Espacios. Vol. 28 (2) 2007. Pág. 10

Os Estudos Prospectivos como Ferramenta de Apoio às Mudanças Organizacionais

The foresight studies with tools to support the organization changes

Estudios prospectivos como herramienta de apoyo a los cambios  organizacionales

Edi Braga Júnior, Adelaide Maria de Souza Antunes y Marcello José Pio


3. Estudos de Futuro

3.1) Previsão Clássica

Em ambientes estáveis, uma das formas utilizadas é o enfoque unidirecional, no qual o futuro poderia ser moldado através de modelos econométricos de projeção tendo como base referências históricas. Este estudo de futuro é denominado “Previsão Clássica”. Neste caso, a previsão não é discutida por quem a efetuou, pois a ocorrência de determinado fato é considerada um evento de probabilidade certa. Na "Previsão Clássica" não é possível alterar as tendências e o curso dos acontecimentos. As principais técnicas utilizadas pela "Previsão Clássica" são assim definidas por De Jouvenel (1962):

Contudo, a "Previsão Clássica" não leva em consideração o dinamismo das mudanças da sociedade (mantêm-se inalterados os fatores políticos, sociais, econômicos e tecnológicos), a inter-relação entre os componentes que formam tal sociedade, a dificuldade de se determinar quais os fatores ou elementos que são mais suscetíveis às mudanças, e, por fim, esta metodologia não possui um processo sistematizado de tratamento da informação, que é necessário para se compreender os pontos colocados anteriormente.

3.2) Estudos de Prospecção

Com o aumento das incertezas ambientais, surge uma segunda concepção, a qual considera o futuro como obra da ação do homem. Esta “construção” seria feita etapa por etapa, através de ações desenvolvidas no presente. A partir deste novo conceito, surgiram, principalmente, duas formas de focar o futuro: o futuro sendo diferente do passado (variado e incerto) e não estando determinado. Um futuro variado e incerto se caracteriza pela análise das mudanças ocorridas no ambiente através de sua complexidade, sentido, velocidade e impacto.

O enfoque, que considera o futuro não determinado, está baseado na construção dele pelos atores envolvidos, através da utilização de um processo de coleta e sistematização das informações para a tomada de decisões. Para este objetivo as organizações podem utilizar os estudos prospectivos, que são processos sistematizados de compreensão do futuro podendo ser de cunho social, econômico, político, tecnológico e organizacional.

Grumbach (1997) mostra que os estudos prospectivos se tornaram mais conhecidos depois da publicação da obra A Atitude Prospectiva, do filósofo e pedagogo francês Gaston Berger, em 1957. Na sua obra, Berger determina uma metodologia para a previsão de um futuro desejado para o mundo, considerando que os estudos prospectivos devem ser:

Levando-se em conta que em ambientes turbulentos os fatores que determinam seu modus operandi devem ser revistos de tempos em tempos, os estudos prospectivos podem ser encarados como uma interessante ferramenta às organizações, a fim de que estas consigam reagir estrategicamente (adquirir flexibilidade) às súbitas mudanças de rumo.

Segundo Castro et al. (1998b, 1999) “a análise prospectiva é o conjunto de conceitos e técnicas utilizadas para se antever o comportamento das variáveis sócio-econômicas, políticas, culturais e tecnológicas, bem como o efeito de suas interações”. Para o autor, os estudos de prospecção são vistos como a primeira etapa do planejamento em diferentes pontos de espaços temporais. Estes estudos podem ser usados para conhecer as conseqüências futuras das opções de ações no presente e as influências imediatas de futuros variados. Os estudos prospectivos “tentam criar imagens do futuro, diminuindo a consideração do passado, porém nunca o eliminando" (Grumbach, 1997). Os métodos prospectivos que correspondem a uma exploração imaginativa e intuitiva partem de premissas estruturais baseadas no passado, mas que estão abertas em todo momento a mudanças. De Jouvenel (2000) considera que os estudos prospectivos oferecem uma base que auxilia na construção do futuro. Na visão das empresas, os estudos prospectivos são reflexões para ações de caráter estratégico.

3.2.1) Cenários

Os estudos prospectivos podem gerar, ou até mesmo ser auxiliados, por um conjunto de cenários, que têm como objetivo abranger as possibilidades possíveis de determinados eventos, atores ou sistemas. A sua utilização nos estudos prospectivos foi iniciada por Herman Kahn nos EUA, nos anos 60, e pela DATAR (Delegation `a l'amenagement du territoire et à l'action régionale) na França (Grumbach, 1997).

Os cenários são conjuntos formados pela descrição de situações futuras. Segundo Schnaars (1987) um cenário é uma seqüência de eventos hipotéticos, o qual é construído com o objetivo de focar os processos determinantes e os pontos críticos para a tomada de decisão. Para Van der Heijden (1997) os cenários são definidos como conjuntos razoáveis e factíveis de futuros possíveis, devidamente estruturados. Eles são construídos através da explicitação das várias interpretações dos eventos que orientam a estrutura do ambiente de negócio. Gausemeier et al. (1998) define cenário como uma “descrição, geralmente compreensível, de uma situação no futuro. Esta descrição está baseada em uma rede complexa de fatores de influência”. 

Caraballo (1994), por sua vez, considera que os cenários são descrições das realidades que estão em constantes interações. Eles buscam antecipar e entender os riscos e identificar opções estratégicas que não foram visualizadas. Os cenários podem ser considerados como construções hipotéticas de eventos futuros, que possibilitam criar imagens de futuros, os quais são determinados através de interpretações qualitativas dos pontos críticos dos fatores exógenos que influenciam as organizações. "A criação de cenários variados busca determinar as possíveis conseqüências das incertezas" (Medina et al., 2001). Ele não tem significado, caso não se consiga extrair resultados para possíveis ações estratégicas.

3.2.2) O Método Delphi

O método Delphi foi desenvolvido por Olaf Helmes, na década de 60, e consiste em perguntar, de forma individual e através de questionários pré-elaborados, a um conjunto de especialistas[1], sobre a tendência de futuro de um determinado fator crítico, sistema ou parte deste. Weaver (1971) afirma que “a técnica Delphi tem como conceito o princípio de que várias cabeças pensam melhor que uma, quando se buscam conjecturas subjetivas sobre o futuro... e que os participantes irão montar conjecturas baseadas em julgamentos racionais e não simplesmente por achismos”. Segundo Ludwig (1997) a técnica Delphi é um processo de exploração das oportunidades futuras, que objetiva buscar um consenso através de uma combinação de questionamentos de estrutura qualitativa e quantitativa.

Para Wright, Lawrence e Collopy (1996) a técnica Delphi é utilizada em situações de julgamento e prospecção, nas quais os modelos estatísticos clássicos não são possíveis devido a uma suposta descontinuidade das informações e dados históricos, econômicos e técnicos.  Neste caso, as informações oriundas das observações e inferências do julgamento humanos são necessárias. A técnica Delphi pode ser caracterizada por quatro pontos básicos: anonimato, interação, troca de informações e controle estatístico das respostas dadas. O anonimato é conseguido através da técnica de estruturação e envio de questionários. Este "isolamento" é importante porque se consegue a opinião de cada perito e não uma opinião obtida por um processo de discussão em grupo. Além disso, este procedimento permite que cada especialista se expresse sem a interferência de possíveis "pressões sociais", como por exemplo, a influência de opinião de um grupo ou de um especialista renomado. Teoricamente, isto permite que cada membro do grupo de especialistas analise as idéias tendo como base apenas no mérito (Wright e Rowe, 1999).

As perguntas são feitas em várias rodadas, são ainda analisadas e refeitas para que os especialistas possam reavaliar suas primeiras posições e tentar chegar a um senso comum. O método busca convergir as opiniões dos peritos e levantar determinados pontos em comum sobre assuntos consistentes. O método Delphi é composto por dois grupos de trabalho.

Um grupo de especialistas ou especialista, que têm como objetivo "elaborar estimativas, através de um processo de raciocínio lógico, as quais serão comparadas, corrigidas e complementadas em fases seqüenciais de estimulação através das respostas de sucessivos questionários" (Grumbach, 1997). O grupo de peritos, é composto por pessoas que são reconhecidas pelo seu intenso conhecimento em uma parte do sistema estudado, pelo seu conhecimento superficial das outras partes do sistema e pelo grande interesse em participar de tais estudos. O nível de conhecimento de cada perito poderá ser explicitado por ele próprio, quando mediante uma pergunta específica de uma determinada parte do sistema em estudo.

O grupo de controle ou pesquisador tem como objetivo gerenciar o processo de julgamento de valores emitidos pelos especialistas, através do estudo analítico das opiniões coletadas, buscando não alterá-las ou descaracterizá-las e elaborando as sínteses das conclusões e o formato final do trabalho. A possível dispersão que poderá existir no tocante às respostas dos peritos, por sua característica de interação, poderá ser diminuída, até chegar a um consenso, através da realimentação das informações para os peritos. Logo, cada especialista terá a possibilidade de rever suas posições iniciais a cada rodada de perguntas.

O método Delphi pode ser dividido em três fases. Na primeira fase tem-se a definição da área de estudo e a confecção do primeiro questionário, levando-se em conta que os estudos Delphi são conduzidos, normalmente, com pelo menos três rodadas. A elaboração do questionário deve considerar algumas características fundamentais: as questões devem ser precisas, passíveis de quantificação e independentes.

A segunda fase consiste na seleção dos peritos que irão participar de um estudo de prospecção. Para Godet (2000) o perito deve ser escolhido pela sua capacidade de prever o futuro. Normalmente, a maioria dos estudos que utilizam tal técnica trabalham com uma faixa de 15 a 20 especialistas, sendo que um grande número de especialistas pode gerar uma grande quantidade de itens e idéias, dificultando o processo de contextualização (Ludwig, 1997). O número de especialistas é, geralmente, determinado pela variedade de temas envolvidos. Debecq, Van de Ven & Gustafson (apud Ludwig, 1997) sugerem um número mínimo de especialistas. Dalkey, Rourke, Lewis e Snyder (1972) consideram que existe um real aumento na confiabilidade dos resultados, quando se tem um número elevado de especialistas. Quando se trabalha com um número baixo de especialistas, deve-se buscar pessoas que possuam um elevado conhecimento e experiência nas áreas abordadas. Não se espera destes especialistas uma visão superficial dos temas envolvidos. Esta escolha deve levar em consideração menos os títulos ou postos hierárquicos, do que seu conhecimento sobre o assunto estudado.

Geralmente, cria-se uma hierarquia de conhecimento, normalmente assumindo valores algébricos, sobre o assunto em pauta.  Os níveis são divididos em:

Na terceira fase, os questionários são enviados juntamente com uma carta de apresentação, mostrando os objetivos do estudo e os passos e regras para a execução do processo de coleta de informações.

A partir das questões abertas do primeiro questionário, o(s) pesquisador(es) estrutura(m) uma série de tópicos. O segundo questionário é desenvolvido pelo(s) pesquisador(es), através das informações coletadas durante a primeira rodada. Durante a segunda rodada, pede-se aos especialistas que revejam todos os itens identificados na primeira rodada. Para estabelecer, preliminarmente, uma prioridade entre os itens, os especialistas podem utilizar  uma escala de valor ou criar um “rank” ordenado. Nesta etapa os especialistas são, então, convidados a comentar sobre as razões para os valores adicionados e adicionar outros tópicos. Durante a terceira rodada, e qualquer outra rodada necessária, os especialistas reavaliam cada item. Para auxiliar suas considerações, os participantes podem ser municiados com: (a) feedback com informações estatísticas sobre os valores atribuídos pelo próprio para cada item; (b) a média atribuída a cada item pelo grupo; (c) um sumário dos comentários feitos por cada especialista. Este processo de feedback permite que os especialistas fiquem cientes dos valores atribuídos para cada opinião e as razões subjacentes que levaram cada especialista a atribuir estes valores. Observa-se que, normalmente, as rodadas Delphi continuam até um nível pré-determinado de consenso é alcançado ou nenhuma informação nova é adicionada, e que na maioria dos casos três rodadas são suficientes.

Uma outra forma de questionário Delphi consiste em determinar questões fechadas e contextualizadas e perguntar aos especialistas a probabilidade de ocorrência, no horizonte temporal determinado, de uma determinada variável, que pode ser de ordem tecnológica, política, social, econômica, ambiental, etc.

Na segunda rodada de perguntas, os especialistas são confrontados com um quadro comparativo que contém os valores dados pelo próprio e a média do grupo. A partir deste ponto os especialistas são convidados a refletirem sobre os valores dados e caso queiram estes modificam os valores anteriormente atribuídos. Caso haja necessidade, outras rodadas de perguntas serão feitas, quando cada especialista será convidado a comentar os argumentos divergentes até se atingir um consenso mediano de opiniões.

As principais vantagens do  método Delphi podem, assim, ser determinadas:

Contudo, existem alguns pontos críticos, que devem ser observados no método Delphi:

Em estudos de prospectiva tecnológica que trabalham com a técnica Delphi, observam-se as seguintes vantagens (Observatório de Prospectiva Tecnológica Industrial, 2001):


[1] Grupo composto por pessoas que são reconhecidas pelo seu intenso conhecimento em uma parte do sistema estudado, pelo seu conhecimento superficial das outras partes do sistema e pelo grande interesse em participar de tais estudos.

[anterior] [inicio] [siguiente]


Vol. 28 (2) 2007
[Editorial] [Índice]