Espacios. Espacios. Vol. 30 (3) 2009. Pág. 39

Que fatores facilitam a gestão do conhecimento em um cluster de empresas?

What factors facilitates the management of the knowledge to cluster of companies?

¿Qué factores facilitan la gestión del conocimiento en un cluster de empresas?

Raphaela Maria de Castro e Silva Vidal, Marcos André Mendes Primoy Claudemir Inacio dos Santos


4. Cluster

A competição acirrada no mercado pressiona as firmas a buscarem mecanismos que as diferenciem e proporcionem vantagem competitiva. Um dos resultados dessa busca é a adoção da associação de firmas como modelo organizacional: o cluster.

Para Altenburg e Meyer-Stamer (1999) cluster é um aglomerado de firmas de tamanho considerável que têm uma forte característica de especialização e comércio inter-firmas. Suzigan (2002) considera cluster ou SPL (Sistema produtivo local) como um aglomerado geográfico de empresas de tamanhos variáveis, que desenvolvem as mesmas atividades ou atividades similares, contando com a participação de seus fornecedores e prestadores de serviços. Porter (1999 p.211) define cluster como “um agrupamento geograficamente concentrado de empresas inter-relacionadas e instituições correlatas numa determinada área, vinculadas por elementos comuns e complementares”.

Martin e Sunley (2003) salientam que os estudos de Michael Porter (1999) causaram maior influência devido à aplicação de conceitos e novo foco apresentado. Sendo o modelo de Cluster defendido por Porter amplamente utilizado ao redor do mundo como forma de promover o desenvolvimento local, regional e nacional. Araújo, Moretto Neto e Schmitt (2008) consideram-no um dos autores centrais quando se trata da temática de clusters. Desta forma, este artigo tomará como base o conceito de cluster desenvolvido por Porter (1999).

A idéia de cluster baseada em modelo organizacional com foco na associação de empresas (CÂNDIDO; ABREU, 2000; OLAVE; AMATO NETO, 2001), vem despertando grande interesse por parte das comunidades acadêmica, empresarial e governamental devido aos bons resultados que podem ser alcançados para o coletivo, empresas que formam um cluster, e sociedade.

Para as empresas que optam pela estratégia de formação de um cluster é uma forma inovadora de alcançar a competitividade (OLAVE; AMATO NETO, 2001). São inúmeros os benefícios que podem ser alcançados pelos membros de um cluster, tais como: compartilhamento de frete; compras conjuntas que reduzem despesas; compartilhamento de recursos, conhecimentos e melhores práticas, entre outros. Para a sociedade, a formação de um cluster em determinada localidade proporcionará concentração de empresas, geração de emprego e renda, e melhoria de infra-estrutura e desenvolvimento social.

Os aspectos relacionados ao processo de aglomeração envolvem algumas componentes inerentes ao processo e que o caracterizam, tais como: localização geográfica, articulação, cooperação e difusão de informação.Por se encontrarem na mesma localização geográfica, tal aproximação das firmas facilita as relações, ou seja, estimula a integração dos participantes do cluster. Bernardes (2000) salienta que a proximidade gera ambiente favorável à inovação e desenvolvimento tecnológico.

A articulação diz respeito às relações intensas entre os elos do cluster (as firmas), facilitado pela localização geográfica, proporcionando sinergia entre as partes e resultados para o aglomerado. Esta interação permanente pode estimular a cooperação entre firmas.

A cooperação pode ocorrer entre as firmas e seus distribuidores, fornecedores e até mesmo seus concorrentes, tendo em vista os benefícios coletivos que podem ser alcançados. Muitas vezes, esses benefícios podem ser bem maiores do que se cada firma os buscasse individualmente. Olave e Amato Neto (2000) acrescentam que a busca por cooperação inter-firmas ocorre visando o acesso rápido a novas tecnologias e a inserção no mercado.

Quando estimulada, a colaboração inter-firmas ocasiona o compartilhamento de informações e de riscos.A difusão de informações dentro do cluster deriva das interações constantes e do clima de confiança e comprometimento entre as partes. Maskell (2001) argumenta que a aglomeração de firmas possibilita, no mínimo, a troca de conhecimentos.

Nesta seção, foram apresentados o formato de cluster e suas principais componentes inerentes ao aglomerado. Na próxima seção, serão discutidos alguns fatores que facilitariam a gestão do conhecimento em um cluster, tendo como base os modelos de GC já apresentados em seção anterior.

5. Fatores que facilitam a gestão de conhecimento em um cluster de empresas.

Nesta seção, serão apresentados os fatores que facilitam a gestão de conhecimento em um cluster de empresas, tomando como base os principais estudos disponíveis na literatura sobre GC, efetuando correlações com a temática de cluster de empresas. Estes fatores têm aspectos de multi-funcionalidade e de complementariedade, uma vez que a idéia de compartilhamento de conhecimento leva em consideração as peculiaridades de cada empresa integrante do cluster, sem, entretanto, deixar de considerar o bem coletivo.

Inicialmente, no processo de GC, faz-se necessário o envolvimento da alta administração da empresa (DAVENPORT; PRUSAK, 2003; TERRA, 2005;). Este envolvimento tem como objetivo dar suporte aos processos que serão implementados e os custos envolvidos. “A alta gerência deve criar uma visão do conhecimento e comunicá-lo internamente na empresa” (Nonaka e Takeuchi, 1997, p.265). A definição da visão vai estimular e dirigir a empresa para o campo do conhecimento de seu interesse.

A GC é um processo que requer investimentos vultuosos (DAVENPORT; PRUSAK, 2003). Trata-se, portanto, de uma decisão estratégica que pode ser dirigida para gerar resultados organizacionais, sendo necessário o engajamento da alta direção que, assim, demonstrará interesse e poderá gerar comprometimento entre seus colaboradores. O desenvolvimento desta fase torna necessário que todas as empresas integrantes do cluster estejam voltadas para os mesmos objetivos e possuam o mesmo nível tecnológico, tornando possível a GC no âmbito do aglomerado.

Para alcançar resultados efetivos, todos os níveis gerenciais devem ser envolvidos, destacando-se o papel a ser desempenhado pelos líderes, que têm a capacidade de influenciar e persuadir, podendo interferir no curso dos acontecimentos da vida organizacional. De acordo com Nonaka e Takeuchi (1997), a contribuição que a liderança dos gerentes de nível médio pode oferecer ao processo de transformação do conhecimento tácito em conhecimento explícito deve ser salientada, uma vez que à gerência de nível médio cabe a configuração e a integração dos conhecimentos tácitos da alta gerência e dos funcionários de linha, incorporando-os às novas tecnologias e produtos da organização.

Podem-se apontar outras práticas sociais para gerar conhecimento: comunidades de práticas e network (PERRIN; VIDAL; MCGILL, 2004). Por Comunidades de práticas, entendem-se os grupos de pessoas que se juntam por um interesse em comum, compartilhando conhecimento e aprendendo a fazer algo melhor (LAVE; WENGER, 1991). Terra (2005) corrobora com este pensamento ao destacar a comunidade de práticas como um meio eficiente de compartilhar conhecimento. O objetivo das comunidades de prática é para gerar novo conhecimento, troca de conhecimento e melhorar a performance no trabalho.

De acordo com Lave e Wenger (1991), a prática de compartilhar conhecimento habilita os participantes a desenvolver uma visão comum e a entender seu trabalho e como este se ajusta ao ambiente. Os participantes compartilham também os julgamentos sobre o que fazer, quando fazer, a qualidade do que foi feito e se é válido ou não fazer. Nessa perspectiva, a aprendizagem é entendida como um processo de engajamento na prática, que além de compartilhar conhecimento pode servir para forjar a identidade individual.

A empresa pode implementar políticas internas que facilitem e proporcionem interação social, criando, desta forma, uma ambiente propício às interações sociais e estimulando o compartilhamento de conhecimento. Contudo, a concepção de prática social e de conhecimento significativamente coletivo não elimina ou minimiza o conhecimento individual, pois as diferentes habilidades e conhecimentos de cada pessoa resultam em todos conhecerem coisas diferentes ou em todos conhecerem as coisas de maneira diferente (DUGUID; BROWN, 2001).

Network, por seu turno, diz respeito a uma rede de relacionamentos de trabalho. As empresas quando adotam o formato de cluster como modelo de gestão, beneficiam-se da localização geográfica para fortalecer esses relacionamentos, ou seja, estimulam e potencializam a socialização, que pode favorecer a troca de informações, ganhos efetivos nos postos de trabalho e nos resultados gerais da organização.

Para uma firma integrante de um cluster, o ambiente organizacional deve favorecer o desenvolvimento de práticas e estimular a socialização como forma de criar conhecimento tácito, como foi visto no modelo de Nonaka e Takeuchi (1997). Os autores argumentam que a empresa deve oferecer ambientes onde possam ocorrer interações intensas e trocas de experiências entre as pessoas, de forma a criar conhecimento. Nonaka e Takeuchi (1997, p. 267) acrescentam que “os insight, intuições e palpites altamente subjetivos encontram-se no âmago da criação do conhecimento e da inovação”.Sendo assim, proporcionar encontros de pessoas de áreas afins ou não, dentro do cluster, por meio de reuniões periódicas ou grupo de discussões pode gerar um ganho de criatividade e conhecimento muito maior para cada empresa envolvida. Cabe aos líderes, o papel de disseminar, desenvolver e implementar programas de compartilhamento de conhecimento em ambiente favorável.

Uma organização é um organismo que está impregnado de cultura organizacional que foi moldada pela história de sua existência, problemas e batalhas enfrentadas. É natural que a convivência entre as pessoas dentro da organização desenvolvam valores, crenças e hábitos coletivos. “A cultura é representada, em parte, por sua missão e valores, deve ser ancorada e construída por meio de atos simbólicos e ações da alta administração que valorizam e destacam fatos, notícias e pessoas que exemplificam os valores perseguidos” (Terra, 2005, p.120). Com isso, percebe-se que a cultura influencia o ambiente em que o processo de GC será implantado.Será o alicerce para a criação de conhecimento.

Relacionando ao que foi proposto por Choo (2003), o significado criado pela organização influencia e é influenciado pela cultura. Probst, Raub e Romhardt (2002, p.158) acrescentam que “a cultura empresarial pode afetar tanto o escopo quanto o conteúdo da transferência de conhecimento”.

É necessária uma cultura dirigida para a inovação e conhecimento (DAVENPORT; PRUSAK, 2003; TERRA, 2005;), isto é, um ambiente social favorável e estimulador do compartilhamento de conhecimento: melhores práticas, resultados desejados e alcançados. Desta forma, pode-se perceber que os líderes precisam agir de forma a minimizarem impactos, influenciando os colaboradores, estimulando a cooperação e integração, e mostrando ganhos coletivos com a implantação desses novos hábitos.Perrin, Vidal e McGill (2004, p. 1) concordam com essa idéia e argumentam que o “compartilhamento do conhecimento é um comportamento que precisa ser parte natural do estilo de trabalhar e da cultura de uma organização”.

A percepção do aspecto cultural é fundamental para o sucesso da GC em um cluster. Os líderes devem promover treinamentos de aculturamento, buscando disseminar os ganhos que a organização obterá com a cooperação inter-firmas, ou seja, como eles vão “vender” a nova idéia. Probst, Raub e Romhardt (2002, p.158) adicionam que “a empresa deve tomar providências para desenvolver a confiança dos detentores de conhecimento relacionando compartilhamento de conhecimento a pagamento e incentivos”.

O apoio da área de TI (Tecnologia e Informação) da empresa é um facilitador indispensável ao processo. A GC unida à área de TI visa desenvolver e implementar programas que proporcionem integração e difusão de conhecimento (TERRA, 2005).Nos relacionamentos entre os elos de um cluster, torna-se válido adotar certos recursos tecnológicos que propiciem chats, salas de discussões, programas de apoio, onde as pessoas possam adquirir e/ou trocar conhecimento, compartilhar melhores práticas em suas funções, idéias e dúvidas.Além disso, a área de TI atuará decisivamente na etapa de Preservação ou retenção de conhecimento proposta no modelo de Probst, Raub e Romhardt (2002), desenvolvendo ambiente virtual que armazenará o conhecimento criado pela organização. Davenport, Prusak (2003) e Santiago (2004) corroboram com este pensamento defendendo que a tecnologia é um grande aliado para a GC, pois possibilita novos comportamentos que resultam em conhecimento. A área de TI deve ser envolvida nos processos de criação, desenvolvimento e difusão do conhecimento organizacional, a fim de proporcionar múltiplos canais de transferência de conhecimento, os quais Davenport e Prusak (2003) consideram essenciais para o sucesso de um projeto de GC.

Um dos canais de transferência de conhecimento, principalmente utilizado no ramo de varejo, é o EDI (eletronic data interchange). Esta ferramenta permite o envio de informações on-line: envio de pedidos aos fornecedores, envio de notas fiscais eletrônicas dos fornecedores aos armazéns dos varejistas, o que otimiza o processo logístico. Também se destaca no envio de informações sobre estoques e vendas dos clientes, o que facilita a previsão de vendas dos fornecedores para atendê-los.

A GC e a aprendizagem estão inter-relacionadas. Os processos de criação e absorção de conhecimento nas empresas estão estreitamente ligados às dinâmicas de aprendizagem (LANDAETA, 2003). No ambiente de constantes mutações, onde o conhecimento se torna peça fundamental da vida empresarial, os líderes que têm visão de futuro procuram promover em suas empresas a aprendizagem através de cursos de capacitação, extensão ou pós-graduação. Como estes investimentos são pesados para que a empresa possa proporcionar a todos os colaboradores e até em liberá-los das atividades diárias, a empresa poderia inserir em suas práticas o papel de multiplicadores de conhecimento. Os multiplicadores seriam os colaboradores com maior capacidade de assimilação e com perfil de disseminadores de conhecimento. Estes funcionários seriam indicados pelos líderes. e designados para participar de cursos e, posteriormente, para disseminar entre os colegas o conteúdo absorvido, de maneira que o conteúdo absorvido resultasse em aprendizagem.

O papel dos multiplicadores de conhecimento ganha maior relevância em um cluster por gerar economia de recursos e de tempo, uma vez que os custos podem ser rateados entre as empresas integrantes e, paralelamente, garantir uma melhor utilização do fator tempo, pois os conteúdos são rapidamente disponibilizados a muitas pessoas. Tendo em vista, que a socialização é um processo que permite o compartilhamento de conhecimento, Santiago (2004) conclui que os multiplicadores desempenham importantes papéis de facilitadores e disseminadores de conhecimento.

Segundo Fleury e Oliveira Jr. (2001), a GC está intimamente relacionada aos processos de aprendizagem nas organizações e na conjugação dos processos de aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, de disseminação do conhecimento e de construção de memórias, em um processo coletivo de elaboração das competências necessárias à organização.

Para tornar-se uma empresa geradora de conhecimento, a firma deve ter a capacidade de adquirir, explorar, acumular e criar novos conhecimentos continuamente, como mostra o modelo de Probst, Raub e Romhardt (2002). Entretanto, segundo Nonaka e Takeuchi (1997), as estruturas organizacionais convencionais não são apropriadas para permitir o desenvolvimento dessas etapas. A estrutura burocrática que tem por características a formalização, centralização e natureza não-flexível, facilita a aquisição, acúmulo e exploração do conhecimento, sendo deficiente na fase de criação de conhecimento. Por outro lado, a estrutura de força-tarefa, de natureza flexível, adaptável e participativa, facilita a criação do conhecimento, porém é deficiente para as outras etapas, igualmente importantes. Desta forma, os mesmos autores sugerem uma estrutura hipertexto, onde se aproveita o melhor das duas estruturas, já que elas se completam: A burocracia com sua eficiência e estabilidade e da força-tarefa, a eficácia e dinamismo, o que irá corroborar com o processo de cooperação, articulação e compartilhamento de conhecimento dentro do cluster.

O Quadro 1 sintetiza os fatores que facilitam a gestão do conhecimento em um cluster e sua relação com as componentes.

Quadro1

QUADRO 1: Fatores que facilitam a gestão do conhecimento em um cluster.
Fonte: adaptado da literatura.

Contudo, deve-se observar que em um cluster, existe a competição, fator inerente à natureza das empresas e a cooperação, componente básica inerente ao formato de cluster. As firmas vão competir por mercados, ao mesmo tempo em que cooperam entre si para atingirem objetivos em comum ou complementares. Portanto, na GC em um cluster, em que o compartilhamento é uma das idéias centrais de tal abordagem, deve-se considerar o fator cultural que envolve os participantes do aglomerado. O aspecto cultural pode ser um fator limitador da GC, se as firmas não estiverem preparadas e comprometidas para participarem do processo de forma aberta e baseada em confiança, compartilhando informações, ainda que consideradas estratégicas. Ainda no âmbito comportamental, é importante destacar a implantação da GC em um cluster como uma mudança organizacional que pode alterar significativamente a performance da empresa, através do processo de mudança de hábitos dos colaboradores. Estes, por sua vez, podem considerar essas mudanças como negativas, prejudiciais e até mesmo como forma de diminuir seu poder de barganha, resultando em resistência à implantação do processo de GC, comprometendo os resultados.Por fim, pode-se mencionar a adoção de estrutura burocrática, caracterizada por sua rigidez de processos, como fator limitador na fase de criação do conhecimento. Todos esses fatores limitadores podem ser minimizados com atuação direta da liderança e apoio da alta direção da empresa.

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