soluções de projetos  em diversos segmentos (indústria, construção, infraestrutura), agregando valor em todas as fases do projeto de investimento e, mais recentemente, também na implementação e na operação destes investimentos (ABDI, 2011; SINAENCO, 2011). Estas empresas planejam, determinam a viabilidade, projetam, gerenciam e acompanham o start up de empreendimentos físicos nos vários segmentos (SINAENCO, 2011).

A engenharia consultiva é caracterizada por uma tríplice-heterogeneidade em função da natureza do serviço oferecido, da empresa ofertantee dos tipos de segmentos demandantes dos serviços (SABBATINI, 2012).

A prestação do serviço vai desde a realização do projeto básico, detalhamento, implementação (inclusive procurement) até o gerenciamento da operação, podendo variar entre cada uma destas etapas, em projetos diferentes ou de forma conjugada (ABDI, 2011; SABBATINI, 2012). Grosso modo, a engenharia consultiva oferta dois tipos de serviços: soluções de projeto de engenharia e/ou arquitetura e soluções de gerenciamento e/ou supervisão de obras.

O principal atributo de competitividade na engenharia consultiva é a composição de um quadro de funcionários e gestores com experiência, qualificação e reputação nos segmentos de projetos (design) em que pretendem atuar, além de capacidade criativa. Uma condição sine qua non para a constituição de uma empresa é o domínio do conhecimento tácito da mão de obra altamente qualificada e reputação da empresa em determinada área (ABDI, 2011; SABBATINI, 2012).

Para atender a elevada demanda, as empresas de engenharia consultiva necessitam melhorar continuamente suas práticas de gestão de projetos. Uma estratégia de conjugar a obtenção de maior desempenho dessas práticas e o êxito mercadológico é atrelada à capacidade de aprendizado, não só dos indivíduos, mas também em nível de equipes e da organização como um todo. A gestão de projetos deve ser tratada como uma competência crucial para aprender com cada projeto e com o conjunto de projetospara aplicação desta aprendizagem em outros subseqüentes. Para isso, as empresas não podem ignorar as experiências e o conhecimento desenvolvidos ao longo dos projetos.

Atentar para as situações vivenciadas e a partir daí capturar as experiências na ocorrência de eventos críticos, sejam bem-sucedidos ou problemáticos, e na resolução de problemas pode, a priori, parecer uma ação reativa, mas a utilização dos registros desses eventos significa assumir um enfoque corretivo ou pró-ativo.

Ao longo do desenvolvimento de um projeto é inevitável a ocorrência de eventos críticos. Novas soluções são desenvolvidas e decisões são tomadas, questionáveis ou não. Para aprender com eles, o processamento de experiências e situações problemáticas se destaca por gerar informações e conhecimentos para melhorias na prática de gestão de projetos. Entretanto, esse processamento pode ser ineficiente, uma vez que as informações e os conhecimentos podem ser apenas capturados por uma equipe de projeto e nunca acessados e reutilizados por outra, dificultando o aprendizado organizacional. Para amenizar a ocorrência do possível hiato entre os eventos críticos vivenciados e o conseqüente reuso do aprendizado, mecanismos podem ser desenvolvidos, tais como, o uso de banco de dados e o estabelecimento de procedimentos que exigem o tratamento desses eventos.

A partir da situação-problema exposta anteriormente, o objetivo geral deste artigo é apresentar e discutir os resultados, práticos e teóricos, de uma experiência de implantação de mecanismos de AO em uma empresa de engenharia consultiva, considerando o uso das próprias experiências, a resolução de problemas e a transferência de conhecimentos durante a gestão de projetos. Ao final são apresentadas recomendações para melhoria da aprendizagem interprojetos na empresa pesquisada, e que podem ser utilizadas por empresas semelhantes. Complementarmente procura-se confrontar o que é prescrito na teoria sobre o tema com o que foi observado na pesquisa-ação.

Nos tópicos seguintes do artigo apresentam-se: conceitos básicos sobre gestão de projetos e aprendizagem organizacional em projetos, usados como base para a pesquisa-ação; o método e o modelo da pesquisa; e os resultados da pesquisa-ação.

2. Conceitos da gestão de projetos

Embora tenham variações, as definições para "projeto" (project) giram sempre em torno dos conceitos de temporalidade, singularidade e incerteza.

A temporalidade refere-se ao fato de todo projetoapresentar um ciclo de vida, com começo e fim definidos; a singularidade ou unicidade dos projetos está no fato do produto, serviço ou resultado ser exclusivo; já a incerteza pode estar presente devido à natureza exclusiva dos projetos, a complexidade das atividades e aos objetivos específicos dos projetos (RABECHINI Jr.; CARVALHO, 2009; PMI, 2008).

A gestão de projetos é conceituada pela aplicação de conhecimentos, competências, ferramentas e técnicas às atividades do projeto, realizadas através da aplicação e da integração de várias fases do ciclo de vida do projeto (RABECHINI Jr.; CARVALHO, 2009; PMI, 2008). Esta área do conhecimento pode ser visualizada sob três perspectivas: estratégica, organizacional e operacional (ARCHIBALD, 2005; ANSELMO; MAXIMIANO, 2010).

Anselmo (2009) apresenta um modelo, para gestão de projetos, baseado em três fases: comercial, transferência e operacional. A fase comercial tem como objetivo transformar as oportunidades em contratos, no âmbito da estratégia da empresa. Quando isso ocorre, as informações, os requisitos dos clientes e os conhecimentos são formatados para uma transferência eficaz e eficiente para a equipe de execução. Trata-se da fase de transferência.

Na fase operacional ocorre a execução do plano do projeto elaborado e validado nas fases anteriores. Como parte dela, os processos de suporte e manutenção visam explorar comercialmente oportunidades de novos negócios, os quais culminam em aditivos contratuais do projeto existente ou até mesmo em novos projetos.

O processo de encerramento da fase operacional tem por objetivo, após o cumprimento de todas as obrigações com o cliente, executar as ações para a efetiva finalização do projeto, isto é, o encerramento administrativo e a formalização das lições aprendidas, discutidas e registradas durante todo o projeto.

 O modelo de Anselmo (2009) é pautado nas perspectivas operacional, organizacional e estratégica, mas não apresenta aplicações práticas em todos os seus elementos, apesar de bem detalhado. Um desses elementos é a AO, considerada por meio das atividades de discussão e registro de lições aprendidas no decorrer do projeto, embora seja previsto um momento para a formalização desta atividade no processo de encerramento do empreendimento.

3. Processo de Aprendizagem Organizacional

Na perspectiva da teoria da criação do conhecimento organizacional, os formatos em tácito e explícito devem interagir para que o trabalho seja efetivo, formando um processo de conversão contínuo e repetitivo de maneira a estimular a transferência do conhecimento dentro da organização.  Para Nonaka e Peltokorpi (2006) a transferência do conhecimento envolve os métodos utilizados para estimular os modos de conversão do conhecimento propostos no modelo SECI (Socialização, Externalização, Combinação e Internalização).

Para Aggeri et al. (2008), AO é a forma pela qual as organizações constroem, suplementam e organizam conhecimentos e procedimentos para realização de atividades organizacionais; é como adaptam e desenvolvem eficiência organizacional para  melhorar o uso das capacidades dos sujeitos. A AO visa estabelecer métodos que facilitem a articulação do conhecimento tácito em explícito, num formato a ser reutilizado.

O processo de aprendizagem organizacional ocorre quando as pessoas são capacitadas ou têm habilitadas a criar (externalizar), adquirir (internalizar) e transferir (socializar) conhecimentos, assim como modificar comportamentos através de reflexões sobre estes conhecimentos (GARVIN, 1993; GARVIN et al., 2008).

Outra perspectiva de visualização da AO, discutida por Newell e Edelman (2008), é baseada em: (i) acumulação de experiência– internalização do conhecimento prático e seu uso para melhorar as práticas futuras; (ii) articulação – ocorre quando a equipe reflete sobre os êxitos e os fracassos do projeto. Consiste na criação de um ambiente social em que as pessoas compartilham as ações tomadas sobre os êxitos e fracassos e os seus efeitos; e (iii) codificação– externalização do conhecimento por meio de sua captura e da estruturação.

É importante considerar que se pode utilizar acumulação de experiência como suporte à aprendizagem interprojetos independentemente da articulação e da codificação. Contudo, para codificar o conhecimento e o aprendizado é necessário que ambos sejam previamente articulados. (NEWELL; EDELMAN, 2008).

3.1. Tipos de aprendizagem Organizacional

Há diversos caminhos para se processar o aprendizado em projetos: o aprendizado pós-projeto, que permite indivíduos e equipes, em uma visão retrospectiva, não se certificarem apenas do cumprimento dos procedimentos, mas tirarem lições positivas e negativas a partir da experiência; o aprendizado durante o projeto, que exige pontos de verificação onde o projeto é constantemente avaliado, definindo-se por sua continuidade, paralisação temporária ou suspensão em definitivo; e a resolução sistemática de problemas ainda nas fases iniciais do desenvolvimento do projeto (RUY; ALLIPRANDINI, 2008).

Kotnour e Vergopia (2007) apresentam dois tipos de aprendizagem: interprojetos, que consiste na transferência do conhecimento de um projeto para outros projetos, e intra-projeto, definido em função da criação e aquisição de conhecimento no decorrer do projeto para seu reuso em benefício do próprio projeto.

A AO costuma ser dividida em aprendizagem de "ciclo único" (intra-projeto) ou "ciclo duplo" (interprojetos). O ciclo único ocorre quando problemas são detectados e corrigidos, mas o aprendizado decorrente daí não implica em nenhum impacto efetivo na maneira pela qual as atividades e procedimentos são executados nas organizações. O ciclo duplo ocorre quando o erro é identificado e solucionado, mas o aprendizado envolve modificação dos princípios, normas, práticas, políticas e objetivos vigentes (ARGYRIS, 1977; NEWELL; EDELMAN, 2008).

A Figura 1 representa um modelo de AO na gestão de projetos, considerando os ciclos único e duplo da aprendizagem.

Figura1. Modelo de Aprendizagem Organizacional
Fonte: Adaptado de CLARK; WHEELWRIGHT (1993) e RUY; ALLIPRANDINI (2008)

Depreende-se da Figura 1 que os conhecimentos gerados e as lições aprendidas podem ser úteis para realização de melhorias em nível do projeto específico (ciclo único) que os originou ou em nível de programas e portfólio dos projetos (ciclo duplo), exigindo para isso modificação em valores fundamentais, nas cinco áreas de foco da aprendizagem, que orientam as práticas organizacionais da gestão de projetos.

Garvin (1993) define uma organização que aprende aquela que desenvolve a habilidade em desempenhar cinco atividades principais (Figura 2).

Figura2. Atividades da Aprendizagem Organizacional (AO)
Fonte: Adaptado de GARVIN (1993)

A aprendizagem com os outros ocorre por meio das práticas e vivências de outras organizações e de outros agentes externos. Os caminhos possíveis para desenvolver esta atividade são a execução de benchmarking e a interface com os consumidores (GARVIN, 1993).

A experimentação de novas abordagens envolve a busca sistemática de melhorias (melhoria contínua) e o teste de novas tecnologias (inovações tecnológicas), almejando o aproveitamento de oportunidades e a ampliação de horizontes, e não simplesmente a solução de dificuldades conhecidas (GARVIN, 1993).

A aprendizagem com as próprias experiências ocorre quando as organizações reveem suas práticas, os seus sucessos e fracassos, avaliando-os sistematicamente e registrando as lições aprendidas para que as mesmas possam ser reutilizadas (GARVIN, 1993; GREER, 2008; KOTNOUR; VERGOPIA, 2007; WEBER et al., 2010).

No que tange a atividade de transferência de conhecimento, em uma empresa que implementa múltiplos projetos, em cada deles são criados conhecimentos que podem ser aproveitados em outros (NOBEOKA; CUSUMANO, 1995; WILLIAMS, 2008).

Na transferência sequencial o conhecimento e as experiências são passados do projeto base para o novo projeto, sempre após o primeiro ter terminado (NOBEOKA; CUSUMANO, 1995). Esta abordagem é mais popular na literatura, que discute em maior ou menor grau o tema Aprendizagem Organizacional por meio das conhecidas auditorias pós-projeto, revisões que ocorrem no encerramento do projeto(GOFFIN et al., 2011; GOFFIN et al., 2010; HOEGL; SCHULZE, 2005; WILLIAMS, 2008; RUY; ALLIPRANDINNI, 2008).

Outro veículo promocional da AO é a dinâmica de resolução sistemática de problemas, o que significa uma maneira disciplinada para a identificação, análise, interpretação e solução de eventos indesejáveis ou problemáticos (BOUGEON, 2007; GARVIN, 1993).

Como síntese conclui-se que o tratamento do processo de aprendizado em gestão de projetos pode ser induzido por procedimentos organizacionais, elaborados a partir da incorporação de conhecimentos e lições aprendidas advindas da prática. O processo é favorecido quando tratado em momentos formais, normalmente estabelecidos ao longo da linha temporal dos projetos para avaliar questões técnicas bem como os aspectos gerenciais ou em momentos de encerramento dos projetos. A sistematização da resolução de problemas é outro vetor da aprendizagem organizacional.

4. Método de pesquisa

A realização desta pesquisa foi baseada nos ciclos contínuos da pesquisa-ação estabelecidos por Coghlan e Brannick (2005), divididos em duas fases: a fase preliminar, composta pela compreensão do contexto e propósito, e a fase principal, que compreende os passos de diagnóstico, plano de ação, implementação e avaliação da ação.

 Como técnica de coleta de dados e informações foram empregados múltiplos meios, entre os quais entrevistas e aplicação de questionário junto aos coordenadores de projetos, análise documental, contatos via e-mail, resultados de auditorias e reuniões com a alta direção.

Para as análises, os dados e as informações foram reduzidos (selecionadas, focadas, simplificadas conforme sua relevância para a pesquisa) em textos escritos em forma de narrativas e tratados de modo a facilitar a identificação de inter-relações com as seguintes atividades da AO: aprendizagem com as próprias experiências, transferência de conhecimento e resolução sistemática de problemas.

Modelo da pesquisa de campo

Diante da revisão bibliográfica, conclui-se que as áreas do conhecimento aprendizagem organizacional e gestão de projetos podem ser operacionalizadas paralela e integradamente, especialmente quando atividades em comum são regidas por procedimentos. É notável também que essas áreas mantêm uma relação considerável com a sistematização dos processos e procedimentos estabelecidos em uma organização.

Ambas as áreas colocam como central a transferência de conhecimentos explícitos e de experiências, a modalidade tácita do conhecimento. Admitem também como potencializador da AO a criação de espaços de negociação para resolução de problemas, dado que estes, especialmente nas áreas de engenharia, envolvem uma série de atores, interesses e disciplinas.

Para investigar  esses conceitos, o modelo de pesquisa (Figura 3) esquematiza o relacionamento entre as áreas do conhecimento supracitadas e serve de referência para delinear a pesquisa-ação.

Figura 3. Modelo de pesquisa

Na parte superior da Figura 3 estão representados os grupos de processos da gestão de projetos que são foco deste artigo: planejamento e execução. A parte inferior destaca três atividades da AO, pautadas em Garvin (1993) e representadas por: I) aprendizado com as próprias experiências, II) resolução sistemática de problemas e III) transferência de conhecimentos explícitos. O elo que garante evidências da aprendizagem interprojetos é representado pela definição de processos e pelo estabelecimento de procedimentos documentados.

A primeira atividade é adequada na medida em que no mundo das empresas de engenharia consultiva da Construção Civil a experiência e a qualificação da mão de obra são os principais ativos de competitividade. Sem demonstrar experiência comprovada no seu campode atuação, uma empresa sequer se habilita a determinados processos de licitação.

As próprias experiências de uma empresa se confundem com as próprias experiências da mão de obra, os quais devem comprovar vínculos com a empresa além de registros em CREA's (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) e atestados de capacidades técnicas.

O que está em jogo do ponto de vista da aprendizagem não se restringe à comprovação formal da experiência da mão de obra, mas também a capacidade da empresa em realizar a atividade de transferência do conhecimento gerado para projetos similares, de modo que, além de evitar erros e evidenciar as práticas bem-sucedidas, esses projetos sejam executados eficientemente dentro dos prazos apertados, dado a atual e relativa elevada demanda por serviços no mercado na construção civil.

Abordar a atividade de resolução sistemática de problemas mostrou-se fundamental em função da sua possibilidade de gerar conhecimento explícito e tácito num meio em que é incomum categorizá-las, evidenciá-las e registrá-las, seja por falta de hábito seja por "imposições" de clientes.

No modelo são estabelecidas relações entre as atividades do aprendizado, uma vez que as experiências geram conhecimentos (tácitos) passíveis de serem transferidos, bem como a resolução sistemática e documentada de problemas geram o formato explícito. Por outro lado, cada vez que um problema é resolvido, os envolvidos na ação internalizam conhecimento tácito e incrementam suas experiências, as quais, por sua vez, capacitam esses em resolver ou evitar a ocorrência de problemas similares.

Assim, considera-se que as três atividades (I, II e III) interagem de forma complementar, incrementando o processo de Aprendizado Organizacional.

Os ciclos contínuos da pesquisa-ação, estabelecidos por Coghlan e Brannick (2005) e aplicados em cada atividade do aprendizado pelo menos uma vez, também estão destacados no modelo (Figura 3).

5. Apresentação dos resultados da pesquisa-ação

5.1. Caracterização da empresa

A pesquisa-ação foi desenvolvida em uma empresa de engenharia consultiva, de médio porte, sediada na região metropolitana de São Paulo (SP) e conta com quadro funcional composto por cerca de 300 profissionais, majoritariamente formado por arquitetos e engenheiros.

A empresa elabora estudos e projetos e oferta serviços na implantação dos empreendimentos, realizando tarefas de gerenciamento e supervisão e fiscalização de obras. As áreas de atuação na execução desses serviços são: transporte, energia, saneamento, infraestrutura hídrica, meio ambiente e mineração etc. Os principais clientes são corporações da iniciativa pública, grandes construtoras e consórcios.

Os serviços prestados são consubstanciados em relatórios contendo memoriais descritivos, memoriais de cálculo, desenhos, especificações técnicas, planilhas orçamentárias e demais documentos correlatos que possibilitam a implantação de empreendimentos.

São definidos como principais processos a comercialização e a execução. Compete à comercialização a conquista de novos negócios, análise crítica detalhada dos requisitos dos clientes e a elaboração de propostas. Para atender aos requisitos do contrato firmado pelas partes e ao seu respectivo programa de necessidades, inicialmente é elaborado o Plano de Execução do Projeto (PEP), no qual inclui, entre outros, o planejamento dos recursos necessários, das atividades e dos controles a serem aplicados durante a execução dos contratos. A periodicidade de controle e monitoramento do PEP é definida pelo coordenador do contrato.

Durante o processo de execução do projeto estudos são realizados e relatórios elaborados, que são verificados pela equipe e, após análise crítica, são aprovados pela coordenação do projeto antes da entrega do produto parcial ou final ao cliente para validação e aceite.

Considerando a execução e o seu planejamento, na sequencia do artigo são apresentadas as aplicações dos ciclos contínuos da pesquisa-ação nas três atividades da AO: aprendizado com as próprias experiências, a resolução de problemas e a transferência de conhecimentos.

5.2. Ciclo I: Aprendizado com as próprias experiências

Etapa I.a – Diagnóstico

Os elementos que caracterizam a gestão de projetos estabelecem interações não somente na prática, mas também formalmente por procedimentos implantados pelo Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) da empresa. Posto isso, identificou-se carência na sistematização em requisitos de identificação, retenção, proteção e reuso dos conhecimentos e do aprendizado originados de projetos anteriores e semelhantes.

A alta administração e os coordenadores da empresa entendem que parte desses requisitos é fundamental para efeito de crescimento na área da engenharia consultiva, cujo principal ativo de competitividade é a oferta de conhecimentos e experiências.

Para o departamento da qualidade esses quatro requisitos são fatores críticos para a melhoria contínua do SGQ e, portanto, estabeleceu a necessidade de incorporá-los em procedimentos.

Etapa I.b – Plano de Ação

Em busca do atendimento ao requisito de identificação de informações e conhecimentos originados de projetos anteriores e semelhantes algumas propostas foram discutidas no grupo da pesquisa-ação montado no início da pesquisa na empresa.

A ação priorizada foi a inclusão do referido requisito em um procedimento que sistematizasse o planejamento e a execução dos trabalhos. Para obter informações concretas acerca da possibilidade de reaproveitamento de acervo técnico e experiências de outros projetos foi estabelecida a obrigatoriedade da tratativa do tema em um procedimento denominado Plano de Execução do Projeto (PEP),o qual especifica os passos necessários para o planejamento, a execução e o controle dos projetos, partindo-se de requisitos definidos pelos clientes.

Adicionalmente, como uma das solicitações para a elaboração do PEP de cada projeto inseriu-se o levantamento do Capital Intelectual de outros projetos similares, inter-relacionando ambos: o acervo técnico e o capital humano do projeto.

Etapa I.c – Implementação

Realizado o treinamento sobre o procedimento, determinou-se que a partir da data da sua vigência, caberia ao coordenador do projeto elaborar o PEP e submetê-lo às aprovações das diretorias financeira e técnica.

Especificamente sobre o capital intelectual, os coordenadores que elaboraram o PEP tenderam de modo geral a relacionar os projetos com o capital humano que nestes desenvolveram atividades. O Quadro 1 mostra uma aplicação desse relacionamento.

Quadro 1. Aprendizagem Interprojetos com as próprias experiências
Fonte: Documentação da Empresa

O Quadro 1 esquematiza um relacionamento entre as informações de projetos anteriores e semelhantes (acervo bibliográfico) e o respectivo capital humano que neles desenvolveram atividades, ou seja, pessoas que incorporaram experiências em projetos similares e detentoras de know-how ou de conhecimento internalizado. Na definição da equipe de um novo projeto levou-se em consideração as pessoas com experiências similares citadas no Quadro 1.

Etapa I.d – Avaliação

Com base na análise da elaboração do PEP de dezenove projetos, observou-se atendimento ao item capital intelectual na íntegra. Os resultados mostraram que os coordenadores planejam reusar o acervo bibliográfico e documentos digitais de pelo menos um projeto anterior semelhante, seja uma planilha de cálculo, textos, curva paramétrica de custos, dimensionamentos, projeto básico ou outro PEP.

O capital intelectual citado como referência é de fato consultado no desenrolar do projeto, mesmo porque membros de equipes e coordenadores trabalham em mais de um projeto simultaneamente, além de um layout organizacional que favorece a interação inter-equipe.

Pode-se citar como obstrução à transferência de conhecimentos a inexistência de um banco de dados organizado que armazene informações sobre projetos (anteriores, em andamento ou a desenvolver) para consulta geral. Esta carência tem levado as equipes de projeto ao reuso de acervo técnico, documentos e relatórios somente gerados por elas próprias em projetos passados, mas pouco tem estimulado a troca de experiências entre projetos conduzidos por equipes diferentes. Assim, nota-se a ocorrência de aprendizagem interprojetos, porém intra-equipe.

Este desestímulo ocorre em parte pelo fato da identificação e da codificação do acervo ser personalizada e, portanto, estabelecida pela equipe, sem o uso de padronização e sem qualquer esclarecimento formal para a organização. Além disso, não há um padrão de organização das pastas e arquivos dos projetos. Não basta o acesso geral a todos, pois é inviável e desgastante despender tempo procurando um material de referência no servidor sem conhecer o projeto e se efetivamente existe.

Esses fatores acarretavam dificuldade e desmotivação na busca de acervo técnico gerado por outras equipes devido à desorganização.

Por outro lado, apenas a solicitação para indicar o acervo técnico a ser reutilizado não permite afirmar a ocorrência ou não da transferência de conhecimento. A ação tomada mais objetiva que permitiu concluir com mais propriedade foi a implementação da política de restrição de acesso aos arquivos de todos os projetos desenvolvidos na empresa, o qual é liberado apenas por solicitação do interessado e aprovado pelo coordenador do projeto.

5.3. Ciclo II: Resolução sistemática de problemas

Etapa II.a – Diagnóstico

Desde o início de suas atividades até abril/2012 a empresa não possuía um método formal para tratar as ocorrências de situações problemáticas, sejam relacionadas à execução dos projetos seja nos produtos ofertados.

Parte dessa inexistência é justificada pela origem da empresa, formada pela união de um pequeno grupo de engenheiros, que pouco priorizava a resolução de problemas de modo sistemático.

Outro fator que obstruiu a implementação da referida resolução é a falta de conhecimento em métodos para tal. Independente da sua gravidade, quando um problema surge, imediatamente é atacado como forma de "apagar o incêndio" e o aprendizado resultante que daí poderia ser reaproveitado se perde. Adicionalmente, quando nas raras ocasiões em que um método é conhecido por gestores ou técnicos da empresa o mesmo é tratado com desconfiança e como uma burocracia.

Outro empecilho é conceitual: durante o desenvolvimento dos trabalhos (designs, relatórios, desenhos, mapas etc), o contorno daquelas situações significativas que representam um "problema" ainda não é bem definido.

Essa dificuldade em classificar os problemas ocorre em função das características das atividades executadas: o ato de projetar, a apresentação de propostas de engenharia e a submissão de relatórios de estudos são atividades dinâmicas; se alguma cota no desenho, alguma parede na planta ou alguma conceituação no relatório está "errada", elimina-a após a sua identificação. Declarar isso como um problema a ser tratado sistematicamente não é prática ou, às vezes, é inibido pelo cliente.

Além do mais, uma característica fundamental do setor é a interatividade com o cliente corporativo, subcontratados, empreiteiras e empresas consorciadas, entre outros stakeholders. Antes mesmo de uma entrega parcial ou final, são comuns as idas-e-vindas de documentos em mídia digital entre os atores envolvidos no empreendimento. Sendo múltiplos os atores de projeto e muitos os arquivos digitais, diversas são as possibilidades de transitar os documentos. Consequentemente, o intercâmbio de documentos com sugestões de melhoria, observações, rabiscos, críticas e comentários é de difícil controle, que se intensifica quando uma mudança de escopo do projeto é solicitada ou quando há proximidade amigávelentre os parceiros, uma situação frequente na engenharia consultiva.

De qualquer modo, definiu-se que uma ação deveria ser planejada e implementada visando contemplar o tratamento e o controle sistemático das situações problemáticas. A ação definida foi a elaboração e aplicação obrigatória de um procedimento denominado Controle de Produto Não Conforme.

Etapa II.b – Plano de Ação

O passo inicial foi tentar cercar a definição de "problema" ou "Não Conformidade" (NC) em produtos ou em processos de trabalho. Inicialmente quatro tipos de problemas foram definidos:

Ao identificar cotidianamente o problema e os seus tipos, o passo seguinte é registrá-lo num formulário (Plano de Ação Corretiva - PAC), definindo as ações imediatas e corretivas, obedecendo as cláusulas contratuais para eliminação do problema.

Etapa II.c – Implementação

Estabelecido o procedimento "Controle de Produto Não Conforme" para sistematizar a identificação e tratamento de problemas, o seu uso entrou em vigência após sessões de treinamentos destinados a todos os envolvidos em projetos com formação superior.

Etapa II.d – Avaliação

Especialmente para o processo de elaboração de estudos e projetos de empreendimentos, o tratamento sistemático dos problemas por meio de relatórios emitidos (pós-entrega) mostrou-se inviável e pouco ágil. Dada a intensidade elevada de idas-e-vindas de relatórios, desenhos, estudos, mapas etc, o tratamento sistemático dos produtos devolvidos pelos clientes com comentários, observações e solicitações de modificações tornou-se de difícil aplicação.

A solução negociada foi compactar em um único PAC diversos produtos "devolvidos", cujos critérios de junção poderiam ser por dia, por semana e por disciplina etc.

Novamente, enfrentaram-se dificuldades na aplicação devido à obrigatoriedade de registrar, ou minimamente mencionar no PAC, e tratar todos os tipos de problemas inerentes às devoluções, incluindo desde os de menor impacto para a qualidade do produto/serviço até os de gravidade maior. As dificuldades se tornaram aparentes devido ao fato de pequenas observações emitidas pelo cliente serem tratadas similarmente aos problemas mais graves no formulário. A revisão desse procedimento apontou a necessidade de uma ação que estabelecesse um critério de importância dos problemas a serem tratados sistematicamente.

A nova ação delegou ao coordenador do projeto a arbitrariedade de definir a relevância do problema e, quando pertinente, tratá-lo sistematicamente no PAC, de modo que este registro se torne uma lição aprendida a ser evitada posteriormente.

Apesar de ainda não ser possível verificar a eficácia desta forma de abordar o tema, ela conquistou maior adesão entre os projetistas, coordenadores de projetos e diretores da empresa. Contudo, alguns destes ainda relutam em evidenciar a aplicação de análise sistemática dos problemas arbitrados como mais graves, em especial quando o cliente exige sigilo absoluto no tratamento dos seus negócios. Por outro lado, a arbitrariedade de registrar ou não o problema é vista por alguns destes com certa desconfiança, pois teme-se criar provas contra si, ou até mesmo evidenciar a sua falta de competência.

Quanto aos problemas considerados de menor relevância, identificou-se em alguns projetos certo controle dos documentos emitidos e devolvidos com comentários e solicitação de modificações. O controle consiste em emitir tais documentos em sua revisão (0a ou 1a, 2a,...) para os clientes ou parceiros, os quais tecem considerações ou solicitam modificações e devolve-a para que seja emitida uma revisão (0b ou 1b, 2b,...). Essa dinâmica é então seguida até a aprovação final do cliente, que é codificado em sua revisão (0 ou 1, 2,...). Essas considerações dos clientes são tratadas em certos casos em planilhas e o controle das revisões é realizado em listas de controles.

5.4. Ciclo III: Transferência de conhecimentos

Etapa III.a – Diagnóstico

Até meado de 2011 os arquivos dos projetos eram contemplados em um servidor, desdobrado em pastas denominadas PROPOSTAS, PRJ e ARQ, acessíveis aos funcionários da empresa, exceto a pasta PROPOSTAS, de acesso restrito e utilizadas no processo de comercialização.

Na pasta PROPOSTAS são inseridos todos os arquivos processados na elaboração de propostas aos clientes. Aceita uma proposta pelo cliente, um contrato é pactuado; porém a transferência ao coordenador do projeto de alguns documentos importantes para a execução do projeto não era formal.

Esses documentos são denominados requisitos de entrada e incluem, entre outros: contrato assinado e sua respectiva análise crítica do contrato, edital, propostas técnica e comercial, termo de referência etc. Eles são outputs e inputs dos processos de comercialização e de execução, respectivamente.

Em PRJ subpastas relacionadas aos projetos eram abertas para que o produto fosse processado. Elas eram nomeadas com um código do tipo 1221-ETG (quatro números para referenciar ao centro de custo do projeto e três letras para identificar o cliente). Internamente a essas subpastas, a disposição de arquivos era desordenada e sem estruturação.

Na pasta ARQ, além das subpastas Documentos Administrativos e Relatórios Técnicos, incluiu-se a subpastaRequisitos de Entrada, criada após a assinatura do contrato e alimentada pelo departamento comercial com documentos gerados na etapa de comercialização, na pasta PROPOSTA. Mesmo assim esta estrutura evidenciou problemas de cunho organizacional.

Primeiro, os outputs do processo de comercialização são passados de forma sequencial, com problemas de comunicação e integração ocorrendo na interface entre as equipes comercial e de execução do projeto. A passagem de "bastão" era concretizada na subpasta Requisitos de Entrada, de acesso irrestrito após a sua criação em ARQ.

Segundo, os processos de remessas de documentos, emissão de cartas e de documentos avulsos e formatação de relatórios que, embora ocorram durante a execução dos projetos, eram "culturalmente" organizadas e controladas pelo pessoal administrativo e comercial na subpasta Documentos Administrativos.

Apesar do acesso irrestrito em ARQ e em PRJ, há organização e controle somente naquela. A empresa permitia o compartilhamento e acesso irrestrito da documentação entre todos os níveis hierárquicos, mantendo uma cultura de confiança nas pessoas, enraizada quando a empresa era pequena.

Certamente o fato de se trabalhar em servidor que permite a criação de pastas e arquivos de modo ilimitado e irrestrito é fator fundamental para explicar a desintegração interdepartamental e a criação da barreira maior para a transferência de conhecimentos. Em ambiente sem procedimentos e regras e que permita a desorganização, quem se organiza assume controle das informações e dos conhecimentos.

Este tipo de controle concentrado em mãos de um pequeno grupo, indiretamente envolvido com a execução do projeto, é objeto de uma ação a ser implementada. Entendeu-se que documentos administrativos e requisitos de entrada devem ser de conhecimento e controle, também e minimamente, do coordenador do projeto.

O diagnóstico até aqui descrito suscitou a necessidade de ação que vislumbrasse desobstrução na transferência interdepartamental de informações e conhecimentos, integrando as informações relacionadas ao projeto em uma única base de dados de modo a possibilitar o acesso e controle de documentos e arquivos pelos envolvidos nele, bem como por membros de outras equipes de projetos.

Etapa III.b – Plano de Ação

O plano de ação que afeta a transferência de conhecimento consiste em estruturar os diretórios de informações de modo que arquivos e documentos, desde o seu processo de comercialização até as atividades finais, estejam concentrados em suas respectivas pastas de projetos, relacionadas com centros de custos dos contratos conquistados. Posteriormente, será implementada a estratégia de controle de acesso às diversas pastas e arquivos dos projetos.

A ação priorizada e planejada consistiu em adotar uma estrutura padrão de pastas e subpastas, na qual inclui a ARQ.

Definiu-se que, para projetos antigos, a estruturação das pastas se manteria, caso contrário a organização e controle sobre o ARQ até então se perderiam, afetando crucialmente a rastreabilidade do conhecimento e das informações de projetos anteriores; e, secundariamente, links entre arquivos e projetos poderiam seriam inativados.

O planejamento inicial para implementar a estrutura era por volta de dois meses, entretanto as resistências e as críticas, sobretudo dos setores comercial e administrativo, tornaram-se intensas de modo que a implementação ocorreu oficialmente seis meses após o planejamento inicial.

Etapa III.c – Implementação

A implementação da estrutura demandou diversas rodadas de discussões. Um lote de dez projetos piloto foi utilizado para embasar as discussões e no sexto mês a estrutura foi rediscutida com coordenadores, setores comercial e administrativo e, por fim, com a diretoria, a qual aprovou a implementação, gerando a elaboração do procedimento.

A estrutura padrão implementada, mostrada na Figura 4, contempla a integração de informações e conhecimentos de diversos setores da empresa, e também das diversas fases do projeto, desde a fase de comercialização.

Figura 4. Estruturação das pastas de projetos
Fonte: Documentação da Empresa

Conforme representado na Figura 4, a estrutura padrão dos projetos é composta por seis pastas, codificadas da seguinte forma: Coordenação, Arq, Documentos de Referência, Execução, Produtos Entregues e Qualidade.

A partir do projeto 1221-EGT, na pasta Coordenação a subpasta Requisitos de Entrada é alimentada com requisitos de entrada pelo setor Comercial. A pasta Arq continua com o mesmo formato até meado de 2011, entretanto foi incorporada na estrutura padrão do projeto.

A pasta Documentos de Referência contempla os documentos  necessários para a execução do projeto, incluindo os recebidos, seja de parceiros em consórcios, de clientes, de empreiteiras, de fornecedores etc. São documentos de referência, ou que compõem requisitos e obrigações para a execução do projeto.

A pasta Execução é onde efetivamente o produto é elaborado (work in process); nela os técnicos, desenhistas e engenheiros realizam os estudos, discutem os projetos e estudos,elaboram os relatórios de gerenciamento, os quais posteriormente são trabalhados na subpasta Relatórios Técnicos (em Arq) pelo setor administrativo antes da entrega do produto parcial ou final ao cliente. Feito isto, o produto é transferido para a pasta Produtos Entregues, onde há controle do "produto acabado".

Por fim, a pasta Qualidade, onde são armazenados os registros e documentos da qualidade de acordo com o procedimento do SGQ. A subpasta PACs é reservada para o tratamento sistemático dos problemas que surgem no decorrer da execução do projeto.

Com essa estrutura, quaisquer tipos de documentos que compõem o acervo técnico, quaisquer requisitos de entrada, quaisquer problemas enfrentados são passíveis de serem rastreados e reutilizados, caso o interessado tenha acesso ao documento. Caso não, cabe-lhe solicitar ao coordenador do projeto.

Após o uso inicial da estrutura apresentada na Figura 4 a empresa planejou nova ação, baseada na política de acesso às pastas e subpastas, visando proteção ao produto do cliente e/ou do conhecimento organizacional.

A ação previa um controle de acesso aos arquivos dos projetos em função dos níveis hierárquicos e da relação das atividades da pessoa com o projeto. A política de restrição contemplaria então os seguintes graus de acessos: controle total, somente leitura e restrição total.

A política de controle passou então a ser implementada, entretanto como não se tinha clara a noção acerca da necessidade de muitas pessoas acessarem os diversos projetos passados ou em andamento como fonte de aprendizado e reuso de conhecimento gerado, foi estabelecido que os acessos as documentos da estrutura padrão das pastas seriam definidos pelos coordenadores dos projetos.

Medir objetivamente a ocorrência efetiva do reuso do aprendizado e do conhecimento gerados era difícil. Até então apenas eram citados no Plano de Execução do Projeto. Na etapa de planejamento o coordenador deste é obrigado a levantar e mencionar projetos similares ao que ele conduzirá, para os quais pode solicitar acesso ao acervo.

Com essa ação de restringir acessos foi possível obter evidências objetivas da transferência do conhecimento à medida que as solicitações de acessos aos acervos passaram a se concretizar. 

Etapa III.d – Avaliação

A implantação da estrutura padrão de pastas atrelada à adoção da política de restrição de acessos a elas esbarrou em dificuldades tais como receio do pessoal administrativo e comercial de compartilhar documentos com as equipes de execução dos projetos, vistas como pouco organizadas.

Posterior ao uso da estruturação padrão, identificou-se a possibilidade da duplicação de documentos de relatórios e de estudos, os quais poderiam ser contemplados na subpasta Arq\Relatórios Técnicos e na pasta Produtos Entregues. A tendência é que a primeira delas seja utilizada para armazenamento dos documentos formatados e emitidos aos clientes, enquanto que a segunda, para armazenar, além destes documentos, os desenhos e outros documentos.

A estrutura das pastas facilitou o armazenamento e a rastreabilidade dos documentos gerados nos estudos e de outros registros, dentre os quais se pode citar aqueles que contemplam situações problemáticas enfrentadas e resolvidas ou não, as quais  geram aprendizado externalizado por meio de ações imediatas e corretivas. Esses registros passaram a ser inseridos na subpasta PACs (Planos de Ação Corretiva) dos respectivos projetos,possibilitando acompanhamento das ações decorrentes, transformando-as em oportunidades de melhorias para outros projetos.

6. Considerações finais

A pesquisa-ação relatada neste artigo se propôs a implementar ações que estimulam a prática da Aprendizagem Organizacional (AO) na gestão de projetos em uma empresa de engenharia consultiva que atua no ramo da construção civil, a partir do referencial teórico sobre aprendizagem organizacional em projetos. A prática de aprendizagem da empresa foi analisada e desenvolvida com base em três atividades da AO propostas por Garvin (1993): aprendizagem com as próprias experiências, a resolução sistemática de problemas e a transferência de conhecimentos.

Na descrição do modelo da pesquisa considerou-se que práticas associadas a essas três atividades para aprendizagem  representam estratégias para o desenvolvimento de experiências bem como para gerar conhecimentos explícitos, ambos passíveis de serem transferidos interprojetos. Assim, durante a pesquisa ação foram desenvolvidos e aplicados procedimentos para a sistematização da atividade de resolução de problemas, para aprendizagem a partir das próprias experiências e para a transferência de conhecimentos interprojetos.  Esses procedimentos atuaram como elemento intermediador da aprendizagem interprojetos.

 Nos ciclos de aplicação da pesquisa-ação, para cada uma das três atividades de aprendizagem, oportunidades de melhorias foram identificadas, implementadas e avaliadas. Entretanto, como as ações em busca de melhorias seguem um ciclo contínuo no universo organizacional estudado, foram elencadas recomendações para continuidade da melhoria da aprendizagem interprojetos.

O estabelecimento de procedimentos e seus usos evidenciaram questões importantes na organização, até então pouco consideradas, tais como a codificação personalizada do acervo técnico ou mesmo estabelecida pelo cliente ou por um parceiro e líder de consórcio como forma de controlar a documentação.

Também foram evidenciados problemas como:

Para as duas primeiras dificuldades foram desenvolvidas ações de melhorias, que tratam da padronização dos locais de armazenamentos dos documentos de projetos e do controle de acesso a tais locais. Este controle possibilitou obter indícios do reuso dos conhecimentos de outros projetos.

Para que as duas últimas dificuldades sejam superadas, conjugando os interesses do negócio e os aspectos da Aprendizagem Organizacional, recomenda-se, respectivamente:

Estas recomendações não podem eliminar a arbitrariedade dos coordenadores em indicar outras categorias de problemas e oportunidades de melhorias, consideradas as especificidades dos projetos. Em face destas ações, tanto estes atores como toda a equipe de projeto terão sob seus domínios o mapeamento de problemas a serem evitados.

Do ponto de vista teórico confirmou-se que as atividades básicas da aprendizagem, propostas por Garvin (1993), e consideradas nesta pesquisa-ação, favorecem o trânsito de conhecimentos interprojetos, sejam eles no formato explícito ou tácito. Isso ficou evidente a partir do estabelecimento e da dinâmica de implantação dos procedimentos associadas a essas atividades e analisados sob a perspectiva dos ciclos da pesquisa-ação. Os procedimentos estabelecidos na empresa foram vistos como o elemento intermediador da aprendizagem organizacional, em especial quando se trata dessas três atividades da aprendizagem.  A dinâmica constante de alteração dos procedimentos por si confirmam a prática da melhoria contínua, uma forma de aprendizagem que eleva o patamar do conhecimento organizacional acerca dos seus processos.

Novos estudos nesta área podem complementar a abordagem de atividades propostas por Garvin (1993) não cobertas por este estudo, como a aprendizagem com os outros e a experimentação de novas abordagens, incrementando o conhecimento acerca da Aprendizagem Organizacional em processos de projetos no contexto da engenharia consultiva.

Referências

ABDI - AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO.  Relatório de Engenharia Consultiva no Brasil: Desafios e Oportunidades. [Acesso em: 15 março 2012] Disponível em: http:// http://www.abdi.com.br.

Aggeri, F.; Elmquist, M.; Pohl, H. (2008); Managing Learning in The Automotive Industry – The Race for Hybridisation. 16th GERPISA International Colloquium, Paris.

Anselmo, J. L.(2009); Gerenciamento de projetos em negócios baseados em projetos: uma proposta integrada das dimensões operacional, organizacional e estratégica. Tese (Doutorado em Administração) – Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, 419 p.

Anselmo, J. L.; Maximiano, A. C. A. (2010); Gerenciamento estratégico em negócios baseados em projetos. XIII Simpósio de Administração da Produção, Logística e Operações Internacionais, São Paulo.

Archibald, R. D.  State of the Art of Project Management:  2005-2010. (2005);  Keynote  presentation to the PMI Milwakee/Southeast Wisconsin Chapter, Professional  Development Day.

Argyris, C. (1977); "Double loop learning in organizations", Harvard Business Review, Sep.-Oct., 115-125.

Bourgeon, L. (2007); "Staffing Approach and Conditions for Collective Learning in Project Teams: The Case of New Product Development Projects", International Journal of Project Management, 25(4), 413-422.

Coghlan, D.; Brannick, T. (2005); Enacting the Action Research Cycle. en: Doing action research in your own organization, London, SAGE Publications, 21-31p.

DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. Estudo Setorial da Construção. n. 56; Abr, 2011, [Acesso em: 14 março 2012]. Disponível em: http://www.dieese.org.br.

Garvin, D. A. (2008); "Is Yours a Learning Organization?", Harvard Business Review, 86(3), 1-9.

Garvin, D. A. (1993); "Building a learning organization", Harvard Business Review, 71(4), 78-91.

Goffin, K.; Koners, U.; Baxter, D.; Hoven, C. V. D. (2010); "Managing lessons learned and tacit Knowledge in new product development",Industrial Research Institute, Jul–Ago.

Goffin, K.; Koners, U. (2010); "Tacit Knowledge, Lessons Learnt, and New Product Development " Journal of Product Innovation Management, 28(2), 300-318.

Greer, S. (2008); "A Lessons-Learned Knowledge Management System for Engineers - An organizational lessons-learned system facilitates the transfer of knowledge from one project team to another ", Chemical Engineering, 115(8), Aug.

Hoegl, M.; Schulze, A. (2005); "How to support knowledge creation in new product development: an investigation of knowledge management methods ", European Management Journal, 23(3), 263-273.

Kotnour, T.; Vergopia, C. (2007); A Framework and Findings for Learning Based Project Reviews. PICMET 2007 Proceedings, 5-9 August, Portland, Oregon, USA.

Lo, T. K. M.; Fong, O. S. W. (2010); "Enhancing Quality of Lessons Learned: Evaluating Knowledge Management Practices in Project Management " 18th CIB World Building Congress. CIB Publication 349, 168-178.

Morgan, G. (2006); Imagens da Organização; São Paulo, Atlas, 381p.

Nobeoka, K; Cusumano, M. A. (995); "Multiproject strategy, design transfer, and project performance: a survey of automobile development projects in the US and Japan", IEEE Transactions on Engineering Management, 42(4), 397-409.

Newell, S. M., Edelman, L. F. (2008); "Developing a Dynamic Project Learning and Cross-Project Learning Capability: Synthesizing Two Perspectives", Information Systems Journal, 18(6), 567-591.

Nonaka, I. Peltokorpi, V. "Knowledge-based view of radical innovation: Toyota Prius case". Science and Institutional change: a research handbook, Oxford University Press, UK. 2006. [Acesso em: 14 agosto 2010]. Disponível em: http://ic.ucsc.edu/~rlipsch/EE80S/Nonaka.pdf.

PMI - Project Management Institute (2008); A Guide to the Project Management Body of Knowledge (PMBoK Guide). Pennsylvania, Project Management Institute, 337p.

Puga, F. P.; Borça Jr, G. (2011); Perspectivas de investimento em infraestrutura 2011-2014. Em Visão do Desenvolvimento. Publicação eletrônica do BNDES, 92(25) [Acesso em: 17 maio 2011]. Disponível em: http://www.bndes.gov.br.

Rabechini Jr, R.; Carvalho, M. M. (2009); Gerenciamento de projeto na prática: casos brasileiros; São Paulo, Atlas, 220p.

Ruy, M.; Alliprandini, D. H. (2008); "Organizational learning in the new product development process: findings from three case studies in Brazilian manufacturing companies", Int. J. Technology Management, 44(3/4), 461-479.

Sabbatini, R. "Engenharia Consultiva no Brasil: desafios e oportunidades", Debates Finep. Rio de Janeiro, 28 de Junho de 2012. [Acesso em: 02 agosto 2012]. Disponível:  http://download.finep.gov.br/DebateFinep/palestraEngenhariaConsultiva.pdf.

SINAENCO – Sindicato da Arquitetura e da Engenharia. [Acesso em: 19 novembro 2011]. Disponível em: http://www.sinaenco.com.br/.

Weber, R.; Aha, D. W; Muñoz-Ávila, H.; Breslow, L. A. (2010); "An Intelligent Lessons Learned Process", Lecture Notes in Computer Science, 1932(2010), 39-41.

Williams, T. (2008); "How do Organizations Learn Lessons From Projects – And Do They?" IEEE Transactions on engineering management, 55(2), 248–266.


1 Email:charles@dep.ufscar.br

2. Departamento de Engenharia de Produção Universidade Federal de São Carlos – UFSCar São Carlos, São Paulo – Brasil

Vol. 35 (Nº 11) Año 2014
[Índice]
[En caso de encontrar algún error en este website favor enviar email a webmaster]