Espacios. Vol. 32 (3) 2011. Pág. 2


A mídia no desenvolvimento dos arranjos produtivos locais: APL de moda praia de Cabo Frio

The media in the development of local productive arrangements: APL swimwear Cabo Frio

Los medios de comunicación en el desarrollo de arreglos productivos locales: APL Moda de playa Cabo Frio

Waldemar Madeira Magnavita, Elaine Cavalcante Peixoto Borin, Mariza Almeida y Branca Terra


A mídia e a comunicação no APL

A informação sempre foi essencial para a vida dos empreendimentos, mas num mundo globalizado, ela se tornou de vital importância para a sobrevivência e conquista de mercados para as empresas, além de apoio aos processos produtivos. O desenvolvimento experimentado pelo setor de informação, impulsionado, verdadeiramente catapultado pelo desenvolvimento da tecnologia da Transmissão de Informação (TI), revolucionou costumes sociais e posturas comerciais e econômicas no mundo inteiro.

A facilidade de circular uma informação em questão de segundos de uma parte a outra do mundo, a possibilidade se estar em contato simultâneo com vários agentes de um mesmo processo político e/ou produtivo através de conferências a partir de vários lugares do mundo e a integração dos atores de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P&D&I) através do intercâmbio imediato entre os Centros de Desenvolvimento Tecnológico espalhados ao redor do planeta levam a uma alteração de visões e de posturas relativas às ações nos arranjos referentes ao acesso tecnológico, à produção e à comercialização de seus produtos. 

A metodologia desenvolvida pelo Sebrae para o desenvolvimento dos APLs (Caporali, Volker, 2004) define 3 (três) eixos, a saber: Dinâmica de Distrito; Desenvolvimento Empresarial e Organização da Produção; Informação e Acesso a Mercados. O terceiro destes eixos, Acesso a Mercados, inclui a teoria dos três “Cs”, introduzida por Michael Porter (Porter, 1999): Custos, Clientes e Concorrentes. Lá está dito claramente que: “... as ações de mercado devem ser realizadas desde o início do Programa, servindo de incentivo para todo o resto do projeto” (1999:56). Mas o estudo é extremamente vago a respeito, limitando-se a definir como esperado para o acesso a mercados a “capacitação em marketing” e “estudos de mercado”.

Mais especificamente, o capítulo Estratégia, da Metodologia de Desenvolvimento dos Arranjos Produtivos Locais (Capolari, Volker, 2004, pg. 61) afirma que “o domínio da estratégia ... se identifica como uma das maiores dificuldades para a implantação de um programa amplo de desenvolvimento de APLs”, porque “depende de uma percepção aprofundada do sistema empresarial e institucional local, do conhecimento dos mercados consumidores e dos concorrentes (grifo nosso), e dos diversos sistemas de interesse envolvidos.

Esta metodologia destaca a necessidade da atuação nos mercados como necessária ao sucesso do empreendimento, mas demonstra a falta de estudos a respeito, a ponto de não ir além, e nem de apontar os caminhos e as áreas que devem ser incorporadas ao projeto do APL. Apenas mencionar o marketing é muito genérico e muito amplo.

A área, o Marketing, a ferramenta, a Comunicação, e o meio, a Mídia, deveriam estar presentes nesta metodologia, como o caminho apontado neste eixo, e suas formas de incorporação ao projeto.

Falar em uso da mídia, porém, não significa apenas utilizar a informação em um suporte dirigido a públicos externos ao Arranjo Produtivo. Os próprios atores envolvidos na produção e na geração de riquezas que possam ser compartilhadas têm de se mobilizar definindo suas prioridades e objetivos, na direção de seus esforços produtivos e no rumo e na maneira que o desenvolvimento pretendido irá modificar as suas vidas.  

Não é possível mobilizar as pessoas, sensibilizá-las acerca da necessidade da coordenação de esforços produtivos em torno de uma mesma idéia, sem pensar na Comunicação como o instrumento capaz de conseguir esse resultado. É necessária a inclusão de processos de comunicação integrados à metodologia de desenvolvimento para levar o sucesso das ações de produção que objetivam ao desenvolvimento pretendido por determinada comunidade local, nos rumos definidos por esta, dentro do projeto do arranjo.

Para que tal aconteça, é imprescindível que os atores locais sejam capazes de produzir seus próprios conteúdos comunicacionais e que possam midiatizá-los (incorporá-los a uma ou várias mídias) e que isto já esteja incorporado ao próprio projeto do APL. Neste caso, é necessário o papel coadjuvante da educação, institucionalmente, com agentes de perfil desenvolvimentista e cidadão, para dar o suporte para a mobilização das pessoas integrantes do APL, repassando metodologias e experiências. Em outras palavras, informação que irá gerar informação que irá gerar produção e desenvolvimento.

No sistema capitalista, o único modo de permanência de uma empresa está em sua aceitação pelo mercado para a realização das vendas de seus produtos. Este fato deve ser enfrentado tanto pelas empresas instituídas de maneira independente como também pelas nascidas nos APL’s.

Logo, inserir ações de geração de informação própria e de sua mídia através da mobilização dos integrantes do projeto produtivo, aprendendo a direcionar essa informação e essa mídia, tendo à disposição uma metodologia de auxílio a esta gestão, é um passo certamente mais seguro para o sucesso do empreendimento local.

O Sebrae desenvolveu uma metodologia para aquilo que, no mercado, é denominado de Inteligência Competitiva - IC. Ela é um componente crucial da emergente economia do conhecimento. Ao analisar os passos de seus concorrentes, esta metodologia permite que empresas antecipem futuras direções e tendências do mercado, ao invés de meramente reagir a elas. A Inteligência Competitiva aponta a necessidade de elaborar e implantar um plano de marketing, segmentando mercados, descobrindo e explorando seus nichos, prospectando novos mercados, identificando demanda de produtos, tendências de mercado e potenciais clientes para seus produtos e serviços, entre outras ações mercadológicas. Recomenda, inclusive, à área de produção, adequar os atuais produtos e serviços às exigências de mercado, introduzindo programas de design e de qualidade nos produtos. Ou seja, não basta apenas produzir. Se a demanda identificada do mercado for por inovação e criatividade, não há como escapar desta exigência. Se não for para ter esse tipo de comportamento e se os atores do processo produtivo não conseguirem compreender esta necessidade, é melhor nem implementar o processo.

O método operacional proposto pelo Sebrae, porém, apenas recomenda a criação de um Núcleo de IC, gerenciado e dirigido por um profissional de mercado (grifo nosso). Um profissional de mercado, porém, não é partícipe da cultura do arranjo produtivo. Não espelha a vontade e nem os valores dessa comunidade. Não será capaz de motivar seus membros com a mesma intensidade que se os conteúdos fossem produzidos por estes.

Um APL reveste-se de um caráter social forte. Exatamente por isso, a participação de seus membros no gerenciamento de suas ações impõe-se como fundamental para que haja motivação e desenvolvimento da idéia. Estamos falando de prover uma capacidade de autogestão da mídia para que estes Arranjos Produtivos possam determinar seus conteúdos midiáticos e até mesmo criar seus próprios veículos comunicacionais, sem dependência de grandes grupos de mídia que encarecem e inviabilizam uma utilização adequada desta e sejam beneficiados pelos seus resultados.

As ações de mídia do Pólo Moda Praia

O Pólo de Moda Praia de Cabo Frio, também conhecido como configuração produtiva localizada - CPL Moda Praia de Cabo Frio, se consubstancia na marca “modapraiacabofrio”, com site na Internet e, apesar de seus 170 associados, está concentrado na chamada “rua dos biquínis” onde se localizam aproximadamente 100 lojas que se congregam na ACIRB – Associação Comercial e Industrial da Rua dos Biquínis (Google Earth, 2008). 

O CPL possui uma área de exposição com circulação livre de pedestres, permitindo um contato e uma visualização com os produtos, além de ser um local facilitador para qualquer tipo de mídia alternativa voltada para o contato direto com o público. O local é propício para a instalação de alguns tipos de mídia audiovisual como rádio e telas com programação pré-definida.

A presença de consumidores na área de vendas também propicia a utilização da tecnologia bluetooth no envio de mensagens promocionais, como uma ferramenta de marketing localizado. O bluetooth é um padrão global de comunicação sem fio e de baixo consumo de energia que permite a transmissão de dados entre dispositivos compatíveis com a tecnologia. Para isso, uma combinação de hardware e software é utilizada para permitir que essa comunicação ocorra entre os mais diferentes tipos de aparelhos. A transmissão de dados é feita através de radiofreqüência, permitindo que um dispositivo detecte o outro independente de suas posições, desde que estejam dentro do limite de proximidade.

De fato, os gestores do CPL aproveitam a área de exposição assim definida para atrair os consumidores através de suas próprias vitrines ou acessos às lojas. A grande característica deste aglomerado é a sua constituição quase que total de varejistas.

O que evidencia as dificuldades de crescimento do pólo, é que a mídia é muito pouco utilizada: catálogo na Internet (sites das empresas) em 13% das empresas; 11% distribuem folhetos (folders); e 10% gastam em catálogos impressos. Catálogos em CD aparecem em 6% das iniciativas de divulgação das empresas (Sebrae, 2004). Para um mercado midiatizado, com alta tecnologia de informação e globalizado, o uso da mídia nestes níveis simplesmente alija e impede que o pólo tenha uma participação e brigue pelo mercado.

Chuairi (2008), durante a entrevista abordou a necessidade de uma alteração no projeto proposto pelo Sebrae (Caporali, Volker, 2004) no sentido de se incluírem ações voltadas para a atração do público consumidor. Para ele estão faltando ações de mídia direcionadas ao real público comprador da produção do CPL.

Segundo Chuairi, o único ganho real de publicidade foi alcançado através da realização das promoções como a Cabo Frio Fashion Beach, uma feira com exposição dos produtos na forma de desfile de moda.

O Sebrae também indica a realização de Feiras de Negócios como ação promocional ideal para o objetivo de atração de compradores, como demonstra o tipo de ações de marketing relatadas pelo Sistema de Informação da Gestão Estratégica Orientada para Resultados - SIGEOR, em relação a este CPL.

A Cabo Frio Fashion Beach, em 2005 foi concebida para a execução de desfiles diários, palestras, fórum de fornecedores e consultorias, entre outras atividades, além de espaços para a promoção das atividades turísticas da região e do artesanato local. Uma ação promocional de Marketing, destinada a obter publicidade na mídia.

Em 2006, além da re-edição desta feira, o CPL participou do Fashion Rio - RJFW Primavera/Verão e Outono/Inverno. No mesmo ano também esteve presente na Expolojas no Riocentro, Rio de Janeiro. A RJFW, junto com a São Paulo Fashion Week - SPFW, já alcança projeção internacional. A Expolojas, porém, “busca incentivar tanto o lojista local quanto o produtor do Estado do Rio, mostrando que o lojista pode comprar dentro do Estado”.

Em 2007 o CPL Moda Praia Cabo Frio, através da ACIRB, voltou a participar do RJFW, assim como da terceira edição da Cabo Frio Fashion Beach e alguns de seus membros, particularmente os exportadores, realizaram desfiles exclusivos, atraindo “muitos convidados e jornalistas da moda para a cobertura do evento” (clipe em www.sigeor.sebrae.com.br).

Mas promoções como a de Feiras de Negócios, em Marketing, são usualmente voltadas para o mercado atacadista (Kotler, 2004). Não houve e nem há previsão, no CPL Moda Praia Cabo Frio, de haver ações de marketing em propaganda e publicidade que resultem em uma mídia que estimule a presença do consumidor de varejo. E é a respeito desta falta de sintonia que o gestor do CPL se refere quando declara que as ações de marketing no pólo beneficiaram os que não estavam envolvidos com o atacado, mas com o varejo.

Gostaríamos de lembrar que “a mídia tem, na contemporaneidade, o poder de instituir o que é, ou não, real, existente” (Guareschi, Bizz, 2005). É por isso que Chuari ressalta que “nós queríamos que o trabalho do CPL fosse em cima de divulgação do Pólo, que o Pólo crescesse, que a Rua (dos Biquínis) crescesse, que fosse um projeto direcionado pro nosso segmento”.

Na verdade, como o próprio gestor revela, foram efetuadas outras ações de mídia: “Quando a gente fala em mídia, a gente já teve avião na praia, ali no ponto do coletivo, programas de TV a cabo local, a gente já usou bastante”. 

O mesmo tipo de mídia que se consegue através da proposta principal do Sigeor e que motivou a criação do Cabo Frio Fashion Beach, a mídia indireta, gratuita, a publicidade. O próprio Chuairi ressalta esta iniciativa ao declarar que “ ... o que eu gastei, o que eu ganhei de mídia naquela feira, no pólo qualificado, nos jornais do Brasil, no jornal O Globo (RJ), Folha de São Paulo, tem valor” .

Chuairi revela também que há uma necessidade de estar mais presente na mídia e que esta presença seria positiva para o arranjo: “A questão é muito simples: todos acham que isso é fundamental para o crescimento, ninguém abre mão, acham que isso é necessário. Em qualquer reunião da Associação a reclamação é sempre que nós não temos mídia”. O problema, segundo o mesmo, se resume ao custo da implantação das ações de mídia que impede que os projetos sejam executados.


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